3º domingo da quaresma – Ano B – O Amor que conduz à Vida

Por: MpvM | 01 Março 2024

"Aqui, o Evangelho nos coloca frente a frente com uma nova proposta de Deus ao ser humano. O episódio com os cambistas e seus 'negócios', no templo, ensejará uma ruptura definitiva de práticas de exploração do povo, momento em que o evangelista João nos mostra Jesus, de chicote em punho, selando para sempre novos olhares e atitudes na relação Deus/ser humano e ser humano/ser humano. Jesus expulsa do templo bois, ovelhas, pombas, animais usados em sacrifícios que o povo oferecia a Deus. Expulsando-os do templo, Jesus declara inválidos todos esses sacrifícios, bem como o culto que se sustenta graças à exploração."

A reflexão é de Marta Maria Godoy, OSB, monja beneditina, eremita urbana. Ela possui formação inicial em Letras e Sociologia (graduada e pós-graduada), mestrado em Teologia pela EST (S. Leopoldo, RS). Atua na Pastoral Carcerária do RS.

Leituras do dia

1ª leitura - Ex 20,1-17
Salmo - Sl 18(19),8.9.10.11 (R. Jo 6,68c)
2ª leitura - 1Cor 1,22-25
Evangelho - Jo 2,13-25

Estamos na Quaresma. Este já é o terceiro domingo. Nosso olhar e nosso coração seguem em frente e o que vemos pode ser a tentativa de construir uma trilha em direção à opção incondicional à Vida. E, quando falamos em Vida, não somente enquanto cristãs e cristãos, mas antes como seres humanos, estamos falando a respeito de nos empenharmos no socorro aos mais pobres, preferencialmente de forma menos assistencialista e mais, como diz Frei Betto, “estruturante”. Quando dizemos “estruturante”, estamos falando de quem, por exemplo, cede uma área de sua propriedade para uma família sem-terra; consegue um trabalho para um desempregado (que pode ser uma egressa ou egresso do sistema prisional que não encontra quem creia na sua proposta de mudança de vida); quem apoia uma política governamental que beneficia as excluídas e excluídos... Vida e gestos práticos andam juntos.

As leituras desse terceiro domingo nos conduzem à reflexão de que a religião, para ser verdadeira, deve nos conduzir para a Vida e para a Liberdade de cada pessoa, primeiro individualmente, depois estendendo-se para a comunidade. Deve esta religião estar repleta de solidariedade, sustentada por leis justas, que promovam e preservem a vida, abandonando de uma vez por todas a exploração das pessoas, mesmo que os exploradores estejam invocando, em sua defesa, muitas vezes, o próprio Deus.

1ª Leitura: (Ex 20, 1-17) 

O Decálogo privilegia a Vida. Os 10 mandamentos se inserem na existência humana como fio condutor de uma Teologia da Esperança, numa perspectiva vivencial de missão mesmo, já que podem ser lidos como opção de vida e não meramente como prescrições regulares. O versículo 13, “Não matarás”, nucleia essa Vida como o eixo da constituição do Povo de Deus, que anda em direção a um futuro, sim, na perspectiva escatológica, mas que supõe um “aqui e agora”. Desde a lembrança de “quem é Deus” (vv. 3-6), regente supremo da Vida, mas que conta com o ser humano para a continuação da obra da criação através do respeito e reconhecimento construídos não somente em relação a Ele mesmo, mas muito de uns para com os outros e outras... O Decálogo pode ser visto, então, não como “uma lei a ser obedecida”, mas como suave lembrança de que Deus, conhecedor de nossa natureza humana, continua a nos confortar com o aconchego de seu abraço de Mãe/Pai, conduzindo e orientando...

2a. Leitura: (ICor 1,22-25)

A segunda leitura nos convida a refletir sobre sabedoria, fraqueza, fortaleza, Cruz. Dizem os exegetas que a comunidade de Corinto, na Grécia, era composta em sua maioria por pessoas pobres e escravas (“não há entre vós muitos sábios, segundo a carne” - 1,26), levando uma vida de trabalhadores simples, estivadores no porto, “crucificados da sociedade”. O apóstolo Paulo chega, então, desejando anunciar um Crucificado e esses “crucificados”. Paulo vem falar aos pobres, crucificados, a respeito de um crucificado. Ou seja, fala de um Deus escandaloso, subversivo (foi crucificado pelo poder religioso e político por ser um perigo para seus status). Como isso será possível, já que os judeus exigem uma religião de sinais prodigiosos para que seja crível e os gregos uma religião “de laboratório”, em que tudo se deve explicar unicamente pela razão?

Evangelho: (Jo 2,13-25)

Aqui, o Evangelho nos coloca frente a frente com uma nova proposta de Deus ao ser humano. O episódio com os cambistas e seus “negócios”, no templo, ensejará uma ruptura definitiva de práticas de exploração do povo, momento em que o evangelista João nos mostra Jesus, de chicote em punho, selando para sempre novos olhares e atitudes na relação Deus/ser humano e ser humano/ser humano. Jesus expulsa do templo bois, ovelhas, pombas, animais usados em sacrifícios que o povo oferecia a Deus. Expulsando-os do templo, Jesus declara inválidos todos esses sacrifícios, bem como o culto que se sustenta graças à exploração.

O gesto de expulsar os comerciantes e seus produtos do templo suscita duas reações: a primeira vem dos discípulos já que, para eles, Jesus seria um reformador da instituição religiosa, postura que só será revista após a morte e ressurreição de Jesus, ocasião em que eles entenderão que Jesus não foi/não é um reformador do Templo, mas o substitui. A segunda reação vem dos dirigentes que se sentem lesados pelo gesto de Jesus de acabar com o comércio no templo: eles o querem intimidar e o interrogam (v. 18) - “Que sinal nos mostras para agir assim?”, ao que Jesus responde dizendo que sua morte e ressurreição serão o grande sinal (“Derrubem esse templo e, em três dias, eu o levantarei” - v. 19). Parece que, a essa altura, o evangelho de João já aponta para os responsáveis pela morte de Jesus...

Convite à reflexão

É nosso desejo para todas e todos uma Páscoa do Senhor recheada de esperança, busca da harmonia da Ressurreição e construção de pontes de Paz.

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