18 Dezembro 2023
O ex superpoderoso número três da Santa Sé, o cardeal Giovanni Angelo Becciu, no final do "julgamento do século" sobre a gestão dos fundos da Secretaria de Estado e a venda do imóvel de Londres, foi condenado a cinco anos e seis meses de reclusão com interdição perpétua para o exercício de cargos públicos. Mais 8 mil euros de multa. O cardeal foi considerado culpado de dois peculatos – pelo investimento inicial no imóvel da Sloane Avenue e pelos 125 mil euros enviados à cooperativa Spes, de Ozieri, do seu irmão Antonino – e uma fraude agravada. Os advogados do prelado reiteram “a sua inocência” e anunciam: “Vamos recorrer”. Enquanto o promotor de justiça Alessandro Diddi diz estar “finalmente sereno”, porque “a sentença nos dá razão”.
A reportagem é de Domenico Agasso, publicada por La Stampa, 17-12-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Os acontecimentos sob escrutínio dos investigadores teriam resultado em prejuízos superiores a 200 milhões de euros para a Santa Sé.
Becciu, ex-substituto para Assuntos Gerais e ex-prefeito para as Causas dos Santos, é o primeiro cardeal da história da Santa Igreja Romana a ser condenado criminalmente no Vaticano por um órgão judiciário composto por leigos. O Tribunal do Vaticano presidido por Giuseppe Pignatone, com Venerando Marano e Carlo Bonzano, emitiu sentenças totalizando 37 anos e um mês de reclusão. O único acusado absolvido entre os dez, monsenhor Mauro Carlino. Três anos e nove meses de prisão foram impostos à ex-gerente Cecilia Marogna. A mulher, suposta especialista em inteligência, originalmente acusada de peculato pelos 575 mil euros obtidos da Secretaria de Estado por meio de Becciu para supostas finalidades humanitárias, e que acabaram em boa parte para a sua empresa eslovena Logsic em despesas pessoais, foi condenada por fraude agravada, em cumplicidade com Becciu: a motivação de que o dinheiro seria usado para favorecer a libertação de uma freira colombiana sequestrada no Mali foi considerada "não correspondente à verdade".
Entre os demais condenados, o consultor Enrico Crasso pegou 7 anos; o corretor Raffaele Mincione cinco anos e 6 meses; o funcionário do Vaticano Fabrizio Tirabassi, 7 anos e 6 meses; o advogado Nicola Squillace um ano e 10 meses (suspensos); o outro corretor Gianluigi Torzi 6 anos. Para René Bruelhart e Tommaso Di Ruzza, respetivamente ex-presidente e ex-diretor da AIF, a Autoridade antilavagem de dinheiro do Vaticano, o Tribunal determinou uma multa de 1.750 euros.
Além disso, foi ordenado o confisco das quantias que constituem o corpo dos delitos contestados num total superior a 166 milhões de euros. Os réus foram por fim condenados, solidariamente, à indenização por danos em favor das partes civis – Secretaria de Estado, Apsa, Ior, Asif – calculados no total em mais de 200 milhões de euros. Todos preveem recurso; haverá também a possibilidade do Tribunal de Cassação.
“Reiteramos a inocência do Cardeal Becciu e iremos recorrer”, declarou o defensor, o advogado Fabio Viglione. “Respeitamos a sentença, mas certamente recorreremos”. Depois, numa nota com a colega Maria Concetta Marzo: “Há uma profunda amargura, depois de 86 audiências, em constatar que a inocência do Cardeal Becciu não foi proclamada pela sentença, apesar de todas as acusações terem se revelado completamente infundadas. As provas que surgiram no julgamento, a gênese das acusações contra o cardeal, resultado de uma demonstrada maquinação contra ele e a sua inocência, permitem-nos olhar para o recurso com inalterada confiança”.
Enquanto o procurador geral Diddi afirma: “Acredito que a abordagem foi consistente e isso para mim é o mais importante. Nesses processos nunca se deve festejar o resultado, um ministério público nunca pode ficar feliz pelas condenações. O que me satisfaz é que o longo e meticuloso trabalho foi consistente, apesar das objeções que foram levantadas contra nós nos últimos anos: disseram que somos incompetentes, ignorantes, mas na realidade o resultado dá-nos razão. Agora estou sereno".
Foi “um processo que garantiu os direitos de todos”, é a manchete do site da Santa Sé, Vatican News.
Nas considerações antes de se retirar para deliberar, Pignatone ressaltou como ficou “confirmado que o contraditório entre as partes é o melhor método para chegar à verdade processual e, acrescento, para tentar aproximar-se da verdade sem adjetivos”.
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A condenação de Becciu - Instituto Humanitas Unisinos - IHU