08 Mai 2025
Pesquisa internacional mostra que o 1% mais rico emite até 26 vezes mais carbono que a média global e defende políticas climáticas voltadas aos grandes emissores individuais, incluindo seus investimentos financeiros.
A informação é publicada por Ecodebate, 08-05-2025.
Um novo estudo publicado na revista Nature Climate Change mostra que indivíduos mais ricos possuem uma pegada de carbono significativamente maior — e que essa desigualdade tem impactos concretos no agravamento da crise climática.
De acordo com a pesquisa, os 10% mais ricos da população mundial são responsáveis por dois terços do aquecimento global observado desde 1990, além de contribuírem fortemente para o aumento de eventos climáticos extremos, como ondas de calor e secas.
O levantamento quantificou os impactos climáticos causados pelos grupos com maiores emissões dentro das sociedades e revelou que o 1% mais rico do planeta contribuiu 26 vezes mais do que a média global para o aumento de ondas de calor extremas (classificadas como eventos mensais de ocorrência em 1 a cada 100 anos), e 17 vezes mais para a intensificação das secas na Amazônia.
A pesquisa lança nova luz sobre as conexões entre desigualdade de emissões baseada na renda e injustiça climática, demonstrando como os padrões de consumo e os investimentos dos mais ricos têm impactos desproporcionais nos eventos extremos.
Esses efeitos são especialmente severos em regiões tropicais vulneráveis, como a Amazônia, o Sudeste Asiático e o sul da África – áreas que, historicamente, contribuíram muito pouco para as emissões globais.
“Nosso estudo mostra que os impactos climáticos extremos não são apenas resultado de emissões globais abstratas. Podemos ligá-los diretamente às escolhas de estilo de vida e investimento, que por sua vez estão relacionadas à riqueza”, explica Sarah Schöngart, autora principal do estudo, ex-integrante do programa Jovens Cientistas do Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicados (IIASA) e atualmente vinculada ao ETH Zurich. “Concluímos que emissores ricos desempenham um papel central na intensificação de extremos climáticos, o que reforça a urgência de políticas climáticas voltadas para a redução das emissões desse grupo.”
Utilizando uma metodologia inovadora que combina dados econômicos e simulações climáticas, os pesquisadores conseguiram rastrear as emissões de diferentes faixas de renda em escala global e associá-las a eventos climáticos extremos específicos.
As emissões dos 10% mais ricos dos Estados Unidos e da China, por exemplo, resultaram em um aumento de duas a três vezes na frequência de ondas de calor em regiões vulneráveis.
“Se toda a população mundial tivesse emitido como os 50% mais pobres, o planeta teria experimentado um aquecimento adicional mínimo desde 1990”, afirma Carl-Friedrich Schleussner, coautor do estudo e líder do Grupo de Pesquisa sobre Impactos Climáticos Integrados no IIASA. “Corrigir esse desequilíbrio é essencial para uma ação climática justa e eficaz.”
O estudo também destaca a importância das emissões associadas a investimentos financeiros, e não apenas ao consumo pessoal. Os autores argumentam que políticas direcionadas aos fluxos de capitais e portfólios de indivíduos de alta renda podem gerar benefícios climáticos substanciais.
“Não se trata de uma discussão acadêmica – estamos falando de impactos reais da crise climática, aqui e agora”, acrescenta Schleussner. “Uma política climática que ignora a responsabilidade desproporcional dos mais ricos corre o risco de desperdiçar uma das alavancas mais poderosas para reduzir os danos futuros.”
Os pesquisadores sugerem que seus achados podem embasar instrumentos de política pública progressiva, direcionados às elites econômicas, o que também pode aumentar a aceitação social das ações climáticas.
Cobrar dos grandes poluidores individuais pode, além disso, ajudar a financiar medidas de adaptação e compensação por perdas e danos em países vulneráveis.
Para os autores, reequilibrar a responsabilidade climática de acordo com as emissões efetivas é essencial não apenas para desacelerar o aquecimento global, mas para construir um mundo mais justo e resiliente.
Referência bibliográfica
Schöngart, S., Nicholls, Z., Hoffmann, R., Pelz, S., & Schleussner, C. (2025). High-income groups disproportionately contribute to climate extremes worldwide. Nature Climate Change. Leia aqui.
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