13 Mai 2015
"Desarmar as consciências armadas. Esse é um objetivo preciso do Papa Francisco." O prêmio Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel encontrou-se na manhã dessa segunda-feira, em audiência privada, com o Papa Francisco. Durante a conversa amigável, ocorrida no Palácio Apostólico, foram muitas as questões tocadas no âmbito da exigência da justiça e da paz: a questão dos direitos dos povos indígenas da América do Sul à crise dos conflitos na África, da Armênia aos mártires da América Latina, passando por Romero.
A reportagem é de Stefania Falasca, publicada no jornal Avvenire, 12-05-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Para Esquivel, que desde 2003 é presidente da Liga Internacional pelos Direitos Humanos e a Libertação dos Povos e que há muito tempo está em relação com Bergoglio, certamente não podiam faltar também as referências ao degelo nas relações entre Cuba e Estados Unidos no dia seguinte do encontro do papa com Raúl Castro.
Eis a entrevista.
O papa ajudou a lançar a abertura entre o governo cubano e os Estados Unidos. Como o senhor avalia o início desse processo?
O Papa Francisco deu um impulso ao diálogo, foi um mediador. E avaliou muito positivamente a visita do líder cubano. Castro é um homem pragmático, direto, pontual, ele me disse. O encontro marca um avanço, uma página nova. Não só entre Cuba e os Estados Unidos.
Que significado tem a abertura das relações entre Cuba e os Estados Unidos para a América Latina?
A mudança das relações entre Cuba e os Estados Unidos tem um grande significado para as relações entre os Estados Unidos e a América Latina. Isso significa que é possível abrir um diálogo e outra modalidade de relações no reconhecimento de relações paritárias, com base na equidade, não um grande poder com um país pequeno. Isso significa, portanto, que é possível pensar nos países da América Latina não como empregados de um império.
Outros países da América Latina precisam de ajuda na resolução de conflitos...
Penso no caso da Colômbia com a guerrilha. O exemplo de Cuba e dos Estados Unidos pode ser retomado. Com a diplomacia, pode-se favorecer o entendimento entre os povos, sem interferir, sem ingerências, podem ser dados impulsos que gerem esses processos. É necessário, portanto, é possível.
Como o senhor define o papel do papa nesses processos?
O papa não é um mágico, mas afirma e prova com sua ação que a aproximação, a cultura do encontro é um caminho viável. Muitas vezes, ele se expressou sobre a "guerra aos pedaços". No encontro, ele também falou de fábricas de guerra que devem mudar em fábricas de paz. O termo "fábrica" nos diz algo que devemos fazer, construir. Posso dizer que ele faz essa obra com uma frase que me parece justa e que indica uma perspectiva imitável: desarmar as consciências armadas. Esse é o objetivo preciso do Papa Francisco.
Na sua conversa, vocês falaram de situações de crise, das guerras na África...
Sim, dentre outras, em particular, também da crise que está se reacendendo entre Ruanda e Congo. Despertam muita preocupação os conflitos entre as etnias hutu e tutsi. Neste momento, a situação em certas áreas da África é muito grave.
Muitas vezes, o papa falou das guerras associando-as ao tráfico de armas. Como o senhor considera isso?
As guerras aos pedaços são o fruto do tráfico de armas e do tráfico de drogas. No cenário geopolítico, esses dois tráficos não são muito distintos. Sempre a guerra está associada ao tráfico de drogas. Financia-se a guerra com o tráfico de drogas, com o contrabando. Nós sabemos disso na América Latina, está documentado.
Quando houve a guerra na América Central com a Nicarágua, a CIA, os Estados Unidos financiaram a guerra com o tráfico de drogas. Isso é história. As guerras do Oriente Médio, no Iraque, no Afeganistão, na Líbia, são financiadas com a droga. E isso é terrível. O contrabando é a causa das guerras. As potências, além disso, têm a capacidade de camuflar isso com motivos religiosos ou com outras justificativas.
Para as repressões e as violências, durante a ditadura na América Latina, utilizaram a justificativa da luta contra o comunismo, e todos aqueles que se opunham e denunciavam a injustiça e a violência da ditadura eram considerados comunistas e subversivos. Eu entreguei ao Papa Francisco uma carta que, um mês antes de morrer, Dom Romero havia escrito para mim "pela solidariedade cristã na nobre causa comum da justiça e da paz".
Com relação ao período da ditadura na Argentina, espera-se a abertura dos arquivos. O senhor falou sobre isso com o papa?
Ele me indicou que a Santa Sé e a Conferência Episcopal Argentina poderão fornecer documentação quando ela for considerada necessária e exigida durante os processos.
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''O papa quer desarmar as consciências.'' Entrevista com Adolfo Pérez Esquivel - Instituto Humanitas Unisinos - IHU