02 Agosto 2025
"Se não houver uma solução supranacional, para o mundo em turbulência, ou pelo menos algum mapa ideal que reabra as portas para essa esperança, o nacionalismo será o eterno vencedor. E a lógica da guerra — veja-se Gaza, veja-se a Ucrânia — é a única lógica legível, na ilegível afasia das outras opções", escreve o jornalista, escritor e roteirista italiano Michele Serra, em artigo publicado por La Repubblica, 29-07-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Em 15 de março, na Piazza del Popolo, em Roma, 50 mil pessoas se reuniram para exigir que a Europa existisse como comunidade política, não apenas como entidade econômico-burocrática.
Entre o Far West de Trump e o Far East de Putin, o espírito daquela praça era buscar um centro de gravidade ideal na identidade europeia, em sua estrutura supranacional e em sua vocação fundadora (Ventotene, Nice) para a democracia, a liberdade, a justiça e a paz. Um abrigo sólido e amplo na tempestade do mundo — assim como a Europa parece aos migrantes, muitas vezes mal recompensados por essa confiança. No evidente colapso do cânone ocidental, aquela praça clamava por um cânone europeu.
Naquele encontro, que poderíamos definir de europeus sem Europa, ou de europeus em busca de Europa, não só não se exaltava o que existia, como se sonhava com o que não existia e, na convicção dos presentes, se devia, mais cedo ou mais tarde, fazer existir. Na pior das hipóteses, uma ilusão, um pio desejo com pouca conexão com a decepcionante situação; na melhor, uma potencial plataforma política. Mas vendo em retrospectiva, em triste sintonia com o entendimento de então, percebemos que o vazio europeu nos parece, hoje, igualmente impreenchível, se não ainda mais profundo e retumbante, como um poço vazio.
O massacre de Gaza produziu na União — poderíamos dizer, em sua consciência, supondo que exista uma — nada além do murmúrio perplexo dos indivíduos, deixando cada Estado membro em seu silêncio confortável ou em sua específica discordância. Como se coordenar uma qualquer reação comum, ato político ou ação humanitária concreta fosse pior do que inconveniente, impossível. Assim, nesse mudo tergiversar, o gesto de Macron (o reconhecimento do Estado palestino, como já feito pela maioria dos países do mundo, incluindo alguns membros da UE) pareceu de uma audácia revolucionária e de impressionante envergadura política, porque no vazio e no silêncio, até mesmo uma simples palavra de bom senso parece um rugido. Muitos de nós pensamos (na ausência de palavras claras e inteligíveis, vale qualquer tentativa de intenções) que as negociações embaraçosas sobre as tarifas, com prazos e métodos sempre ditados pela outra parte, tenham contribuído para sufocar qualquer possível ajuda, política e/ou material, aos palestinos de Gaza, para não contrariar Trump.
No entanto, essa teria sido uma razão pouco louvável, pois, por mais importante que sejam os comércios, por mais respeitável geradora de bem-estar que seja a economia, calar sobre um massacre prolongado e sobre o uso da fome e da sede como armas de guerra é um preço ignóbil. Se não mesmo uma verdadeira cumplicidade. Mas, à luz dos fatos, devemos dizer que não, nem mesmo um cínico realismo econômico explica, muito menos justifica, a inércia da Europa em relação a Gaza: von der Leyen não pode fazer passar aqueles 15% (um gol sofrido) como um sucesso ou uma melhoria em relação ao status anterior. Aqueles 15% são algo que não existia antes, e agora existem. E se a Europa passa de cabeça baixa diante daquelas forcas impostas não por um aliado, mas por um implacável concorrente (por falar no fim do cânone ocidental), isso significa que não apenas a Europa dos valores, aquelas dos belos princípios e das boas intenções, tem a inconsistência do ar (frito) diante da abominação de Gaza; também a Europa negociante, aquela que sabe fazer de conta, carece de força para ditar as regras do jogo – no mínimo, algumas– e, portanto, deve se submeter ao jogo de Trump.
Como é evidente, e politicamente muito relevante, essa inconsistência da Europa entristece muitos (certamente os muitos manifestantes de Roma, e muito mais em geral a opinião pública progressista) e, como é óbvio, alegra aqueles que lutam contra a ideia de unidade europeia por ser nacionalista – como boa parte das direitas europeias – ou por acreditarem incompreensivelmente, "da esquerda", que o europeísmo é o último resquício da supremacia branca. O lúgubre gesto de queimar as bandeiras europeias pertence a essas franjas tão rancorosas quanto inconsistentes; muito mais gravemente, e com poder de fogo infinitamente maior, é o soberanismo, com seu séquito de massa, que se alimenta da fraqueza dos valores e da política da Europa. Se não houver uma solução supranacional, para o mundo em turbulência, ou pelo menos algum mapa ideal que reabra as portas para essa esperança, o nacionalismo será o eterno vencedor. E a lógica da guerra — veja-se Gaza, veja-se a Ucrânia — é a única lógica legível, na ilegível afasia das outras opções. Como Ezio Mauro escreveu recentemente, "o último dever que nos cabe é pedir à Europa, isto é, a nós mesmos, que alimentemos Gaza... Isso não significa substituir a política pela misericórdia: mas dar uma base concreta, material, imediata e popular para aquela ação política que devemos exigir da Europa, se ela quiser escrever sua parte da história em vez de lê-la como uma história alheia". Concordo plenamente. Mas sinto-me compelido a acrescentar que não acredito que isso vá acontecer.
As palavras de Mario Draghi aos eurodeputados em fevereiro passado ressoam cada vez mais na minha cabeça de europeu sem Europa: "Se vocês não fizerem algo, significa que são incapazes de aplicar os valores fundadores da União Europeia".