Faculdades e universidades católicas lutam para evitar desastre fiscal em meio à pandemia

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11 Mai 2020

Nos Estados Unidos, onde as faculdades e universidades fecharam até o fim deste ano acadêmico e ordenaram que os estudantes voltassem para casa por causa da pandemia da Covid-19, as instituições de ensino católicas enfrentam desafios financeiros e pedagógicos únicos.

A reportagem é de Ryan Di Corpo, publicada por America, 07-05-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Mudanças radicais na vida dos EUA ocorreram em uma velocidade vertiginosa, enquanto os Estados montam respostas individuais ao coronavírus. Existem muitas perguntas sobre quando as restrições às reuniões públicas poderão ser levantadas e por quanto tempo o distanciamento social deverá ser praticado, obscurecendo o futuro da vida acadêmica para os estudantes universitários.

Olhando para o próximo ano acadêmico, as faculdades ainda não sabem ao certo quando poderão reabrir e como poderão gerar receita à medida que uma recessão econômica se aproxima.

O Pe. Dennis H. Holtschneider, presidente da Associação das Faculdades e Universidades Católicas dos EUA, alerta que muitas faculdades católicas dos EUA enfrentarão dificuldades financeiras no próximo ano, e que algumas dessas instituições poderão fechar permanentemente.

“Este é um momento terrível para muitas das nossas organizações. Existem universidades que têm grandes recursos, mas a maioria das universidades católicas sempre formaram os pobres e administram margens muito pequenas”, disse ele à America. Essas mesmas instituições também são um paraíso educacional para muitos estudantes da DACA [Deferred Action on Childhood Arrivals, programa que protege jovens sem documentos da deportação].

Cerca de 1.300 educadores católicos – incluindo o Pe. Timothy P. Kesicki, SJ, presidente da Conferência Jesuíta do Canadá e Estados Unidos – pediram ao presidente Trump em agosto de 2017 que mantivesse o compromisso da nação com os estudantes da DACA, os chamados “Dreamers”, que entraram nos EUA sem documentos quando crianças.

O Pe. Holtschneider explicou que, para reduzir os custos operacionais, muitas faculdades católicas deram licenças a empregados (embora ainda oferecendo os benefícios de saúde), cortaram os salários dos empregados mais antigos, suspenderam alguns projetos de capital, criaram “orçamentos de austeridade” e promulgaram congelamentos de contratações e de salários para o próximo ano.

Mandar os estudantes para casa pelo restante do semestre da primavera – e, em muitos casos, reembolsar os pagamentos de alojamento e pensão – causou “uma perda nas contas que colocou a maioria das escolas no vermelho”, disse ele. Mesmo assim, algumas instituições de ensino católicas mantêm grandes doações das quais podem obter fundos, se necessário.

Previsão de déficit

Em um e-mail enviado a toda a universidade no dia 5 de maio, o Pe. Joseph M. McShane, SJ, reitor da Fordham University, anunciou uma projeção de déficit de receita de quase 100 milhões de dólares para o ano fiscal de 2020. A perda de receita está ligada, em parte, à decisão da universidade de “reembolsar 50% das taxas de alojamento, pensão e seleção dos estudantes nesta primavera”.

O e-mail informa que a Fordham não pode usar fundos de doações para compensar a perda de receita, pois esse financiamento é designado para bolsas de estudos e outros fins programáticos. O Pe. McShane anunciou que a universidade espera uma redução de 1,2% nas matrículas em setembro em comparação com o semestre do outono anterior.

“A Fordham está se preparando ativamente para retomar as atividades no campus neste outono. Tenham certeza de que procederemos de forma a não colocar nenhum membro da nossa comunidade em risco”, escreveu.

Kelvin Buck, estudante da Fordham em Portland, Oregon, discutiu os desafios da aprendizagem a distância e a sua incerteza em relação ao próximo ano acadêmico. “Eu não consigo estabelecer uma conexão com os meus professores e meus colegas ou ter uma discussão sem dificuldades técnicas”, escreveu ele para a America, explicando que a diferença de fuso horário é um fator estressante adicional.

“Eu não consigo imaginar que vou ter que começar aulas online com professores que não conheço, ao contrário dos professores com os quais eu já tive uma dinâmica neste semestre. Muitos outros alunos e eu planejamos concluir as nossas teses no outono, o que se torna muito mais difícil nas casas dos nossos pais, com poucos ou nenhum dos recursos da universidade”, escreveu.

A Fordham não é a única universidade católica diante de decisões financeiras difíceis. Sobrecarregado pelas questões de matrículas e arrecadação de fundos exacerbadas pela pandemia, o Holy Family College, em Manitowoc, Wisconsin, anunciou no dia 4 de maio que estava fechando suas portas definitivamente até o fim de agosto.

Decisões difíceis

A Marquette University, instituição jesuíta de Milwaukee, anunciou no mês passado que promulgaria licenças temporárias que afetariam 250 funcionários após o dia 17 de abril. A universidade também reduziu os gastos discricionários e estabeleceu um congelamento temporário das contratações. “Nossa saúde financeira futura depende da demanda de cursos de verão online, da nossa capacidade de atrair estudantes virtualmente para as turmas do ano que vem e de como a Marquette e outras universidades privadas se beneficiarão de um pacote de estímulo do governo”, afirma um e-mail da administração da universidade.

A Sacred Heart University, em Fairfield, Connecticut, também dispensou alguns empregados a partir do dia 1º de maio. John J. Petillo, reitor da instituição, disse que concordou com um corte salarial de 50% até o fim de julho. O vice-reitor e decano da universidade também teve um corte de 15% no salário. O total de pagamentos de Petillo em 2017, de acordo com dados da The Chronicle of Higher Education, era de mais de 1.004.154,00 dólares (sua base de pagamentos era de 491.082 de dólares).

“Se houver tempos difíceis, aqueles que estão na liderança deverão receber o primeiro golpe”, disse ele.

Deborah J. Noack, diretora executiva de comunicação da Sacred Heart, disse que a universidade foi uma das primeiras a chamar de volta seus alunos que estudavam no exterior em meio às preocupações com o coronavírus. Segundo Petillo, a Sacred Heart foi a primeira universidade em Connecticut a mudar para o ensino a distância. A Sacred Heart planeja retomar as aulas presenciais no semestre do outono.

“Pedimos EPIs. Temos 20.000 ou 30.000 máscaras até agora. Temos leitores eletrônicos de temperatura e estamos buscando outras coisas. Compramos 3.000 galões de desinfetante para as mãos que já chegaram na semana passada”, disse Petillo.

Ele prevê que grandes faculdades católicas com reservas financeiras, como o Boston College e a Universidade de Notre Dame, sobreviverão às consequências econômicas do coronavírus, mas muitas instituições de ensino com “recursos mais escassos” provavelmente enfrentarão o fechamento.

Os pais também estão sofrendo durante a atual crise econômica. “Temos muitos e muitos pais que perderam o emprego e não podem pagar as mensalidades. Então como compensaremos esses dólares?”, perguntou Kathy Mears, presidente interina e CEO da Associação Educacional Católica Nacional dos EUA, que representa principalmente as escolas infantis e fundamentais católicas.

Assim como na Fordham, é provável que outras instituições educacionais católicas verão uma queda nas taxas de matrícula, pois menos famílias poderão pagar as mensalidades no próximo ano. O Pe. Holtschneider advertiu que, se as faculdades tiverem que continuar com o ensino a distância no outono, elas provavelmente perderão uma parcela das suas turmas de entrada. “As faculdades já sabem que vão perder muito das suas matrículas internacionais no próximo ano”, disse ele, chamando essa perda de “um golpe significativo”.

Caminhos possíveis

Então, qual é o caminho a seguir para as faculdades católicas? Como pode ser a recuperação? O Pe. Holtschneider explicou que a maioria das instituições de ensino católicas estão fazendo o seu melhor para sobreviver com seus próprios recursos, esperando por um pacote de estímulo adicional do Congresso e por um aumento da ajuda federal da lei “Cares” recentemente aprovada. Essa lei inclui 339,8 bilhões de dólares para programas governamentais estaduais e locais e 14 bilhões de dólares designados para o Ensino Superior.

Embora o Pe. Holtschneider tenha descrito os benefícios enumerados na lei “Cares” como “promissores”, ele disse que pouquíssimas faculdades católicas eram inicialmente elegíveis para empréstimos da Small Business Administration, devido a uma exigência de que os estudantes fossem contados como empregados. Somente empresas com 500 empregados ou menos se qualificam para os empréstimos, e, como muitos estudantes católicos trabalham no campus para pagar as mensalidades, essas instituições não são consideradas pequenas empresas.

Porém, a partir do dia 6 de maio, a Small Business Administration não contará mais os estudantes que recebem fundos de trabalho e estudo no limite dos 500 empregados. Isso pode abrir uma nova fonte de apoio para algumas faculdades, de acordo com o Pe. Holtschneider.

Apoios e subsídios

Por enquanto, as faculdades católicas estão aguardando uma decisão sobre se as instituições sem fins lucrativos podem solicitar empréstimos através do Main Street Lending Program do Federal Reserve. O Departamento de Educação também disponibilizou subsídios, metade dos quais são designados para estudantes, enquanto a outra metade se destina a apoiar as instituições de ensino. Mas o departamento emitiu diretrizes que proibiam o uso de fundos de emergência para ajudar os estudantes da DACA – um chamado que atraiu críticas dos democratas do Congresso.

“O Departamento de Educação acaba de lançar nesta semana toda uma série de requisitos – que o Congresso não introduziu – que não apenas impedem que os estudantes da DACA e os estudantes internacionais obtenham ajuda, mas, devido à metodologia que eles escolheram, também impede, de fato, que alguns milhões de estudantes nos EUA recebam ajuda”, disse o Pe. Holtschneider.

Mary Pat Donoghue, diretora executiva do Secretariado para a Educação Católica da Conferência dos Bispos dos EUA, disse que as lições aprendidas pelas instituições de ensino católicas durante a Grande Recessão podem ser aplicadas hoje.

“Temos um bom número de instituições de ensino enfrentando uma crise por causa da Covid-19. Algumas das coisas que funcionaram muito bem quando eu entrei em contato com uma instituição em crise incluíam uma forte comunicação entre a instituição e a comunidade, e a capacidade de articular uma visão convincente do porquê precisamos das instituições católicas”, disse.

As faculdades também devem se ajustar e se adaptar à realidade da educação virtual sustentada. “É um divisor de águas”, disse Gerald M. Cattaro, diretor executivo do Centro para a Liderança Educacional Católica e para a Educação Religiosa da Fordham University.

Cattaro chamou o recente pivô do ensino a distância como uma “grande mudança pedagógica” e acredita que as instituições de ensino devem ser flexíveis com seus estudantes, fornecendo-lhes mais tempo para concluir as tarefas e oferecendo uma opção de aprovação/reprovação nos cursos. No entanto, ele está preocupado que a aprendizagem remota não recrie a comunidade e a espontaneidade características da instrução presencial. Ele enfatizou a manutenção de um compromisso com a missão das escolas católicas – a construção da comunidade através do trabalho pastoral e dos vários ministérios do campus.

Por exemplo, a Universidade de Dayton iniciou reuniões diárias de oração ao meio-dia via Zoom, enquanto a Dominican University, em River Forest, Illinois, iniciou o Caritas Now, um recurso pastoral que fornece informações sobre serviços eclesiais virtuais na região de Chicago. Os estudantes da Caldwell University, em Nova Jersey, podem conversar sobre sua vida religiosa durante sessões online às sextas-feiras.

“Eu acho que precisamos ter criatividade, comprometimento, sinceridade e comunidade”, disse Cattaro à America.

Em uma nota mais positiva, Mears está confiante de que as relações formadas entre os estudantes das instituições de ensino católicas sobreviverão a essa pandemia. Chamando a educação católica de “um verdadeiro ministério da Igreja”, ela mantém a esperança no futuro e elogia os educadores católicos pela sua hábil mudança para o ensino a distância.

“A imagem da educação católica será muito diferente. Isso não a torna uma imagem ruim”, disse ela.

Em geral, as instituições de ensino provavelmente perderão muitos estudantes internacionais, pois os pais de estudantes universitários católicos também enfrentam a perda de empregos. As faculdades agora enfrentarão um dilema: como gerar mais receita à medida que a economia declina e os orçamentos estão precisando de dinheiro.

 

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