Minas Gerais. A tragédia anunciada. Breves do Facebook

Foto: Pixabay

10 Janeiro 2022

 

Apolo Heringer Lisboa

 

Abaixo, manchete hidrófoba de jornal mineiro, demonizando a chuva, encobrindo erros humanos, falta de planejamento ambiental e falcatruas em obras. Algumas semanas atrás estavam demonizando a seca, sem explicar que não é a sazonal, mas a seca subterrânea instalada pela voraz economia exportadora de água, de commodities, alma do abusivo HIDRONEGÓCIO.

A chuva é apenas a gota d'água expondo a nossa cara! Água é preciosa! Uma benção. Estupidez explica as tragédias.

  

Ricardo Pinto Coelho

 

  

 

 

 

Uma tragédia anunciada pelo estudo da RMPC sobre barragens de mineração em MG.

Colapso com inundação de uma estrutura de apoio à represa de contenção (SAMP) de resíduos na Mina de Pau Branco, Nova Lima, 08 de Janeiro de 2021.

Pelo nosso estudo feito (Atlas das Barragens de Mineração de MG), já publicado, e pelo mapeamento feito por nosso drone na Mina do Pau Branco (fotos abaixo) já era visível o perigo que essas estruturas, que contém milhares de metros cúbicos de rejeito e água servida, representavam, seja para os usuários da BR-040, seja para as inúmeras comunidades ribeirinhas à jusante.

Após o acidente, estamos vendo a estratégia que é a mesma da Vale. Fazem uso de uma terminologia hermética, confusa, contraditória ou até mentirosa.

O fato é que houve um colapso no funcionamento do sistema de barragens, o que causou uma gigantesca enxurrada que está causando ou irá causar uma série de danos ecológicos, danos estruturais em rodovias, pontes, etc.

Tiveram sorte que o acidente não matou gente, mas certamente o evento irá causar a perda de milhares de peixes, aves, anfíbios, e de vegetação terrestre e aquática.

Depois, não reclamar se vier algum surto de dengue, esquistossomose, febre amarela ou leishmaniose, porque os vertebrados que controlam os vetores dessas doenças certamente irão desaparecer numa extensa área da bacia hidrográfica.

E nem vamos falar do perigo de contaminação com metais tóxicos e toda sorte de agentes químicos com potencial tóxico na bacia do rio das Velhas, manancial de BH.

Trata-se da repetição de mais uma tragédia anunciada no setor de mineração de MG. Um alerta a mais para todo o governo de Minas, prefeituras envolvidas, consultores ambientais etc. A ausência de punição para os responsáveis por essas tragédias é simplesmente intolerável.

Em nosso Atlas que mapeou todas as barragens associadas à mineração em MG e em várias entrevistas e outras publicações sempre alertamos que a gestão ambiental de represas no Brasil que é falha e, como resultado, estamos vendo a triste repetição de mais uma tragédia anunciada.

Para maiores informações, acesse aqui.

 

Ricardo Pinto Coelho

 

BR-040/BR-356: o perigo mora ao lado.

Milhares de pessoas usam essas duas rodovias diariamente. Muitos sequer imaginam que podem ser vítimas da atividade de mineração a qualquer momento.

A RMPC fez um levantamento por VANT (drones) dos arredores das BRs 040 e 356 na região metropolitana de BH.

O resultado nos surpreendeu pela proximidade de enormes estruturas ligada ao beneficiamento de minérios (diques, cavas, represas etc.) a apenas poucos metros das pistas de rolamento.

A seguir, apenas alguns exemplos de estruturas que podem colapsar e atingir os usuários das rodovias.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Angela Pinto Coelho

 

Ricardo, você tem que postar essas informações e denúncias, cientificamente provadas por estudos profundos e seríssimos para alertar as pessoas desinformadas e especialmente as autoridades que são assessoradas por verdadeiras "antas" e o povo continua à mercê de catástrofes, morrendo e tendo absurdos prejuízos além dos desastres ambientais e sem nenhuma punição dos responsáveis , verdadeiros criminosos!!!!!!

 

Ricardo Pinto Coelho

 

Olá Angela: nós já publicamos um Atlas das Represas de Mineração do Estado de Minas Gerais. Trata-se de um trabalho feito em conjunto pela UFMG, UFSJ e a UNIFEI que levou alguns anos para ser feito. Você pode ter acesso a website do Atlas aqui.

 

Ricardo Pinto Coelho

 

Apesar de ser um trabalho sério e que envolveu o trabalho de três universidades, não teve boa divulgação pela imprensa e obviamente pelas mineradoras aqui instaladas (que exercem controle sobre os meios de comunicação). Salta aos olhos a impunidade dos responsáveis por esses repetidos desastres. Eu acredito que a população deve exigir de seus representantes e políticos medidas que ponham um fim nessas tragédias.


Maiores informações aqui.

 

Faustino Teixeira

 

Sou um fiel defensor do papa Francisco, e pude testemunhar esse meu encanto em diversos artigos e inúmeras postagens aqui no Facebook. Trata-se, sem dúvida, da maior autoridade moral que temos hoje na humanidade. Há um lindo e compromissado repertório de falas do papa Francisco que são verdadeiros sinais para os nossos tempos conturbados.

Isso não me tira o direito, como teólogo, de pontuar uma vez ou outra alguma incongruência segundo minha particular ótica. Ultimamente levantei duas questões a respeito de seus textos que merecem uma reflexão mais aprofundada.

1. A visão de Francisco sobre o antropocentrismo, que acaba não tirando todas as consequências que a perspectiva crítica ao termo envolve. Na Laudato si (LS), sua carta encíclica sobre o cuidado da casa comum, Francisco levanta importantes questionamentos ao "excesso antropocêntrico", ou ainda ao "antropocentrismo desordenado", mas mantém vigente o antropocentrismo cristão. Penso que essa visão teria que ser melhor matizada, já que importantes campos da reflexão contemporânea fazem críticas contundentes ao excepcionalismo que acaba acompanhando o antropocentrismo. Em importante simpósio ocorrido na Instituto Católico de Paris, o antropólogo Viveiros de Castro fez uma pertinente crítica a esse passo da Laudato si, e deveria ser recuperado.

Vejo hoje como problemática qualquer ideia que vincula uma superioridade do humano sobre as outras espécies do mundo animal, vegetal ou mineral. Somos todos parte do todo, com singularidade, sim, mas nunca com superioridade. Daí a minha reação crítica a Francisco quando sublinha na LS 119 que o pensamento cristão reivindica para o ser humano "um valor peculiar acima das criaturas".

Não concordo com isso. E reforço minha reflexão com as próprias palavras de Francisco na mesma encíclica quando sublinha a importância de um despertar para "uma nova reverência perante a vida" (LS 207). Trata-se de levar a sério a ideia de que "nós mesmos somos terra" e estamos intimamente emaranhados na teia da criação, estreitamente "interligados" (LS 16, 42, 91, 92 e 117).

Francisco defende o conceito que situa o ser humano como "senhor do universo" ou "administrador responsável do mesmo". Com base em reflexões recentes de Oswaldo Giacoia Junior (veja IHU-Ideias n. 326, 2021), diria que os seres humanos não são "senhores dos entes" mas "pastores do ser". Essa é a nossa singularidade e responsabilidade, que raramente vem sendo exercida com dignidade, nesse tempo dos homens-humanos. Baseando de Hans Jonas, Giacoia retoma a crítica ao antropocentrismo, resguardando porém a singularidade do humanismo e o valor da dignidade humana, sem cair em excepcionalismos problemáticos.

2. A visão de Francisco sobre o valor da paternidade: ter ou não ter filhos no tempo atual. Sua visão é fundada numa perspectiva específica da teologia moral, no campo da sexualidade. Mas ainda é refém de uma certa visão cristã sobre a sexualidade que deixa margem pertinente para a crítica atual.

Vejo como extremamente problemática a ideia de que a "negação da paternidade e da maternidade diminui-nos, cancela a nossa humanidade". Foi o que disse Francisco na audiência geral do dia 05 de janeiro de 2021 no Vaticano. São inúmeras as razões que movem pais ou mães a optarem por levar uma vida sem filhos. Não há como fazer juízos de valor a respeito de decisões que são pessoais. Algum preferem adotar animais, e não vejo problema nisso. O problema não está na valorização da relação com os animais, mas no excesso que se filia a mercantilização dos pets. Mas isso também acontece no trato com as crianças. Francisco fala da importância de casais que não podem ser pais valorizar mais a "adoção" de crianças, ainda que o termo "adoção" não seja o mais adequado para alguns.

Quando pude rever as críticas à posição de Francisco a respeito, como a presente no texto de Ruth Aquino no O Globo de 07 de janeiro de 2021, entendo plenamente a insatisfação ali contida. Diz Ruth, com razão, que cansa de ver "tios e tias mais humanos do que muitos pais e mães, que não sabem dar amor ou educação". Ela assinala que essa "santificação feminina" traz consigo uma "face perversa", pois com uma visão dogmática acaba-se por vetar às mulheres o direito sobre o seu próprio corpo. É complicado viver num mundo onde juízes e padres decidem pelas mulheres, diz a autora com razão.

 

Renato Janine Ribeiro

 

Começando o ano do Bicentenário do Brasil, a SBPC celebra o Dia do Fico perguntando: por que tantos jovens doutores ou doutorandos não têm espaço para ficar no País, mesmo querendo?
Formamos muitos doutores mas eles não têm emprego, num País assolado pelo negacionismo e pelo teto de gastos.

 

 

 

Juremir Machado da Silva

 

Memórias da censura: um mês depois de ter tido a entrevista com Lula derrubada dez minutos antes de entrar no ar eu tentei novamente para, quem sabe, resgatar a imagem da emissora. A resposta foi "Lula, aqui, não". A corda se estreitou no meu pescoço.

 

Brazil Imperial

 

"Brasília" e "Imperatória": Os Planos da Nova Capital do Brasil Império

"Em 1823, logo após a Independência, o ministro e deputado José Bonifácio de Andrada e Silva (SP) propôs à Assembleia Constituinte a interiorização da capital. Para ele, uma nova cidade no Planalto Central — a ser batizada de Petrópole (em homenagem a dom Pedro I) ou Brasília — permitiria um melhor controle sobre o imenso território brasileiro e impediria que ele se esfarelasse em pequenas nações naquele conturbado momento pós-Independência.

Na proposta, Bonifácio acrescentou: “Como essa cidade deve ficar equidistante dos limites do Império tanto em latitude como em longitude, vai-se abrir, por meio das estradas que devem sair desse centro como raios para as diversas províncias, uma comunicação e decerto criar comércio interno da maior magnitude. Vai-se chamar para as províncias do sertão o excesso da povoação sem emprego das cidades marítimas e mercantis”.

Dom Pedro I, contudo, dissolveu a Assembleia Constituinte, e o assunto acabou morrendo. Na Constituição logo depois imposta pelo imperador, em 1824, não houve nenhuma menção à mudança da capital.

No reinado de dom Pedro II, a campanha por uma capital no centro do Império renasceu encabeçada por Francisco Adolfo de Varnhagen, o historiador mais renomado da época.

Obcecado pela ideia, o próprio Varnhagen se embrenhou pelos sertões do Planalto Central em 1877 para procurar a localização mais apropriada. Após a expedição, ele sugeriu que se erguesse a cidade de Imperatória (nome em homenagem ao imperador dom Pedro II) entre as lagoas Formosa, Feia e Mestre d’Armas — a grande área dentro da qual hoje se situa Brasília a atual capital brasileira

O senador Holanda Cavalcanti, de Pernambuco inspirado por Varnhagen, apresentou um projeto de lei prevendo uma nova capital. Para o senador, o vazio do interior do Império teria boa utilidade se fosse ocupado por plantações de café, o motor da economia nacional.

"O Brasil deve, em minha opinião, ser mais uma nação agrícola do que comercial. Ora, o desenvolvimento da agricultura em vasta escala não poderá conseguir-se senão promovendo-se a formação de grandes estabelecimentos no centro do Império. O meio mais óbvio que se antolha para realizá-los é a criação da capital nesse centro" argumentou.

Cavalcanti estimou que a cidade poderia ficar pronta em dez anos. Embora não tenha tocado na questão da mão de obra, o senador certamente contava com os escravos negros como os operários da grande construção. A proposta acabou adormecendo nas gavetas do Senado do Império.

O tema voltou com força total na Assembleia Constituinte de 1891, logo depois da derrubada da Monarquia. A Questão da Capital no Interior foi resolvida apenas da Presidência de Juscelino Kubitschek"

Fonte: Agência Senado

 

 

 

Christian Edward Cyril Lynch

 

IDEOLOGIA E HISTORIOGRAFIA

Pra verem a influência da ideologia na historiografia. O presidente da câmara, Clemente Pereira, que encima a petição do Fico, era liberal na época da independência. Tanto que foi perseguido pelos Andrada, autoritários, quando estes redação no poder. Ocorre que, ainda no Primeiro Reinado, Clemente se tornará governista e, depois, membro do Partido Conservador. Quando se começa a fazer historiografia da independência, na década de 1860, ele será odiado pelos liberais, que dirão que ele era absolutista. Chefe do tal "partido português" ou "absolutista", que provavelmente nunca existiu tal como descrito. Já os conservadores o exaltarão.

Com os Andrada, aconteceu o oposto de Clemente. No poder, eram autoritários, e perseguiram então liberais como Clemente e Gonçalves Ledo como furiosos anarquistas. Os irmãos cairão do poder justamente por excesso de autoritarismo. Ocorre que, morto Bonifácio em 1838, os Andrada remanescentes - Martim Francisco e Antônio Carlos - vai aderir ao partido liberal e este último será mesmo primeiro ministro (1840). Melhor: um sobrinho de Bonifácio será um ícone liberal da década de 1850-1860. Então, a historiografia liberal que surge nessa época dos Andrada viram heróis progressistas da independência, representantes da nação, contra o absolutista... José Clemente Pereira!!!!

Pros radicais, claro, ninguém prestava. Todos os personagens da independência, por terem apoiado a independência com a monarquia, eram uns tolos e vendidos, fossem liberais ou conservadores. A "verdadeira independência" só viria com a república (porque o radicalismo depois vira republicanismo). Ela vai defender a independência como "falsa" e entronizar no lugar dos seus atores os "mártires" republicano, como os inconfidentes (Tiradentes, Caneca etc). Essa historiografia, segundo a qual a "verdadeira" independência, república ou abolição só viria quando se acabasse "de fato" com as elites, o imperialismo, do patrimonialismo ou racismo - se tornou no século XX a base da historiografia socialista.

Não há assim uma narrativa da independência do brasil. Há pelo menos três, que com adaptações e atualizações vão se repetindo ao longo dos últimos 200 anos, influenciadas sempre pelo contexto político presente. Mas a história mesmo está noutro lugar. Sempre haverá um rescaldo de ideologia, é certo. Nem por isso se deve desistir de conhecer para além das narrativas histórico-partidárias, que servem mais à luta política do presente do que a um conhecimento menos "interessado" do passado.

 

 

 

Cesar Benjamin

 

A construção de Brasília alterou, para o bem e para o mal, todo o processo de ocupação do território nacional. Nossa infraestrutura, que antes só ligava regiões exportadoras a portos, com caminhos mais ou menos paralelos entre si, passou a ter um ponto central de confluência, de onde saem as estradas como raios de um pneu de bicicleta. Foi a realização de um projeto que nasceu com o visionário José Bonifácio na Assembleia Constituinte de 1823, a primeira depois da Independência, e percorreu toda a história imperial e republicana do país.

 

Ainhoa Díaz

 

"Es duro seguirte Señor, pero es imposible dejarte"

San Agustín

 

 

 

Cesar Benjamin

 

Temos um grupo multidisciplinar que se reúne virtualmente, a cada quinze dias, com gente do Brasil e do exterior. Em cada sessão, alguém faz uma exposição inicial sobre os trabalhos que está fazendo e segue-se o debate.

Recentemente, expus uma pequena parte do que estou estudando. Um economista e um matemático propõem desdobramentos. Minha resposta, abaixo, pode ter algum interesse geral.

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Queridos amigos:

A reflexão que vocês propõem é riquíssima. Vou comentar aqui apenas um aspecto, que talvez não tenha ficado claro no meu improviso ao grupo. Mesmo assim, vai ficar um texto um pouco grande. Copio o H. porque acho que ele tem uma grande contribuição a dar.

Primeiro, ouçamos Descartes: “Pego um pedaço de cera. Aproximo-o do fogo e mudo sua consistência. Mantenho-o aquecido até ver desaparecer cor e odor. Transforma-se em fumaça. A mesma cera permanece após as mudanças? Cumpre reconhecer que permanece. Mas o que permanece? Não cor, sabor, consistência e demais propriedades qualitativas, que se mostraram transitórias. Só permanece uma forma indeterminada que contém todas as formas possíveis. A única propriedade objetiva das coisas é serem extensas, propriedade que se conserva mesmo nas deformações. Se matéria é extensão, conhecê-la é medi-la.”

Temos aí um texto muito representativo da chamada Revolução Científica. Mas esta revolução, centrada na física e na astronomia, está longe de esgotar a transição para o conhecimento moderno. Subestima-se grandemente o gigantesco esforço que a filosofia natural fez, especialmente depois da descoberta da América, para lidar com a diversidade da vida, descrevendo-a e, finalmente, propondo uma classificação capaz de ordená-la.

Essa longa pesquisa, que ocupou muitas gerações (e prossegue), nada teve a ver com os métodos galileanos-newtonianos, mas foi tão importante quanto eles na formação da ciência e da cultura modernas. Sem ela, o continente da vida ficaria de fora do universo da ciência (como os teólogos queriam).

Buffon, o maior naturalista do século XVIII, percebeu que o espaço de Descartes – puramente geométrico, abstrato e mensurável – não se aplicava à biologia. A história natural não podia abrir mão de descrições concretas, cheias de detalhes, de formas, de cor, de cheiros, de mudanças ambientes e da influência do homem, um observador participante. Nesse domínio, a geometria – a grande referência do pensamento científico – nunca teve papel relevante.

Ouçamos Buffon: “A geometria não acrescenta nada ao conhecimento. Apenas desenvolve princípios já estabelecidos com segurança. Acrescenta-lhes consequências mediante deduções sucessivas, sem o menor contato com a realidade. Na vida real, não existem coisas como superfícies sem profundidade, comprimento sem largura, nem nada que responda à definição de posição sem magnitude, nem nada que exiba a regularidade teorética que a geometria atribui aos seus objetos. Assim, o que a geometria nos ensina parece ser apenas um sonho, expresso em uma série de equações. A ideia de explicar a criação em termos de extensão e movimento era pura música celestial, mas o senhor Descartes deixou de ser útil.”

A biologia contemporânea guarda essa memória e preserva raízes nela, realizando até hoje trabalhos que precisam desses elementos qualitativos.

Outros motivos explicam por que a revolução na física não pôde ser transposta à biologia. Na minha palestra, citei que a revolução biológica teve que ser muito mais radical que a física, dos pontos de vista filosófico e teológico. Além disso, dificuldades conceituais separam as disciplinas. A teleologia, por exemplo, foi facilmente expulsa da física, mas não da biologia. As causas finais, de Aristóteles, estão sempre rondando o conhecimento em biologia, a meu ver com boas razões. Não ficarei surpreso se elas fizerem uma reentrada triunfal nesta ciência.

Mas meu ponto central é outro. Creio que todas as ciências – físicas, biológicas e sociais --, com maior ou menor consciência, maior ou menor velocidade, estão tateando a complexidade dos seus objetos, no meio de um caminho que estamos longe de completar. Muitos insights já houve nessa direção, mas ela permanece como a linha do horizonte do conhecimento: conforme nos aproximamos, ela se afasta. Pois a complexidade, por definição, é o que não pode ser previsto nem modelado. Sistemas complexos, como vocês sabem, são muito mais difíceis que sistemas caóticos.

Surgiu na biologia – não na física ou na astronomia – a primeira aproximação consistente dessa característica fundamental do mundo que desejamos compreender. Se isso for verdade, o que chamamos Revolução Científica foi apenas um ensaio parcial de uma coisa muito maior, cuja plenitude ainda não podemos ver.

Paro por aqui. Na filosofia, esse debate nos levaria rapidamente à velha questão de conhecimentos sintéticos e analíticos. Aí, precisaríamos voltar a Parmênides...

Abraços,

Cesar Benjamin

 

Faustino Teixeira

 

"você deve ajudar a aumentar a escolta de amor nesta terra. Cada migalha de ódio que se adiciona ao ódio exorbitante que já existe, torna este mundo mais inóspito e inviável"

Etty Hillesum

 

 

 

Paulo Rezzutti

 

Hoje, dia 9 de janeiro de 1822, faz 200 anos que d. Pedro, então príncipe regente, descumpriu as ordens das Cortes Constitucionais Portuguesas e permaneceu no Brasil. Mas qual seria a real motivação por detrás desse gesto? Em 1820, estourou na cidade do Porto, em Portugal, a Revolução do Porto, que deu início ao fim do absolutismo em Portugal. D. João VI não mandaria mais diretamente no reino. Criou-se uma constituinte, as Cortes Constituintes, que marcou a ascensão da burguesia ao poder D. João foi obrigado a retornar e deixou seu filho como regente no Brasil. Os brasileiros mandaram seus deputados para Lisboa, mas, antes que estes chegassem, os deputados portugueses trataram de passar vários decretos que desmontavam a estrutura administrativa brasileira, eliminando um centro de poder no Brasil, acabando com a câmara de comércio, tribunais e mandando retornar para a Europa o príncipe regente d. Pedro. As elites brasileiras, que até então viam com bons olhos a constituinte portuguesa, onde achavam que teriam voz, se decepcionaram com ela e trataram de demonstrar claramente, ao menos as províncias do Sudeste, que, se d. Pedro não ficasse no país e não descumprisse as ordens, o Brasil se tornaria independente, que não aceitariam o retorno à condição de colônia de Portugal. Para saber mais sobre as causas e efeitos desse dia importante para o processo de nossa Independência, assistam ao vídeo sobre os 200 anos do Fico no meu canal no YouTube:

 

 

#DiaDoFico #BicentenarioDaIndependencia #IndependenciaDoBrasil

#OnThisDay #NumDiaComoHoje #DomPedroI

 

Etty Hillesum, un nuovo senso delle cose

 

′′Você deve seguir os caminhos que a vida delineia diante de você, neste momento, as difíceis vias deste pedaço de história em que hoje nos encontramos vivendo ′′

 

 

 

Faustino Teixeira

 

Bonita reflexão feita ontem, 09/01/2022, no Angelus, por papa Francisco. É uma peça preciosa sobre a ORAÇÃO. Gostei muito. Viva Francisco. Partilho um trecho:

"Reflitamos sobre um ponto importante: no momento em que Jesus recebe o Batismo, o texto diz que ´estava em oração` (Lc 3, 21). Faz-nos bem contemplar isto: Jesus reza. Mas como? Ele, que é o Senhor, o Filho de Deus, reza como nós? Sim, Jesus – os Evangelhos repetem-no muitas vezes – passa muito tempo em oração: no início de cada dia, muitas vezes à noite, antes de tomar decisões importantes...

A sua oração é um diálogo, uma relação com o Pai. Assim, no Evangelho de hoje podemos ver os ´dois movimentos` da vida de Jesus: por um lado, ele desce rumo a nós, nas águas do Jordão; por outro, eleva o olhar e o coração rezando ao Pai.

Esta é uma grande lição para nós: estamos todos imersos nos problemas da vida e em muitas situações complicadas, chamados a enfrentar momentos e escolhas difíceis que nos puxam para baixo.
Mas, se não quisermos ser esmagados, precisamos de elevar tudo para o alto. E a oração faz exatamente isto, não é uma via de fuga, a oração não é um rito mágico nem uma repetição de cânticos aprendidos de cor. Não. Rezar é o modo para deixar Deus agir em nós, para compreender o que Ele quer comunicar-nos inclusive nas situações mais difíceis, rezando para ter forças para continuar.
Muitas pessoas, quando sentem que já não aguentam, rezam: ´Senhor, dai-me a força para continuar`. Também nós já o fizemos muitas vezes. A oração ajuda-nos porque nos une a Deus, abre-nos a um encontro com Ele.

Sim, a oração é a chave que abre o coração ao Senhor. É dialogar com Deus, é ouvir a sua Palavra, é adorar: permanecer em silêncio, confiando-lhe o que vivemos. E por vezes é também gritar-Lhe como Jó, para desabafar com Ele. Gritar como Jó. Ele é pai, compreende-nos bem. Nunca se zanga connosco. E Jesus reza.

A oração – para usar uma bonita imagem do Evangelho de hoje – ´abre o céu` (cf. v. 21). A oração abre o céu: dá oxigénio à vida, dá fôlego também no meio dos afãs e faz com que se veja tudo de modo mais amplo. Sobretudo, permite-nos ter a mesma experiência de Jesus no Jordão: faz-nos sentir filhos amados pelo Pai."

 

 

 

Faustino Teixeira

 

Se tem uma cantora que acompanhei com alegria durante grande parte de minha juventude foi Nara Leão. Tenho praticamente todos os seus discos, sempre adorei sua voz e o seu repertório. Tive também a alegria de estar num de seus últimos shows na boate People no Leblon, um tempo antes de sua morte.

Nara foi um grande exemplo para mim e para uma parte importante da juventude de meu tempo. Uma voz suave e única, uma ternura de pessoa.

Não há como expressar o sentimento que tive hoje, 09/01/2022, ao terminar de ver O Canto Livre de Nara, esse lindo documentário em cinco partes dirigido por Renato Terra, e produção da Globoplay. Cada episódio tem uma singularidade bem especial.

Chico Buarque foi talvez quem expressou melhor a liberdade de Nara Leão: "Ela não se deixava conduzir por nada nem ninguém". Uma pessoa nobre, livre, dona de seu destino e caminhar. Quem teve o privilégio de assistir ao documentário sai com a sensação da leveza e suavidade que marcam a trajetória e o talento de Nara Leão.

Todos os episódios são magníficos, mas gostaria aqui de enfatizar a beleza das três últimas partes. No terceiro episódio, a linda relação de Nara com Chico Buarque, a sintonia de pensamentos, de afinidade musical, de alegria. As entrevistas com Chico são lindas, como também com Marieta Severo.

No quarto episódio, a surpresa de segmentos da MPB (ala nacionalista) com a decisão de Nara dedicar um disco às composições de Erasmo e Roberto Carlos (1978). Nara surpreende mais uma vez, e provoca a reação boba e infantil de Dori Caymmi e Edu Lobo, contestando essa decisão livre de Nara. Como bem disse Nelson Motta, "o pessoal da MPB se sentiu corneado". Coisas engraçadas aconteceram naquele tempo, como a ridícula passeata contra a guitarra elétrica, e que Nara recusou participar.

No quinto e último episódio, que tem o belo título de uma das canções mais lindas interpretadas por Nara - Fiz a cama na varanda -, é simplesmente sensacional. É o episódio mais emocionante, que conta com a participação dos dois filhos de Nara com Cacá Diegues, uma das quais, Isabel, trabalhou como consultora do documentário. Há também uma singular entrevista com Cacá Diegues, contando o casamento com Nara, o tempo do exílio e o nascimentos dos filhos.

Em paisagens lindas com a casa de campo de Nara, o episódio final trata também da longa amizade de Nara com Roberto Menescal, que esteve junto dela nas apresentações dos últimos anos de sua vida. Foi Nara quem despertou novamente em Menescal a alegria de trabalhar com a músical.

Nara partiu muito cedo, com apenas 47 anos de idade, vítima de um tumor cerebral. Viveu porém seus tempos derradeiros com muita alegria, disposição e garra, deixando-nos um maravilhoso legado com seu canto livre e plural.