O paradoxo das baixas taxas de desemprego em 2013 e 2014

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11 Março 2017

"As forças de esquerda do país não entenderam o clamor das jornadas de junho de 2013. A esquerda, em geral, acredita que tem o monopólio da mobilização das massas. Se o povo vai para a rua contra um governo de esquerda, então, é porque essa “massa de manobra” está sendo manipulada pela direita e pelos fascistas. As forças governistas – que se vangloriavam de “ter reduzido a pobreza, acabado com a fome e promovido uma grande inclusão social, de gênero e racial” – não podiam aceitar que o povo (uma parcela significativa da juventude) fosse às ruas exigir mais direitos e mais oportunidades", escreve José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE, em artigo publicado por EcoDebate, 10-03-2017.

Eis o artigo.


A economia brasileira, que havia apresentado um crescimento econômico relativamente elevado entre 2004 e 2010 (com forte redução do desemprego), entrou em uma fase de desaceleração do PIB nos anos de 2013 e 2014, em função do fim do superciclo das commodities e do insucesso da “Nova matriz econômica”, do primeiro governo Dilma Rousseff.

Na fase de expansão do Produto Interno Bruto, a taxa de ocupação (PO/PIA), nas seis maiores regiões metropolitanas do país, passou de 49,5% em dezembro de 2002 para 55,2% em dezembro de 2012 e a taxa de desocupação caiu de 10,5% para 4,6%, no mesmo período. Portanto, a taxa de ocupação subiu cerca de 6% e a taxa de desocupação caiu cerca de 6%. Estes números são coerentes com a teoria econômica, que estabelece uma relação inversa entre o crescimento da economia e do emprego com a redução do desemprego.

Porém, como mostra o gráfico abaixo, houve uma forte desaceleração do PIB entre 2012 e 2014 – com uma recessão econômica moderada nos 3 últimos trimestres de 2014. Em consequência, houve redução da taxa de ocupação, que passou de 55,2% em dezembro de 2012 para 53,3% em dezembro de 2014. Estes números são coerentes, pois o baixo desempenho do PIB significa redução das oportunidades de ocupação.

Todavia, a teoria econômica diz que a desaceleração do PIB e a queda da taxa de ocupação tem uma forte correlação com o aumento do desemprego. Mas não foi o que aconteceu em 2013 e 2014 no Brasil (especificamente nas 6 regiões metropolitanas mais dinâmicas). Mesmo com a falta de dinamismo da produção econômica e a redução da taxa de ocupação, o desemprego não aumentou. Ao contrário, a taxa de desocupação continuou caindo e passou de 4,6% em dezembro de 2012 para 4,3% em dezembro de 2014, segundo a PME do IBGE.


Este fenômeno é conhecido como “Paradoxo do baixo desemprego”. Geralmente ele acontece quando uma parcela da população em idade ativa (PIA) deixa de procurar trabalho em função da baixa geração de emprego e do desalento com a economia. Nesta situação, as taxas de desemprego aberto deixam de refletir a crise do mercado de trabalho.

Durante a campanha eleitoral de 2014, as forças governistas apontavam as baixas taxas de desemprego aberto como prova do sucesso das políticas públicas e, em particular, do sucesso da “Nova matriz econômica”.

Porém, já havia outros indicadores apontando que as coisas não estavam andando bem no país. O fato político mais importante deste período foram as chamadas “jornadas de junho de 2013”, quando a juventude brasileira (especialmente das grandes cidades) foram para as ruas protestar contra o preço do transporte, contra a qualidade da educação, por mais oportunidades de ascensão social, etc. De maneira surpreendente, e quase espontânea, os jovens do país ocuparam os espaços públicos para dizer, como o Barão de Itararé, que “existia alguma coisa no ar, além dos aviões de carreira”.

As forças de esquerda do país não entenderam o clamor daquelas jornadas. A esquerda, em geral, acredita que tem o monopólio da mobilização das massas. Se o povo vai para a rua contra um governo de esquerda, então, é porque essa “massa de manobra” está sendo manipulada pela direita e pelos fascistas. As forças governistas – que se vangloriavam de “ter reduzido a pobreza, acabado com a fome e promovido uma grande inclusão social, de gênero e racial” – não podiam aceitar que o povo (uma parcela significativa da juventude) fosse às ruas exigir mais direitos e mais oportunidades.

Em artigo para o site Outras Palavras (07/02/2017), Tony Negri, faz uma análise crítica da posição do PT e do governo Dilma sobre as mobilizações de junho de 2013: “Primeira pergunta: por que o PT reprimiu as lutas modelo Occupy de 2013-2014 a ponto de desvirtuar o seu significado e permitir que a direita tivesse hegemonia sobre elas? A resposta que recebi dos expoentes do PT foi unívoca e terrivelmente decepcionante. Por parte de todos – este é um ponto realmente grave, por parte de todos sem nenhuma hesitação, sem qualquer arrependimento (ainda que muitas vezes com o embaraço da mentira) – obtive uma só resposta: esses movimentos ameaçavam desde o início a manutenção da nossa governabilidade.

Não vou nem considerar comentários sem sentido, como quando alguém disse que as lutas de 2013 haviam sido inspiradas pela CIA, e isso não somente no Brasil, mas também no mesmo ciclo de Istambul e do Cairo… É claro que, a partir dessa declaração, evidentemente insensata, dá para concluir que o PT já tinha uma relação ruim com as populações metropolitanas, que, envolvidas na crise econômica do país e tocadas pela inflexão neoliberal das políticas de Dilma, pediam desde 2013 ao governo e ao município uma mudança de linha”.

De fato, o paradoxo do baixo desemprego terminou em 2015, quando a recessão se aprofundou e tanto o desemprego aberto como o desalento dispararam. Toda a expectativa gerada sobre o “Brasil 4ª Potencial Mundial” começou a se desfazer com o fim do superciclo das commodities, o que provocou desaceleração econômica, baixo crescimento do emprego e frustração da esperança de um futuro melhor. O governo Dilma e o PT começaram a perder legitimidade exatamente nas jornadas de junho de 2013 e entraram em crise derradeira com o alto desemprego de 2015 e 2016.

Segundo a PNAD Continua do IBGE, o desemprego aberto ultrapassou a taxa de 12% no final de 2016 e início de 2017 (12 milhões de pessoas procurando trabalho) e a “Taxa Composta da Subutilização da Força de Trabalho” ultrapassou a impressionante cifra de 22%, significando quase 25 milhões de pessoas desempregadas, desalentadas ou subutilizadas.

Estas questões foram tema central do artigo “Transformações e tendências do mercado de trabalho no Brasil entre 2001 e 2015: paradoxo do baixo desemprego?” de SIMÕES, ALVES e Silva (2016), publicado na Revista Brasileira de Estudos de População (REBEP). O artigo diz:

“Os jovens têm sido proporcionalmente mais prejudicados no contexto da atual crise, e a desocupação tem hoje um perfil etário ainda mais desfavorável aos mais jovens do que no passado. Isso levanta preocupações do ponto de vista social e econômico, pois estes jovens excluídos do mercado de trabalho adquirem menos habilidades que podem impulsionar sua produtividade no futuro. Justificam-se, dessa maneira, os temores de que esta possa ser uma “geração perdida”, mais educada do que qualquer outra na história do país, mas que corre sérios riscos de não alcançar o máximo de suas possibilidades, tanto em termos de contribuição para o crescimento econômico quanto de realizações pessoais e projetos de vida” (p.561).

Para entender o paradoxo do baixo desemprego e a crise recente no mercado de trabalho vale a pena ler o artigo (Simões, Alves, Silva, 2016), disponível no link abaixo:

Referência:

SIMÕES, PHC. ALVES, JED. SILVA, PLN. Transformações e tendências do mercado de trabalho no Brasil entre 2001 e 2015: paradoxo do baixo desemprego? R. bras. Est. Pop., Rio de Janeiro, v.33, n.3, p.541-566, set./dez. 2016

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