18 Julho 2025
O texto do projeto aprovado pelos parlamentares ignora a palavra “clima” e vai contra a realidade dos desafios ambientais do século XXI.
A informação é publicada por ClimaInfo, 17-07-2025.
A aprovação pela Câmara dos Deputados do Projeto de Lei (PL) 2.159/2021, que altera as regras do licenciamento ambiental no Brasil, é uma aula de como a atual composição do Congresso Nacional está, em sua maioria, na contramão não apenas da ciência e do bom senso, mas também da vontade dos brasileiros. Em um país machucado por desastres como os de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais, os parlamentares preferiram criar mecanismos para enfraquecer o licenciamento, ao invés de fortalecê-lo.
No Valor, Daniela Chiaretti ressaltou uma ausência gritante no texto do PL: em todos os parágrafos do projeto, não há uma citação sequer à palavra “clima”. Uma lei que se pretende moderna, mas que ignora um dos principais desafios contemporâneos da Humanidade. “A falta de menção à emergência climática em que o mundo se encontra indica o rumo destas regras, que olha para um Brasil do passado e é entendido como um dos mais graves retrocessos socioambientais da história”, assinalou.
“Este resultado demonstra que nossos parlamentares estão mais preocupados em destruir do que aprimorar a legislação ambiental, esvaziando a capacidade do Estado de prevenir e mitigar os impactos de obras Brasil afora. Na prática, é como se tivessem autorizado um médico a fazer uma grande cirurgia sem antes cursar a residência e sem antes consultar o paciente”, comparou Gabriela Nepomuceno, especialista de políticas públicas do Greenpeace Brasil.
Esse retrocesso acontece em um momento inoportuno, a pouco menos de 120 dias para a realização da COP30 em Belém (PA). “Em pleno ano da COP30, o Congresso escolheu passar a mãe de todas as boiadas, ao invés de avançar no enfrentamento da crise climática. A aprovação do PL da Devastação ameaça a liderança do Brasil nas negociações internacionais sobre clima, além de colocar em risco parcerias comerciais e o acesso a financiamentos que exigem o cumprimento de salvaguardas socioambientais”, afirmou o WWF-Brasil.
O desmonte das regras de licenciamento no Brasil terá consequências não apenas ambientais, mas também reputacionais e econômicas, alertou o cientista Carlos Nobre ao site Gigante 163. Para ele, ao invés de beneficiar o agronegócio, os parlamentares podem ter dado um belo tiro no pé do setor, prejudicando sua competitividade internacional. Essa questão ganha mais gravidade agora, no contexto da investigação comercial que o governo dos EUA abriu contra o Brasil que cita o desmatamento como um dos problemas das commodities do país – o que é irônico, considerando o negacionismo de Donald Trump.
”A União Europeia já deixou claro que não admite importar nada que venha de desmatamento a partir de 2021. A gente tem que torcer para que outros países que importam produtos do Brasil, até mesmo os países do Oriente Médio – especialmente a China, o maior importador de produtos do Brasil, como alimentos, carne, soja e muitos outros – adotem o mesmo posicionamento”, defendeu Nobre.
O desastre político imposto pelo Congresso à proteção ambiental no Brasil teve grande repercussão na imprensa, com matérias em Agência Brasil, Brasil de Fato, Correio Braziliense, Deutsche Welle, Estadão, Folha, g1, ((o)) eco, O Globo, UOL e Valor, entre outros. No exterior, Guardian e Reuters destacaram a notícia.
Além da vergonha na votação, os parlamentares também protagonizaram momentos lamentáveis no plenário durante a sessão da Câmara. O deputado Kim Kataguiri (União Brasil/SP) provocou sua colega de Casa, a deputada Célia Xakriabá (PSOL/MG), chamando-a de “cosplay de pavão”.
Outro parlamentar, Rodolfo Nogueira (PL/MS), prosseguiu perguntando, de forma irônica, como funciona o licenciamento para “abater pavões”. As provocações causaram um empurra-empurra no plenário, forçando o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos/PB) a pedir a intervenção da polícia legislativa. Xakriabá lamentou o que chamou de “racismo televisionado” e disse que tomará providências contra os parlamentares que a interpelaram.
Folha, O Globo e Valor deram mais detalhes.