Aqueles “paraísos” que são o inferno da África

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19 Novembro 2021

 

"Certos 'paraísos' são na realidade o 'inferno' dos mais pobres", escreve o ativista italiano Francesco Gesualdi, coordenador do Centro Nuovo Modello di Sviluppo, de Vecchiano, na Itália, e um dos fundadores, junto com o Alex Zanotelli, padre, missionário na África, ex-diretor da revista Nigrizia, membro Rede Lilliput, em artigo publicado por Avvenire, 18-11-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.

 

Eis o artigo.

 

Pilhagem de recursos e evasão.

Se o Fundo Monetário Internacional também está tratando disso, significa que todos estão percebendo que o problema existe e é sério. Trata-se da evasão fiscal implementada pelas multinacionais da mineração que operam nos países africanos a sul do Sahel. Cerca de quinze, fora os produtores de petróleo. De acordo com dados de 2018, dez dos maiores países mineradores do mundo estão localizados na África Subsaariana com um faturamento anual estimado em 350 bilhões de dólares: cobalto e tântalo na República Democrática do Congo, diamantes em Botswana, ouro na Libéria, Burkina Faso e Tanzânia, bauxita na Guiné, cobre na Zâmbia, platina na África do Sul, urânio na Namíbia. A África contribui com aproximadamente 30% da produção mundial desses minerais, mas com o advento do carro elétrico e outras tecnologias úteis para reduzir a dependência de combustíveis fósseis, a África se tornará importante também pelo grafite e o manganês de que são particularmente ricos Gabão, Gana, Moçambique, Madagascar e o Zimbábue.

 

Mapa do continente africano (Foto: Reprodução | Google Maps)

 

No total, os minerais contribuem com 10% do produto bruto dos 15 países de alto perfil em mineração, enquanto contribuem com 50% de suas exportações. Os verdadeiros protagonistas, porém, são as multinacionais que tratam da extração. Para se ter uma ideia do seu peso, basta dizer que o investimento feito por uma delas em uma única mina de bauxita na Guiné foi cinco vezes maior do que todos os investimentos públicos efetuados pelo governo local de 2018 a 2020.

Mas as riquezas que as mineradoras deixam nos países de extração são bastante limitadas, primeiro porque pagam baixos salários e, depois, porque conseguem evitar os impostos, transferindo indevidamente os lucros para países com baixos impostos. De acordo com um levantamento realizado pelo Fundo Monetário Internacional, os estados africanos perdem de 470 a 730 milhões de dólares todos os anos devido à sonegação de impostos praticada pelas multinacionais da mineração. E isso parece ser apenas a ponta do iceberg.

As técnicas à disposição dos grandes grupos para transferir lucros para o exterior (o famoso profit shifting) são várias, mas todas baseadas na manipulação de relações econômicas, às vezes verdadeiras, às vezes falsas, estabelecidas com outras subsidiárias, localizadas em paraísos fiscais. Entre as mais recorrentes estão o superfaturamento de serviços obtidos por filiais no exterior, o subfaturamento de minérios vendidos a filiais no exterior, a adoção de penalidades elevadas por violações contratuais banais previstas exclusivamente para justificar pagamentos ao exterior. Por exemplo, na Libéria, foi documentado o caso de uma multinacional que, no contrato de venda a uma filial sua domiciliada em um país de baixa tributação, havia inserido uma série de cláusulas sobre a qualidade do mineral, sobre os prazos de entrega, sobre os tempos de transporte, que se teriam pontualmente verificado, reduzindo significativamente a quantidade de dinheiro que a filial estrangeira teria que pagar.

Mas, uma vez no exterior, o minério seria revendido a preços normais de mercado, permitindo que a filial obtivesse enormes lucros colocados no paraíso fiscal. O nome da multinacional não foi revelado, mas apurou-se que durante vários anos foram implementadas reduções de preços até 10% que permitiram ao grupo transferir lucros para o exterior de vários bilhões de dólares.

Outra prática bastante frequente é a abertura de uma relação de empréstimo entre a empresa extratora de minérios e uma financeira do grupo domiciliada em um paraíso fiscal, de forma a poder justificar a transferência legal de dinheiro a título de juros, geralmente fixados em taxas muito altas.

O recente acordo alcançado no G20 para introduzir em todos os países do mundo um imposto mínimo sobre as rendas de capital de 15% deveria ajudar a reduzir a praga da fuga ilegítima dos lucros. Quanto mais os regimes tributários forem uniformizados, menos se torna interessante transferir os capitais. E se isso é saudável para países com economias avançadas, ainda mais saudável é para países de baixa renda, onde as necessidades sociais a serem atendidas são enormes. Basta dizer que, para os objetivos de desenvolvimento sustentável traçadas para 2030, aos países do Sul faltam 2,5 bilhões de dólares todos os anos. Também devido à falta de arrecadação fiscal provocada pelas fugas indevidas dos lucros da mineração.

Certos "paraísos" são na realidade o "inferno" dos mais pobres.

 

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