E a terceira vez que as pesquisas em mudanças climáticas são agraciadas com o Nobel. Primero foi Paul Crutzen, Mario Molina e Roland que ganharam o Nobel de Química, pela descoberta do dano à camada de ozônio. Depois foi o IPCC que ganhou o Nobel da Paz. Agora o Nobel de Física de 2021 vai para os pioneiros do desenvolvimento dos modelos climáticos e sistemas complexos dinâmicos.
Mais que estratégico, importante para endossar a relevância da Ciência das Mudanças climáticas em tempos negacionistas.
Cientistas que criaram modelos matemáticos para simular o clima da Terra ganham Nobel de Física de 2021. Disponível aqui.
Não é que Guedes e Campos Neto tinham “acesso” à informação privilegiada. As coisas são muito mais graves. Eles, como ministro da Economia e presidente do BC, estão entre os que produzem decisões que, se chegam ao conhecimento de “insiders”, se transformam naquela informação. Ou seja, não apenas possuem acesso a dados estratégicos, mas também autoridade para intervir nesses fatos e produzir consequências. Com milhões de dólares lá fora e na posição que estavam, o potencial de manipulação é óbvio. Uma investigação detalhada, com afastamento provisório de ambos dos cargos que ocupam, seria o mínimo a fazer vivêssemos ainda em uma república.
O que os donos da Prevent Senior, do grupo Guararapes (Riachuelo) e da CNN Brasil e o quase candidato à Presidência da República em 2018, Flávio Rocha, têm em comum? Todos são proprietários de offshores em paraísos fiscais. Por Metrópolis.
25 sócios ou donos de 20 das maiores empresas do Brasil têm offshores em paraísos fiscais
Pandora Papers revelam offshores de sócios da Prevent Senior, MRV e outros empresários Disponível aqui.
Muita gente admira e enche a boca para elogiar Darcy Ribeiro. Ok, legal! Está certo. Mas é preciso conhecer e admirar também a mulher que, nesse caso, legitima plenamente o ditado segundo o qual “por trás de todo grande homem existe uma grande mulher”.
Berta Gleizer Ribeiro foi companheira de vida e obra de Darcy e contribuiu enormemente nas pesquisas dele. Etnóloga, antropóloga e museóloga, é lembrada como uma autoridade no estudo da cultura indígena brasileira. Não só estudava os indígenas, como fez de sua proteção um dos grandes objetivos de vida, lutando para que os direitos dos povos originários fossem mantidos. Romena, Berta veio fugida com a família para o Brasil por conta do crescente antissemitismo no Leste Europeu. Seu pai seria assassinado em um campo de concentração, e a mãe cometeria suicídio.
Em 1948, Berta e Darcy Ribeiro casam-se, vinculando suas vidas e trajetórias profissionais. Berta passa a acompanhar o marido às visitas de campo, conhecendo as tribos indígenas do Mato Grosso e, com base nessas expedições e na sua formação em Geografia e História, começa a especialização em etnologia indígena. Torna-se especialista no artesanato, arte e tecnologia dos povos nativos. Quando Darcy Ribeiro foi preso durante a ditadura militar, foi Berta que agilizou sua soltura e depois o acompanhou no exílio. Mesmo depois de separados, Berta e Darcy continuaram trabalhando juntos e, paralelamente, desenvolvendo pesquisas individuais.
Berta Ribeiro foi grande colaboradora do Museu do Índio e do Museu Nacional, além de liderar a campanha pela demarcação das terras indígenas. Em 1995, dois anos antes de morrer, Berta recebeu do governo brasileiro a Ordem Nacional do Mérito Científico. Uma mulher a ser celebrada e lembrada especialmente nesse momento em que um governo obtuso e nefasto ataca os direitos indígenas, o meio ambiente e a ciência. Viva Berta Ribeiro!
Tem cuidado com tua vida, talvez ela seja o único evangelho que algumas pessoas vão ler
Francisco de Assis
Carxs amigxs, aproveitando a volta do cercadinho do Zuck para uma divulgação:
Entre os dias 22 e 24 de Outubro acontece o 1st Brazil Indigenous Film Festival UK, no Institute of Contemporary Arts (ICA-London).
O festival tem curadoria minha e do Takumã Kuikuro, e é fruto de uma pesquisa realizada na Universidade de Manchester, com supervisão da prof. Lúcia Sá. A produção e co-realização é do People Palace Project - Queen Mary University of London.
É uma grande alegria poder exibir a produção audiovisual indígena no ICA.
O Festival acontecerá presencialmente e on-line. A programação está no site do ICA.
Não percam!
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From the 22nd to the 24th of October, the 1st Brazil Indigenous Film Festival UK (BIFF-UK) takes place at the Institute of Contemporary Arts (ICA-London).
Curated by myself and Takumã Kuikuro, the Festival is the result of research carried out at the University of Manchester, supervised by prof. Lucia Sá. The festival is co-organised by the People Palace Project - Queen Mary University of London.
It is a great pleasure to exhibit indigenous audio-visual productions at the ICA.
The festival will take place both in person and online. The schedule is available on the ICA website.
Don´t miss it!
Brazil Indigenous Film Festival 2021. Disponível aqui.
“Na tradição ocidental Francisco de Assis é visto como uma figura exemplar de grande irradiação. Com fina percepção sentia o laço de fraternidade e de sororidade que nos une a todos os seres. Ternamente chama a todos de irmãos e irmãs: o sol, a lua, as formigas e o lobo de Gubbio. As coisas tem coração. Ele sentia seu pulsar e nutria veneração e respeito por todo ser, por menor que fosse. Nas hortas, também as ervas daninhas tinham o seu lugar, pois do seu jeito elas louvam o Criador.
O coração de Francisco significa um estilo de vida, a expressão genial do cuidado, uma prática de confraternização e um renovado encantamento pelo mundo. Recriar esse coração nas pessoas e resgatar a cordialidade nas relações poderá suscitar no mundo atual o mesmo fascínio pela sinfonia do universo e o mesmo cuidado com irmã e mãe Terra como foi paradigmaticamente vivido por São Francisco.”
PASTOR DA ASSEMBLEIA DE DEUS NO ENCONTRO “FÉ E CIÊNCIA: RUMO À COP26”
Chamou atenção a presença do pastor Abner Ferreira (Igreja Assembleia de Deus – Ministério Madureira) no encontro organizado pelo Vaticano entre cientistas e líderes religiosos que antecede a COP26 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas a ser realizada em Glasgow, na Escócia, de 31 de outubro a 12 de novembro).
É fato que o pastor assembleiano não tem nenhum histórico de engajamento pessoal e muito menos a sua denominação quando o tema é “ecologia” ou “meio ambiente”. Sinceramente gostaria muito de saber quais foram os caminhos que o pastor Abner percorreu para chegar em um encontro dessa envergadura.
A Igreja Evangélica Assembleia de Deus (as duas maiores, Belém e Madureira) não tem nenhum documento oficial tratando do tema. A CPAD (Min. Belém) já trabalhou esse tema em 2015 em uma das suas revistas “Lições Bíblicas” com os jovens. Já o Min. Madureira não há nada sobre o tema “ecologia” escrito. Isso significa que esse tema não é alvo de reflexão.
Diferente das Assembleias de Deus, algumas igrejas vêm se dedicando ao tema de maneira expressiva. A Igreja Metodista do Brasil já emitiu documentos oficiais sobre “A responsabilidade ecológica da igreja”. A Igreja Luterana, de igual modo. Os luteranos têm na “Oração Ecológica” (de Martinho Lutero) a base quando falam sobre o assunto. A Igreja Batista, por meio da Convenção Batista Brasileira, emitiu documentos oficiais sobre o tema ecologia. A “Carta de Niterói” é toda dedicada ao tema, denunciando os danos ambientais que o capitalismo promove.
Gostaria de entender o que foi fazer nesse encontro no Vaticano o pastor Abner Ferreira. Além de não ser o mais indicado para estar ali, a sua denominação no Brasil (diferente das Assembleias de Deus dos EUA) não mantém nenhum vínculo ecumênico com o Vaticano.
Agora se o motivo foi conhecer o Papa Francisco pessoalmente, é um bom motivo. Chegou a tirar uma foto com Francisco, mas o reverendo da Catedral da Assembleia de Deus em Madureira, no Rio de Janeiro, não divulgou a foto que fez. Talvez por receio de represália. Alguém poderia chamá-lo de “ecumênico”, o que seria uma inverdade, é bom que se diga.
Após dois anos de atraso, enfim, ‘Marighella’, de Wagner Moura, vai estrear. Disponível aqui.
O governo Bolsonaro quer aumentar o IOF neste ano para ampliar os beneficiados do Bolsa Família de 14 milhões para 17 milhões.
Quer sustentar esse aumento em 2022 deixando de pagar precatórios já concedidos pela Justiça.
A partir daí, o programa não tem mais nenhuma fonte de financiamento. Só restam as dívidas que serão adiadas.
A benesse tem a duração exata do calendário eleitoral.
É uma desfaçatez explícita.
Puxa vida, quem poderia imaginar que um único indivíduo controlando a comunicação virtual de bilhões de pessoas, sem regulação, sem responsabilização, sem se sujeitar a nenhum controle democrático, não era uma ideia muito boa, né mesmo?
A parte inacreditável da história foram os funcionários do Facebook sem conseguir entrar no prédio porque os crachás que dão acesso funcionam com … o login de sua conta de Facebook! Se fosse um filme, já seria suficiente para parecer de quinta categoria.
É uma luta do nosso tempo: manter as possibilidades de inovação tecnológica enquanto criamos mecanismos de regulação democrática sobre duas ou três empresas que têm sobre nós um controle que nenhuma empresa jamais teve.
Enriquecimento de Paulo Guedes
Andam dizendo que Globo, Estadão e Folha estão poupando Paulo Guedes e Roberto Campos Neto, escondendo as notícias sobre a dinheirama dos dois e dos amigos ricos deles em paraísos fiscais.
Não concordo muito em relação à Folha, que até vinha bem e agora abriu a porteira. O jornal está publicando, com chamada de capa, uma reportagem da BBC News destruidora da imagem de Guedes.
Ah, dirão, mas é texto dos outros e até meio que passa pano. Não interessa. Importa que o jornal está publicando algo comprometedor.
Guedes ganhou, e ganhou muito, com a valorização do dólar frente ao real, com sua conta no Exterior.
A reportagem é boa, didática, qualquer um entende o que aconteceu: Guedes, o comandante da economia, ficou 40% mais rico com a política que ele mesmo comanda.
Em qualquer outro país em situação de normalidade, o sujeito seria mandando embora, talvez até na América Latina.
Alguns acham que, em circunstâncias normais, poderia ser preso por ter adotado uma política que o enriqueceu.
Abaixo, a íntegra da reportagem.
BBC News
Como alta do dólar elevou fortuna de Guedes em paraíso fiscal no exterior
Alta da moeda desde 2019 fez com que patrimônio valorizasse pelo menos R$ 14 milhões
Camilla Veras Mota e Mariana Schreiber
Em quase três anos à frente do Ministério da Economia, Paulo Guedes deu uma coleção de declarações polêmicas — muitas delas envolvendo o dólar, que ficou quase 40% mais caro desde o início do governo de Jair Bolsonaro.
Algumas dessas frases foram relembradas nas redes sociais pelos brasileiros neste domingo (3/10), quando veículos de imprensa mostraram que Guedes mantém US$ 9,5 milhões (R$ 51 milhões, no câmbio atual) nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal no Caribe.
Os documentos que revelam que o ministro da Economia é dono de uma offshore milionária são parte de um megavazamento de informações que expôs figuras públicas de diversos países, batizado de Pandora Papers.
As reportagens foram feitas no âmbito do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), do qual fazem parte, no Brasil, a revista Piauí, os portais Metrópoles e Poder 360 e a Agência Pública.
Entre as manchetes compartilhadas nas redes sociais, os brasileiros relembraram um episódio de fevereiro de 2020, quando o ministro afirmou que o dólar alto seria positivo porque "empregada doméstica estava indo para a Disney, uma festa danada".
Antes disso, em novembro de 2019, Guedes afirmou, em visita a Washington, que os brasileiros deveriam "se acostumar" com o câmbio mais alto, que seria um reflexo da nova política econômica, com juro de equilíbrio mais baixo. "O dólar está alto? Problema nenhum, zero", disse, na ocasião.
Mais recentemente, em junho, já com o dólar consistentemente acima de R$ 5, o ministro repetiu, em fala na Fiesp, que ele e sua equipe queriam o "juros mais baixos e câmbio de equilíbrio um pouco mais alto".
O dólar hoje representa, indiretamente, uma das principais pressões sobre a inflação, com impacto que vai dos preços de combustíveis aos dos alimentos, passando inclusive pelos produtos fabricados pela indústria nacional, já que muitos usam componentes importados.
Para quem tem investimentos no exterior, contudo, o dólar mais caro tem um efeito positivo, já que faz crescer o equivalente em reais das aplicações.
Foi isso o que aconteceu com os recursos mantidos na Dreadnoughts International, a empresa offshore fundada por Guedes em setembro de 2014 nas Ilhas Virgens Britânicas.
A alta do dólar desde 2019 fez com que o patrimônio valorizasse pelo menos R$ 14 milhões. Hoje, o equivalente em reais dos US$ 9,55 milhões aportados na empresa é de R$ 51 milhões.
Como as decisões e declarações do ministro têm impacto direto sobre o mercado de câmbio, muitos especialistas enxergam um conflito de interesses direto entre o cargo público exercido por Paulo Guedes e seu papel como investidor.
As offshores não são ilegais no Brasil, desde que os recursos sejam declarados à Receita. A diferença, neste caso, é o fato de que Guedes é servidor público. O Código de Conduta da Alta Administração Federal proíbe, em seu Artigo 5º, que funcionários do alto escalão mantenham aplicações financeiras passíveis de serem afetadas por políticas governamentais, no Brasil e lá fora.
Em suas manifestações à imprensa, o ministro tem reiterado que cumpriu o que ordena o código de conduta e que, como manda a norma, informou à Comissão de Ética Pública sobre seus negócios no prazo estipulado, até dez dias após assumir o cargo
Nesse aspecto, uma outra questão emergiu por meio do Pandora Papers: o caso só foi julgado no último mês de julho, mais de dois anos e meio depois. A Comissão decidiu arquivar sem divulgar suas razões, sob a justificativa de que o caso seria sigiloso por envolver dados sensíveis.
O advogado Wilton Gomes, mestre e doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), considera "absurdo" o período de dois anos que a comissão levou para avaliar o caso do ministro. Para ele, ainda que exista a questão de sigilo, os motivos que embasaram a decisão são uma questão de interesse público e, por isso, deveriam ser discutidos de forma mais transparente.
Sobre o parecer, ele afirma que a redação do Artigo 5º do Código de Conduta é clara para o caso de Guedes.
"O conflito de interesse está instaurado, por mais que não tenha havido ação deliberada para aquela finalidade. Não é preciso comprovar que ele teve alguma atitude que o favorecesse, mas evitar o conflito de interesse."
Assim, para ele, a conduta correta seria que ou o ministro repatriasse os recursos ou, caso decidisse mantê-los no exterior, que se afastasse do cargo.
Depois da repercussão do caso, por meio de nota, a Comissão de Ética Pública da Presidência afirmou que, diferentemente do que dizem as reportagens, a declaração de Guedes foi analisada em maio de 2019 — essas informações, contudo, não constam nas atas e notas disponíveis no site da comissão e às quais a própria nota faz referência.
O potencial conflito de interesses entre o "Paulo Guedes ministro" e o "Paulo Guedes investidor" vai além do câmbio. Uma questão que pode afetar diretamente seus recursos no exterior é a tributação desses valores. Hoje, os rendimentos que pessoas físicas têm com empresas offshore só são taxados quando há saques desses investimentos.
Em uma proposta enviada pelo Ministério da Economia ao Congresso para alterar a tabela do Imposto de Renda e outros tributos estava previsto que essa cobrança sobre ganhos em offshore fosse feita anualmente, em caso de empresas estabelecidas em paraísos fiscais. Depois, porém, isso foi retirado, em comum acordo entre Guedes e o relator da matéria na Câmara, o deputado Celso Sabino (PSDB-PA).
O parlamentar disse no final de julho que pretendia reincluir a mudança, mas projeto de lei foi aprovado no início de setembro na Câmara sem esse ponto e agora está em análise no Senado. A BBC News Brasil tentou ouvir o deputado por telefone em seu gabinete e no celular, mas ninguém atendeu às ligações.
A proposta de taxar anualmente os ganhos em offshore gerou resistência de setores econômicos que mantêm recursos no exterior. Em evento organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Guedes disse em julho que a ideia foi retirada no Congresso para não complicar a tramitação do projeto de lei.
"O que estiver certo, acertamos aqui com a indústria… 'Ah, não, tem que pegar as offshores e não sei quê'. Começou a complicar? Ou tira ou simplifica. Tira. Estamos seguindo essa regra", afirmou.
"Não vamos botar em risco a retomada do crescimento econômico sustentável, que é o que está acontecendo. Então, quero deixar essa mensagem tranquilizadora. Quero agradecer o apoio de todo mundo que está nos ajudando, levando sugestões, dizendo 'ó, cuidado que isso aqui está errado'", continuou o ministro na ocasião.
A advogada Bianca Xavier, professora de direito tributário da Fundação Getúlio Vargas (FGV), reforça que não há ilegalidade em possuir recursos em uma offshore, desde que os valores sejam declarados à Receita Federal e ao Banco Central (no caso de superarem US$ 1 milhão) e que os tributos sejam pagos corretamente em caso de saques.
Segundo a professora, gerir recursos a partir de uma offshore no exterior, em geral, permite ao investidor pagar menos impostos quando se trata das cobranças sobre a empresa.
Já quando a pessoa saca esses recursos, explica Xavier, ela terá que necessariamente pagar imposto sobre todos os ganhos de rendimento do período.
A vantagem da offshore, ressalta, é que o investidor não precisa pagar esse tributo regularmente, como ocorre no Brasil, mas apenas ao final da aplicação, quando saca. É o chamado diferimento de impostos.
Na sua visão, o ministro não parece estar agindo de modo antiético com relação a seus investimentos em offshore, já que partiu do próprio governo a proposta original de incluir na reforma tributária a taxação anual desses rendimentos. Para ela, é inevitável que o ministro lide com políticas que o afetem diretamente.
"Se for considerar um conflito ético, nenhum ministro da Fazenda poderia falar de Imposto de Renda. Todos nós somos contribuintes. Teria, então, que ser um ministro muito pobre para não ter nenhum tipo de renda. Acho que ele tem que seguir pela impossibilidade", afirma a professora.
No entanto, o ministro pode ser beneficiado por outro ponto desse projeto de lei aprovado na Câmara e que ainda está em análise no Senado. O texto que recebeu o aval dos deputados prevê alíquota reduzida de 6% para quem decidir pagar antecipadamente o imposto sobre bens no exterior incluídos na declaração de Imposto de Renda deste ano (ano base 2020).
A alíquota normal no caso de investimentos em offshore varia de 15% a 27,5%. Ou seja, se isso for aprovado também no Senado e Guedes aderir ao pagamento antecipado, poderia economizar parte do tributo devido.
A justificativa apresentada para essa medida é a necessidade do governo aumentar a arrecadação com a antecipação desse e de outros tributos — o projeto de lei também dá desconto para pagamento antecipado sobre ganho de capital com valorização de imóveis.
Bianca Xavier lembra que a gestão Bolsonaro prometeu atualizar a tabela do Imposto de Renda, o que significa aumentar o número de brasileiros isentos da cobrança e reduzir um pouco os impostos pagos pelos demais.
A antecipação de tributos ajudaria a compensar num primeiro momento essa perda de arrecadação — solução considerada controversa por especialistas, já que a receita menor com a atualização da tabela do Imposto de Renda será permanente.
À questão tributária, Pedro Rossi, professor do Instituto de Economia da Unicamp, acrescenta o âmbito regulatório. Paulo Guedes é, junto do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, membro do Conselho Monetário Nacional (CMN), que tem autonomia para aprovar uma série de medidas infralegais que também têm impacto sobre investimentos no exterior.
Campos Neto também foi citado no Pandora Papers. Sua offshore, a Cor Assets S.A, ficava situada no Panamá. À diferente de Guedes, ele encerrou as operações da empresa em julho do ano passado —mais de um ano depois de assumir a liderança do BC, contudo.
"São dois personagens da alta elite financeira, pessoas com milhões de dólares lá fora, beneficiados pela liberalização que eles mesmo promovem dentro dessa institucionalidade frouxa que alimenta conflito de interesses", diz o economista.
"Ambos têm influência sobre instrumentos de política cambial, fiscal e monetária, e estão conduzindo hoje o maior processo de liberalização financeira desde 1990", completa Rossi, referindo-se à iniciativa de mercados de capitais, conhecida pela sigla IMK, um conjunto de iniciativas que visa desenvolver o mercado de capitais no Brasil.
Entre as medidas aprovadas pelo CMN no âmbito do IMK ele destaca a ampliação das operações com derivativos no exterior, algo que, na sua avaliação, vai na contramão das discussões sobre redefinição do papel do Estado e controles sobre o mercado financeiro após a grande crise de 2008.
"A política fiscal, por exemplo, é mais democrática, passa pelo processo orçamentário, pelo legislativo. Já a política monetária e cambial depende de um conselho [CMN] que lhe dá diretrizes e que não tem representatividade, que toma decisões pouco democráticas e que é pouco transparente."
Em nota enviada à BBC News Brasil, a assessoria de Paulo Guedes afirma que as atividades privadas dele anteriores à sua posse como ministro foram informadas aos órgãos competentes.
"Toda a atuação privada do ministro Paulo Guedes, anterior à investidura no cargo de ministro, foi devidamente declarada à Receita Federal, Comissão de Ética Pública e aos demais órgãos competentes, o que inclui a sua participação societária na empresa mencionada", diz trecho da nota enviada.
A nota disse ainda que a atuação de Guedes "sempre respeitou a legislação aplicável e se pautou pela ética e pela responsabilidade".
Já assessoria de imprensa de Campos Neto enviou nota à BBC News Brasil afirmando que todo o seu patrimônio, no país e no exterior, foi declarado à Comissão de Ética Pública da Presidência da República, Receita Federal e ao Banco Central.
A nota diz ainda que Campos Neto não fez nenhuma remessa de recursos ao exterior depois de assumir o Banco Central e que, desde então, não faz parte da gestão das suas empresas.
Não foi apenas no Brasil que o Pandora Papers identificou políticos como proprietários ou beneficiários de empresas offshore. De acordo com o consórcio, ao todo, 35 líderes o ex-líderes de países em todo o mundo e outros 300 agentes públicos aparecem nos documentos vazados.
Entre as outras revelações feitas pelo consórcio estão informações sobre o uso de empresas offshore pelo ex-primeiro ministro britânico Tony Blair para a compra de um escritório em Londres e a fortuna avaliada em US$ 94 milhões do rei Abdullah Il bin Al-Hussein, da Jordânia, em propriedades nos Estados Unidos e no Reino Unido.