Para derrotar os populistas, é preciso mais Estado social. Artigo de Joseph Stiglitz

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15 Mai 2017

“A questão deveria ser simples: na ausência de políticas progressistas, investimentos no estado social, reconversões e outras formas de assistência para os trabalhadores penalizados pela globalização, os políticos como Trump correm o risco de se tornar um elemento estável do nosso panorama político. Os líderes desse tipo alimentam o medo, reforçam a intolerância e obtêm sucesso graças a perigosos métodos de governo baseados na oposição entre ‘nós’ e ‘eles’.”



A opinião é do economista estadunidense Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de Economia de 2001 e professor da Columbia University. O artigo foi publicado no sítio Internazionale, 12-05-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Depois da vitória de Emmanuel Macron nas eleições presidenciais francesas, o mundo deu um suspiro de alívio. A Europa não vai seguir o caminho do protecionismo imposto por Donald Trump aos Estados Unidos, mas os defensores da globalização têm pouco a festejar.

Os protecionistas e os defensores da democracia iliberal estão aumentando em muitos outros países. O fato de que um mentiroso intolerante como Trump recebeu tantos votos nos Estados Unidos e que, no dia 7 de maio, a candidata de extrema-direita francesa Marine Le Pen chegou ao segundo turno com o centrista Macron deve preocupar.

A incompetência de Trump deveria apagar os entusiasmos dos populistas no mundo. Os eleitores de Trump que vivem no rust belt (o ex-cinturão industrial dos Estados Unidos duramente atingido pela crise) quase certamente vão se sair pior em quatro anos, e talvez os mais racionais dentre eles vão aprender a lição. Mas seria um erro pensar que no futuro próximo as pessoas decepcionadas com a economia global, sobretudo aquelas que fazem parte da classe média, vão diminuir.

Se as democracias liberais continuarem a manter intacto o status quo, os desempregados não deixarão de se sentir excluídos e serão presas fáceis para as falsas promessas de políticos como Trump e Le Pen. Os defensores do livre mercado devem entender que muitas das reformas e das inovações promovidas por eles correm o risco de piorar as condições de vida de alguns grupos, até mesmo numerosos, de pessoas. Teoricamente, essas mudanças melhoram a eficiência econômica: embora, por um lado, aumentam os perdedores, por outro, multiplicam os vencedores. Mas por que os perdedores deveriam apoiar a globalização e as políticas do livre mercado, se ninguém os ajuda quando estão em dificuldades? Na realidade, é do seu interesse defender políticos que se opõem às inovações.

A questão deveria ser simples: na ausência de políticas progressistas, investimentos no estado social, reconversões e outras formas de assistência para os trabalhadores penalizados pela globalização, os políticos como Trump correm o risco de se tornar um elemento estável do nosso panorama político. Os líderes desse tipo alimentam o medo, reforçam a intolerância e obtêm sucesso graças a perigosos métodos de governo baseados na oposição entre “nós” e “eles”. Donald Trump atacou a golpes de tuíte, dentre outros, o México, a China, a Alemanha e o Canadá. E quanto mais avançar a sua presidência, mais essa lista está destinada a aumentar.

Na França, Marine Le Pen não se lançou só contra os muçulmanos. As suas declarações recentes, nas quais negou as responsabilidades dos franceses nas blitzes dos judeus em Paris durante a Segunda Guerra Mundial, também fizeram emergir o seu antissemitismo latente. Tudo isso corre o risco de criar profundas divisões dentro de um país. Nos Estados Unidos, Trump já arruinou a reputação da presidência e, nos próximos anos, deixará para trás um país ainda mais dividido.

Mesmo quando nasceu o Iluminismo, com o seu impulso ao progresso científico e à liberdade, as rendas e os padrões de vida estagnavam há séculos. Mas Donald Trump, Marine Le Pen e outros populistas são o contrário do Iluminismo.

O presidente estadunidense apela aos “fatos alternativos”, nega o valor do método científico e propõe cortes aos fundos para a pesquisa, incluindo aquelas sobre as alterações climáticas, que ele considera como uma farsa. O protecionismo promovido por esses políticos é uma ameaça para a economia mundial.

Durante três quartos de século, houve uma tentativa de criar uma ordem econômica global fundamentada em algumas regras e em que bens, serviços, pessoas e ideias pudessem se mover livremente. Acompanhado pelos aplausos dos seus colegas populista, Trump lançou uma granada contra esse mundo. Ele e os seus partidários ressaltam com insistência a importância das fronteiras. Em tal contexto, nos próximos anos, as empresas não se sentirão com vontade de criar novas cadeias de produção globais. A incerteza geral penalizará os investimentos, particularmente os transnacionais.

Isso criará problemas para todo o planeta. Goste-se ou não, a humanidade continuará estando conectada em escala global e tendo que enfrentar problemas comuns, como as mudanças climáticas e o terrorismo. A capacidade de trabalhar todos juntos para resolver esses problemas deve ser reforçada, não enfraquecida.

Os países escandinavos já entenderam isso há muito tempo. Eles se deram conta de que a abertura das fronteiras era a chave para um rápido crescimento econômico. Para não arruinar a democracia deles, porém, eles tiveram que convencer os cidadãos de que partes importantes da sociedade não seriam deixados para trás. O estado social se tornou um elemento fundamental no sucesso dos países escandinavos.

Lá, eles entenderam que a única prosperidade sustentável é a compartilhada. Agora, cabe aos Estados Unidos e à Europa aprenderem a lição.

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