''Caros adultos, quando vocês vão crescer?'' Entrevista com Armando Matteo

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24 Fevereiro 2014

E difícil dizer o que veio primeiro, o ovo ou a galinha, mas é certo que "a geração baby boomer é a geração da ruptura, que, por amor à juventude, inventou um novo sentido para o ser adulto. Assim, quem nasceu aproximadamente entre 1946 e 1964 fez da juventude o sentido da vida, acorrentando-se ao mito do juvenilismo". O resultado é que essas eternas crianças não são capazes de educar, isto é, de fazer com que as crianças se tornem adultas.

A reportagem é de Roberto I. Zanini, publicada no jornal Avvenire, dos bispos italianos, 17-02-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Essa é a análise impiedosa que o padre Armando Matteo, professor de Teologia Fundamental da Urbaniana, na Itália, coloca na base do seu mais recente livro, L'adulto che ci manca [O adulto que nos falta] (Ed. Cittadella, 114 páginas). Um panfleto eficaz sobre a incrível situação na qual, na sociedade contemporânea, os jovens se sentem órfãos dos adultos, e os adultos se dedicaram a levar uma vida para a qual a maior ambição é a de parecer jovens o máximo de tempo possível.

"Assim, se alguém morre aos 70 anos, se diz: 'Morreu jovem'! E a alguém que tenha 30 anos à procura de trabalho ou a alguém que tenha 50 anos que gostaria, finalmente, de avançar na carreira se responde que tenha paciência, porque, no fundo, são ainda jovens".

Paradoxos que investem também sobre o modo em que se vive e se transmite o Evangelho, como bem evidencia o subtítulo do livro de Matteo: "Por que se tornou tão difícil educar e transmitir a fé".

Eis a entrevista.

Mas por que o intervalo de tempo 1946-1964?

A indicação se deve a Zygmunt Bauman, em Vite che non possiamo permetterci (2011). Nos fatos, trata-se da geração que, em poucos anos, passou de não ter nada a ter tudo, por meio de mudanças tecnológicas e culturais que, além de prolongar a expectativa de vida, produziram um sentido de confiança no fazer e de euforia no viver a própria juventude, que acabou se encarnando no mito do juvenilismo a todo custo. É a geração do 1968 e do 1977. A geração que desenganchou o conceito de liberdade de todo vínculo, mesmo daqueles que nascem da própria humanidade, como a fragilidade, a doença, a dor, a morte – a geração dos eternos jovens, daqueles que não querem envelhecer, porque colocaram nas capacidades de desempenho da juventude todas as suas expectativas. Não é por acaso que, justamente nos últimos anos, expandiram-se e consolidam-se (para além de toda lógica) mitos literários como os do Peter Pan e do Pequeno Príncipe...

Tudo isso traduziu-se na perda da capacidade de educar?

Para essas pessoas, o modelo de vida bem-sucedida é o juvenil. Não compreenderam que a juventude é uma estação da vida que deve levar a ser adulto. Como podem ensinar aos jovens que há algo além da juventude para a qual vale a pena se comprometer para construir, se para eles não há nada melhor do que ser jovens?

E o mal-estar juvenil cresce e não é compreendido...

 A ideia de fundo é que, se você é jovem, não lhe falta nada. A juventude é a grande máquina da felicidade. Então, como é possível ser jovem e infeliz? Postas diante de qualquer episódio de desconforto juvenil, essas pessoas se preocupam por um instante, mas depois voltam a se envolver no cobertor do juvenilismo.

Aí nascem as problemáticas juvenis denunciadas no seu livro anterior, La prima generazione incredula [A primeira geração incrédula]?

Os jovens se sentem supérfluos, sentem que vivem em uma sociedade que não precisa deles. E isso vai contra a verdade da juventude, que é força, que é novidade, que é como uma célula-tronco que traz consigo a necessidade de devir. Se esse processo não é posto em movimento, essa força e essa novidade recaem sobre si mesmas. Como se pode confiar em uma sociedade que tem as melhores energias no freezer? E não se trata de um problema político, mas sim de um problema cultural... A raiz latina da palavra jovem diz isso, que vem de juvare, ser de ajuda, contribuir. Enquanto os gregos usavam a palavra neos, isto é, novo.

Esse raciocínio também vale para a incapacidade de transmitir a fé?

Os jovens nascidos depois de 1981 (as pesquisas mais recentes dizem isso) custam a entender para que serve a fé quando nos tornamos grandes, justamente porque, nos adultos, a fé não é vivida como momento essencial, como fonte de plenitude e de felicidade. Como posso me interrogar sobre as coisas últimas se é preciso viver fingindo que as experiências fundamentais do ser humano (isto é, o sofrimento, a fragilidade, a morte) não existem? O ser humano é fundado sobre a consciência da "falta", e a felicidade vem da aceitação serena dessa situação, que nos abre para os outros e nos abre a Deus.

Em suma, sem pais, sem fé?

Nos documentos da Igreja, defende-se há mais de uma década que é preciso começar pelos adultos. É preciso re-evangelizar a "adultez", para que ela mostre o seu melhor perfil, a sua capacidade de educar para construir aquele futuro que os adultos atuais parecem querer manter totalmente para si mesmos.

Que os adultos recomecem a fazer coisas de adultos, portanto?

No fundo, esse é o pedido urgente que vem do mundo juvenil. A confusão dos adolescentes (e não só) nasce da ausência de "adultitude", que é a mãe de todas as crises contemporâneas: hedonismo, fim em si mesmo, desnatalidade, identidade masculino-feminino, identidade pai-mãe... E isso surge claramente também em uma parte da literatura recente, como, por exemplo, em Acciaio, de Silvia Avallone, em 30 acrilico 70 lana, de Viola Di Grado, em Io e te, de Niccolò Ammaniti, ou nos livros de D'Avenia. Se não respeitarmos o "vínculo de honra" que liga as gerações, entregamo-nos ao mercado, a um futuro inconsistente de Peters Pan ou de Pequenos Príncipes.

 

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