Fukushima, além da energia nuclear

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Por: André | 10 Junho 2014

“As lições do desastre, portanto, não se resumem ao debate ‘a favor’ ou ‘contra’ a energia nuclear. Devemos cavar mais fundo e nos questionar sobre a nossa concepção de civilização. É hora de admitir que a nossa relação com a natureza não pode mais estar baseada exclusivamente na lógica da exploração excessiva.” A reflexão é de Jean-Pierre Denis, no editorial publicado na revista francesa La Vie, 13-03-2014. A tradução é de André Langer.

Eis o texto.

Três anos após o desastre de Fukushima, nada foi resolvido. O local da central nuclear continua sendo uma enorme infecção que algumas pás de terra e uma capa de negação podem recobrir, mas não curar. Em relação à transparência... mesmo alguém tão favorável à energia nuclear como o empresário francês da Areva admite que fracassou. Uma coisa é certa: estaremos mortos há muito tempo e Fukushima ainda continuará a queimar como um sol negro entre a terra e o mar.

O que fazer? A energia nuclear continua sendo uma energia relativamente barata, que mata ou envenena provavelmente menos pessoas do que o carvão e que polui menos do que a exploração do gás de xisto e cujo impacto sobre o aquecimento global é pequeno. Na França, Japão e China – onde as usinas nucleares foram fartamente construídas – os interesses dos consumidores estão claramente do lado do átomo, fornecedor de energia a um preço baixo e, portanto, que garante um certo nível de vida e de conforto. Ninguém ignora os argumentos contrários. Se Chernobyl pode ser debitada na conta da vetustez e da negligência soviética, Fukushima simboliza o fracasso de uma sociedade rica, livre e tecnologicamente avançada. Não apenas o risco zero não existe, mas as catástrofes atômicas, embora muito raras, têm consequências irreversíveis em grande escala.

Devemos considerar seriamente o dilema de um país como o Japão, envelhecido, econômica e estrategicamente em declínio, quase privado de recursos energéticos próprios, mas que chegou a um estágio de desenvolvimento que requer grandes quantidades de energia. Este dilema atravessa a opinião pública: majoritariamente contrária à energia nuclear, ela optou por um governo que quer reativar a maioria das centrais, paradas há três anos. Difícil de ensinar. Pois devemos olhar com modéstia e realismo a nossa própria situação. Nas sociedades em que a eletricidade ocupa um lugar tão central, não é possível abandonar a energia nuclear de uma hora para a outra, nem sem custos.

Mas devemos parar por aí e fingir que nada deve ser mudado? Na França, é lamentável que a anunciada "transição energética" não tenha muito mais consistência que a Grenelle do Meio Ambiente da época do Sarkozy: aos males, mais uma vez, opõem-se apenas palavras. Quanto ao Japão... que um país democrático possa perder definitivamente uma parte do seu território em vez de dizer "isso nunca mais", é impressionante. Ao ultraje da natureza se sobrepõe a violência contra o homem – idosos relegados às seus pré-fabricados "provisórios", famílias deslocadas, corpos contaminados. Tantos “sacrifícios” definitivamente perdidos.

As lições do desastre, portanto, não se resumem ao debate “a favor” ou “contra” a energia nuclear. Devemos cavar mais fundo e nos questionar sobre a nossa concepção de civilização. É hora de admitir que a nossa relação com a natureza não pode mais estar baseada exclusivamente na lógica da exploração excessiva. Ainda há tempo para dizer que não queremos nos deixar governar nem pelo poder das nossas ferramentas, nem pela impotência dos que pretendem ter o controle em nosso nome – no campo nuclear, assim como em muitos outros. Vasto assunto, sem dúvida, do qual só sairemos mediante um formidável esforço de lucidez, de vontade e de humanidade. Nas ciências experimentais, o homem aprende com seus erros. E na sabedoria? Nós gostaríamos que também fosse assim.

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