09 Abril 2025
"É por isso que os Evangelhos, apesar da hostilidade generalizada em relação aos testemunhos das mulheres em todas as esferas públicas, não podem deixar de reconhecer que somente o protagonismo delas tornou possível a passagem do discipulado ligado a um rabino e a um messias para outro discipulado, aquele ligado àquele que 'não está aqui, mas ressuscitou'", escreve Marinella Perroni, biblista, fundadora da Coordenação de Teólogas Italianas, em artigo publicado Donne Chiesa Mondo, abril de 2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Às vezes, são justamente os problemas que induzem à curiosidade, provocam perguntas e fazem com que as pessoas descubram algo novo.
Caso se tenha alguma familiaridade com os textos do Novo Testamento, mesmo sem ser especialistas do ramo, pode-se perceber algo que causa perplexidade e levanta questionamentos.
Por exemplo: existe uma conexão entre a ressurreição de Cristo, as mulheres e a loucura?
A comparação entre os relatos das aparições pascoais dos quatro evangelhos e um texto bastante conhecido de uma carta de Paulo é esclarecedora. Os três evangelhos sinóticos concordam em dizer que, além de terem sido testemunhas oculares da morte e do sepultamento, as discípulas que tinham seguido Jesus da Galileia a Jerusalém, ou seja, durante toda a sua missão, também são as primeiras testemunhas da aparição pascal do Anjo que lhes entrega o anúncio da ressurreição e as investe da tarefa de divulgá-lo entre os discípulos. Por sua vez, João se vale de tradições diversas, mas a substância é a mesma: protagonistas dos relatos das aparições não são as discípulas galileias, mas aquela que representa de alguma forma sua responsável, Maria de Magdala, a quem é reservada a única aparição individual do Ressuscitado e a entrega explícita do mandato apostólico aos outros discípulos.
Por outro lado, Paulo, na primeira Carta aos cristãos de Corinto, acompanha a sua declaração de fé sobre a morte e a ressurreição de Cristo com uma lista de várias aparições do Ressuscitado, apoiada por uma série de nomes que têm a função de comprovar os fatos a partir do testemunho dos próprios protagonistas, ou seja, representam a garantia do que a fórmula declara: Cefas, os Doze, quinhentos irmãos, depois Tiago e todos os apóstolos experimentaram as aparições do Ressuscitado como, mais tarde, o próprio Paulo.
Todos são rigorosamente homens. Paulo diz que recebeu aquela fórmula e isso significa que, quando ele escreveu a carta nos anos 50, ela já devia representar um ponto firme da catequese cristã primitiva. O que é transmitido nas comunidades judaico-cristãs da época, portanto, é que a proclamação da fé pascal e o testemunho da ressurreição são garantidos unicamente por homens. Como é possível se, como dissemos, em todos os quatro evangelistas, ao contrário, são apenas as discípulas galileias que testemunham a ressurreição quando encontram o sepulcro vazio na manhã de Páscoa? Não é fácil interpretar tal estrabismo da tradição. Especialmente em uma época como a nossa, em que somos reféns da consciência da tensão entre o Fact e o Fake, e é ainda mais difícil reconstruir eventos que aconteceram em um tempo muito distante e cujo relato chegou até nós apenas por meio de uma cadeia de interpretações.
No entanto, uma indicação existe e merece ser levada a sério.
É interessante notar que uma segunda conclusão é acrescentada ao mais antigo dos evangelhos, o de Marcos, no qual é feita uma referência explícita justamente às aparições a Maria Madalena e aos dois no caminho de Emaús, mas também se insiste no fato de que nenhum dos outros discípulos tinha acreditado no testemunho deles e que isso se torna até mesmo motivo de repreensão por parte do próprio Ressuscitado, durante sua última e decisiva aparição a toda a comunidade liturgicamente reunida em torno dos Onze, “por não haverem crido nos que o tinham visto já ressuscitado” (Marcos 16,9-20).
Pode-se entender, talvez, a necessidade apologética de garantir que a tradição sobre as aparições não se baseasse em experiências individuais que poderiam ser consideradas pouco verificáveis, mas fosse enraizada mais na realidade de todo um movimento religioso que já estava estruturado de alguma forma e se referia à autoridade moral dos discípulos históricos de Jesus. Chama a atenção, no entanto, que a força do testemunho profético das discípulas, se por um lado resulta em um elemento geneticamente irrenunciável para o nascimento da proclamação pascoal, deve, por outro lado, ser temperado pela consciência de sua duvidosa credibilidade: às mulheres se deve a gênese da fé na ressurreição, mas se perde credibilidade se for dada demasiada ênfase ao seu testemunho.
Por quê? Desse ponto de vista, o evangelista Lucas é quem nos permite esclarecer pelo menos um pouco os termos da questão. Para ele, quando Maria Madalena, Joana e Maria, mãe de Tiago, bem como as outras que estavam com elas, contaram aos apóstolos sobre sua experiência de aparição, “pareceram-lhes como um delírio as palavras das mulheres e não lhes deram crédito” (24,11). De acordo com o terceiro evangelista, nem mesmo ao testemunho dos dois discípulos de Emaús foi dado crédito, mas constitui, de fato, uma experiência comunicável e crível (24,35), assim como o de Simão deve ser considerado um evento provido de autoridade (24,34), enquanto somente aquele das mulheres representa um delírio: as mulheres anunciam um querigma incrível (24,9-11) e transmitem uma experiência extática que resulta incomunicável (24,22). A ligação entre visão profética e alucinação, entre experiência extática e loucura começa a abrir caminho.
Além disso, existe um episódio narrado no livro de Atos dos Apóstolos que, mais uma vez, relaciona ressurreição, mulheres e loucura. Quando Pedro, depois de ser libertado da prisão por um anjo, bate à porta da casa de Maria “onde muitos estavam reunidos e oravam”, a jovem empregada chamada Rode, que abre a porta para ele e que corre para anunciar que ele está à porta, é julgada louca. Até pode ser um estratagema literário para aumentar a tensão narrativa, mas, mais uma vez, é um delírio feminino que é motivo de incredulidade.
Até mesmo Paulo, quando fala da ressurreição diante de filósofos epicureus ou estóicos e no Aerópago de Atenas, é tratado como charlatão ou motivo de zombaria (Atos 17,16-34), mas sua visão do Ressuscitado na estrada para Damasco nunca foi tachada de loucura.
Os comentaristas concordam em reconhecer que a tradição sobre as aparições pascoais às mulheres e, com ela, a acusação de fundar a nova fé em uma alucinação, deve ter sido muito arraigada e difundida nos primeiros tempos cristãos. Ainda na primeira metade do século III, o doutor da Igreja Orígenes reagiu polemicamente contra um filósofo chamado Celso, que acusava os cristãos de basear sua fé no testemunho de uma “mulher louca”, dizendo, no entanto, que não conhecia Maria Madalena e trazendo Pedro e Paulo como exemplos alternativos. Misoginia de ambos os lados? É possível. Mas ainda assim se trata de uma explicação insuficiente.
É totalmente razoável que uma nova religião que queria abrir espaço para si em um mundo cultural e religiosamente complexo como aquele do império tivesse que assumir o princípio patriarcal de autoridade e, assim, buscar sua legitimidade na exclusão das mulheres não apenas de papéis e cargos, mas até mesmo da construção da memória coletiva. Essa lógica presidiu a construção da “grande Igreja” e de sua progressiva institucionalização. A questão séria, entretanto, é outra. De fato, a fé na ressurreição de Cristo só poderia nascer fora dessa lógica, só poderia ser induzida com base em fenômenos místicos, visionários e de proféticos impulsos para frente. Somente uma fé visionária que ultrapassa os limites da razão estrita, mas é capaz de envolver todos os sentidos na experiência de uma dimensão do sagrado unicamente acessível em termos místicos, poderia quebrar todas as regras. E para isso, talvez, somente as mulheres, desde sempre sentinelas às portas de entrada na vida e de saída da vida, sentinelas do segredo do nascimento e da morte, poderiam ser as primeiras a perceber como possível outra maneira de encontrar o Mestre, de manter viva sua memória, de não procurar entre os mortos aquele que está vivo.
É por isso que os Evangelhos, apesar da hostilidade generalizada em relação aos testemunhos das mulheres em todas as esferas públicas, não podem deixar de reconhecer que somente o protagonismo delas tornou possível a passagem do discipulado ligado a um rabino e a um messias para outro discipulado, aquele ligado àquele que “não está aqui, mas ressuscitou” (Lc 24,6).
Será que sua fé visionária se alastra naquela que, de acordo com a lógica do mundo, deve ser chamada de “loucura”? É totalmente possível, e não é por acaso que logo foi preciso ativar processo aptos a garantir à nova fé a legitimidade de figuras masculinas de autoridade. Para Marcos, Mateus, Lucas e João, no entanto, é precisamente de sua “loucura” que nasceu o evangelho da ressurreição.