Cai a fecundidade na China durante a pandemia

Mais Lidos

  • “A destruição das florestas não se deve apenas ao que comemos, mas também ao que vestimos”. Entrevista com Rubens Carvalho

    LER MAIS
  • Povos Indígenas em debate no IHU. Do extermínio à resistência!

    LER MAIS
  • “Quanto sangue palestino deve fluir para lavar a sua culpa pelo Holocausto?”, questiona Varoufakis

    LER MAIS

Revista ihu on-line

Zooliteratura. A virada animal e vegetal contra o antropocentrismo

Edição: 552

Leia mais

Modernismos. A fratura entre a modernidade artística e social no Brasil

Edição: 551

Leia mais

Metaverso. A experiência humana sob outros horizontes

Edição: 550

Leia mais

27 Mai 2021

 

"O fim da “Política de filho único” não significa que a China terá um aumento significativo da taxa de fecundidade e nem evitará um declínio da população ao longo do atual século", escreve José Eustáquio Diniz Alves, demógrafo e pesquisador em meio ambiente, em artigo publicado por EcoDebate, 26-05-2021.

 

Eis o artigo.

 

“A população mundial precisa ser estabilizada e, idealmente, reduzida gradualmente”

Alerta dos cientistas mundiais sobre a emergência climática (05/11/2019)

 

A China realizou o seu 7º recenseamento geral em 2020 e a pandemia não foi desculpa para ficar procrastinando o censo demográfico, como ocorreu no Brasil. A população chinesa era de 582,6 milhões de habitantes no censo de 1953, pulou para 1,34 bilhão em 2010 e chegou a 1,41 bilhão de habitantes em 2020, segundo o gráfico abaixo do jornal Global Times.

(Foto: EcoDebate)

Na época do 1º censo, o número de nascimentos anuais na China estava em torno de 20 milhões. Na época do “Grande Salto para Frente” (1958 e 1961) houve uma grande crise de mortalidade (cerca de 30 milhões de óbitos) e uma redução momentânea no número de nascimentos. Mas logo em seguida houve uma recuperação da taxa de natalidade e o número de nascimentos chegou a 30 milhões. No restante da década de 1960, durante a Revolução Cultural, o número anual de nascimentos ficou acima de 25 milhões. Mao Tsé-tung achava que uma população grande era mais impactante do que uma bomba atômica e dizia: “quanto mais chineses, mais fortes seremos”.

Contudo, com a população chinesa chegando a 1 bilhão, o presidente Mao se convenceu que algo deveria ser feito para evitar a continuidade da explosão demográfica. Assim, foi lançada a política “Mais Tarde, Mais Tempo e em Menor Número” (em chinês: “Wan, Xi, Shao” e em inglês: “later, longer, fewer”) que incentivava as mulheres a terem o primeiro filho em idades mais avançadas, que mantivessem um espaçamento maior entre os filhos e que limitasse o tamanho da prole, adotando um tamanho pequeno de família.

A política “Wan, Xi, Shao” foi um sucesso e, em pouco tempo, o número anual de nascimentos ficou abaixo de 20 milhões. Porém, no bojo das reformas implementadas por Deng Xiaoping em dezembro de 1978, foi instituída a “Política de filho único”, a iniciativa controlista mais draconiana da história da humanidade. Entre 1980 e 2000, o número anual de nascimentos ficou acima de 20 milhões devido à alta proporção de mulheres em período reprodutivo. A taxa de fecundidade estava caindo, mas o número de nascimentos permanecia alto, pois, embora as mulheres estivessem tendo menos filhos em média, havia mais mulheres tendo filho.

Passado o efeito da estrutura etária (que tinha alta proporção de mulheres em período reprodutivo), o número anual de nascimentos começou a cair e ficou em torno de 16 milhões de bebês, espantando de vez a possibilidade de um crescimento desregrado da população. Neste novo contexto, o governo chinês colocou fim à política de filho único. Em outubro de 2015, foi permitido a todos os casais terem o segundo filho e, em 2018, foram eliminadas as restrições ao controle dos nascimentos. O que o censo 2020 revelou foi a continuidade da queda das taxas de fecundidade e um rápido processo de envelhecimento, conforme as pirâmides abaixo.

(Foto: EcoDebate)

O número de crianças nascidas no gigante asiático caiu para 12 milhões no ano passado, segundo o Escritório Nacional de Estatísticas, menos do que os 14,7 milhões registrados em 2019. A população chinesa cresceu 0,57% ao ano no período 2000-2010 e 0,53% ao ano no período 2010-2020. Mas os dias de crescimento estão com data marcada para encerrar, pois a partir de 2023 a população chinesa começará um longo processo de declínio demográfico.

O demógrafo He Yafu, disse ao Global Times que não há dúvida de que a China levantará totalmente as restrições à natalidade em um futuro próximo para lidar com o declínio da taxa de fecundidade e a China provavelmente removerá sua política de planejamento familiar já neste outono, durante a sexta sessão plenária do 19º Comitê Central do Partido Comunista da China (PCC). Porém, a suspensão total das restrições à natalidade não será suficiente para evitar uma queda na população total da China. O resultado do número de pessoas em diferentes grupos etários revelou que o número da força de trabalho da China encolheu mais rapidamente na última década, enquanto o envelhecimento da população continuou a se aprofundar.

Indubitavelmente, existem muitas forças populacionistas que tentam espalhar o pânico sobre o decrescimento demográfico da China. Contudo, a despeito das preocupações pronatalistas, o governo chinês está mais interessado em avançar na implementação da 4ª Revolução Industrial e nas tecnologias poupadoras de mão-de-obra. Com a automação e a robotização da economia a China pretende manter a produção em alta, mesmo com menor oferta de força de trabalho. O plano “Made in China 2025” visa promover um avanço da estrutura produtiva e a produção de bens de maior valor agregado e menos dependente de uma oferta ilimitada de mão-de-obra. As tecnologias do século XXI serão intensivas em capital, ciência e tecnologia e serão poupadoras de trabalho vivo. População menor mas com maior produtividade.

Desta forma, o fim da “Política de filho único” não significa que a China terá um aumento significativo da taxa de fecundidade e nem evitará um declínio da população ao longo do atual século. Pelo contrário, a liberdade de escolha e o respeito aos direitos sexuais e reprodutivos podem conviver com o encolhimento populacional e o aumento da renda per capita. O surto de coronavírus de 2020 não teve um impacto muito grande na dinâmica demográfica chinesa, embora tenha confirmado a continuidade da queda da fecundidade.

O lado positivo é que a queda da fecundidade chinesa e o consequente decrescimento populacional pode contribuir para aumentar a renda per capita do país (melhorando as condições sociais de vida) e, principalmente, pode contribuir para minorar os impactos ambientais, pois a China é o país mais poluidor do mundo. Recentemente o governo chinês se comprometeu em garantir uma economia com neutralidade de carbono até 2060. Sem dúvida, a redução populacional vai ajudar no alcance desta meta tão importante para o meio ambiente.

Referências:

ALVES, JED. Decrescimento demoeconômico ou pronatalismo antropocêntrico e ecocida? Ecodebate, 20/05/2015. Disponível aqui.

WILLIAM J R, et. al. World Scientists’ Warning of a Climate Emergency, BioScience, 05/11/19. Disponível aqui

Zhang Hui. China’s population grows to 1.412 billion in 2020, but likely to decline as early as 2022, Global Times, 11/05/2021. Disponível aqui.

 

Leia mais

Comunicar erro

close

FECHAR

Comunicar erro.

Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

Cai a fecundidade na China durante a pandemia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU