A complexa sociabilidade dos jovens pentecostais nas periferias brasileiras. Entrevista especial com Sérgio de Camargo

"A ética pentecostal vem sendo absorvida por igrejas não pentecostais ou igrejas históricas que sempre tiveram um caráter mais moderado", afirma o sociólogo

Foto: Reprodução | Youtube

Por: Patricia Fachin | 10 Mai 2022

 

Nas periferias da região metropolitana de São Paulo, as igrejas pentecostais são maioria se comparadas a outras denominações religiosas, especialmente àquelas do protestantismo histórico. Na favela do DER, uma das mais antigas do ABC paulista, localizada no quilômetro 20 da Rodovia Anchieta, entre uma área nobre de São Bernardo do Campo e o Centro da cidade, constituída há 70 anos, quando nordestinos migraram para São Paulo e atuaram na construção dos primeiros projetos de desenvolvimento, existem comunidades religiosas do pentecostalismo clássico, que se disseminou entre os anos 1910 e 1950. No Brasil, especialmente nas zonas periféricas que surgiram no entorno das grandes obras, como construções de rodovias, "o pentecostalismo funcionou como uma amálgama e isso se deve, principalmente, à ausência estatal na constituição dessas regiões e ao seu crescimento desregulado", disse o sociólogo Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo ao Instituto Humanitas Unisinos - IHU.

 

Autor da dissertação de mestrado intitulada "Pentecostalismo e juventude na periferia urbana: estudo sobre a sociabilidade de jovens da Igreja Assembleia de Deus Mistério São Bernardo do Campo no bairro DER", ele afirma que suas pesquisas corroboram os dados apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE: "entre os pentecostais predominam as mulheres e pessoas negras".

 

Na entrevista a seguir, concedida via Zoom, Camargo relata as principais formas de sociabilidade entre os jovens. Segundo ele, "a vivência religiosa entre os pentecostais gera um senso de comunidade que dificilmente é possível encontrar, inclusive em grupos de amigos. Isso cria um senso de comunidade e de ações fraternas que contribuem, inclusive, para a formação do caráter".

 

Na comunidade do DER, exemplifica, "jovens que não tinham nenhuma estrutura familiar aprenderam inúmeras habilidades com a religião". Mas a situação é "complexa", enfatiza, "porque são pessoas que, de um lado, vivem em situação de vulnerabilidade e, quando buscam uma sociabilidade, de outro lado, acabam sendo reguladas o tempo todo" e perpetuam a "lógica de achar um inimigo em comum".

 

Os pentecostais, acrescenta, "falavam muito menos do evangelho ou de coisas que são boas por conta do cristianismo e muito mais em combater o pecado e a sociedade que deturpa os valores de Deus. Eles têm uma regulação muito moral e em alguns momentos não há espaço para discussão teológica".

 


Sérgio de Camargo (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo é graduado em Ciências Sociais pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás - UFG e mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo – UMESP.

 

Confira a entrevista.

 

IHU - Que relações existem entre o pentecostalismo no Brasil e a formação das periferias urbanas brasileiras na segunda metade do século XX?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – O pentecostalismo funcionou como uma amálgama nas periferias brasileiras e isso se deve, principalmente, à ausência estatal na constituição dessas regiões e ao seu crescimento desregulado. Isso aconteceu de modo compulsório. Uma premissa dos estudos sobre periferia é que o Estado abandonou determinadas regiões em detrimento de outras por conta da industrialização tardia. A literatura reporta a situação de migrantes que vieram do Nordeste para o Sudeste em caravanas. Essas pessoas chegavam no Sudeste com baixa instrução, sem qualidade de vida, em busca de realizar algum sonho, mas não conseguiam se adaptar em São Paulo por causa das áreas de metrópole que já existiam na região – na década de 1950, São Paulo já tinha 3.2 milhões de habitantes, segundo o censo da prefeitura. O fato de as pessoas terem saído de povoados e cidades menores gerou um rompimento de laços sociais.

 

 

Pentecostalismo como prática religiosa nas periferias

 

Na primeira metade do século XX, predominava no Nordeste o catolicismo popular; havia pouca influência do protestantismo ou até mesmo do pentecostalismo. Quando os migrantes chegam em São Paulo, especialmente na Zona Leste da capital, eles começam a se juntar e a se ajudar mutuamente. O aspecto religioso sempre esteve por trás dessas relações: eles passaram a juntar as práticas religiosas do catolicismo popular, que têm muitos cantos, práticas corporais e transespirituais, com a nova prática espiritual da metrópole. Assim, o pentecostalismo começou a ser pulverizado rapidamente nas periferias paulistanas porque as pessoas veem a religião como uma solução para a falta de vínculos sociais.

 

Outras famílias migraram sem ter uma prática religiosa totalmente pronta e, quando chegaram em São Paulo, se depararam com um pentecostalismo que as abraçou e as ajudou, com uma rede de solidariedade muito forte, em que as pessoas conseguiam conversar, inclusive no seu próprio dialeto. Isso facilitou o desbravamento das novas condições sociais em um momento em que as pessoas chegavam e iam morar em barracos de madeira, se ajudando mutuamente. Nesse contexto, elas foram encontrando a religião e a religião foi encontrando elas, mutuamente, como uma troca, e elas acabaram criando as redes que foram importantes para o desenvolvimento do pentecostalismo nas periferias.

 

Participação estatal

 

O grande pulo do gato é que o Estado deixou as igrejas e as forças religiosas e comunitárias tomarem conta dessas regiões, provendo soluções para a resolução dos problemas. Nos anos 1970, o Estado teve uma ingerência muito grande na construção das linhas de metrô para a Zona Leste de São Paulo. O déficit habitacional e de saneamento era tão grande, que foi preciso investir em infraestrutura. Mas quando o Estado chegou na região, a população estava completamente consolidada e já existiam os comércios. A literatura da sociologia de São Paulo relata muito sobre a realidade da época: as pessoas se deslocavam da Zona Leste para o Centro, e tinha muitos agrupamentos de baianos, paraibanos, nordestinos em geral, e eles se ajudavam muito. Também eram registrados casos de violência, em que o Estado não queria interferir. Nesse sentido, o pentecostalismo conseguiu se beneficiar da falta de acesso a serviços e direitos que deveriam ser promovidos pelo Estado e com o fato de as pessoas estarem se deslocando geograficamente, socialmente e emocionalmente.

 

IHU – Há uma compreensão geral de que o pentecostalismo também cresceu em decorrência do fato de a Igreja católica ter abandonado, em alguma medida, sua atividade pastoral e social junto às comunidades periféricas. Mas, pelo que você aponta na sua pesquisa, não necessariamente os migrantes tinham uma filiação religiosa ao catolicismo. A partir disso, como explica o fenômeno do pentecostalismo no Brasil?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – No final do século XIX e início do século XX, a Igreja católica fez opções políticas por causa da entrada dos evangélicos no país, embora já existissem evangélicos no Brasil. A fundação dos colégios evangélicos no país no final do século XIX demonstra uma abertura no sentido de que as pessoas estavam participando de outras denominações religiosas, que não a católica. Os católicos, em oposição a isso, tentam participar mais ativamente de questões ligadas às elites e às oligarquias. Nesse sentido, o catolicismo interiorano e popular, descrito na literatura, fica à míngua porque não tinha vigário para enviar para todas as comunidades. Os padres estavam tomando conta das paróquias grandes, o ordenamento feminino não era permitido – e ainda não é –, e as pessoas começaram a se ver desamparadas e começaram a buscar outros serviços religiosos.

 

Quando os migrantes nordestinos chegam no Sudeste, encontram algo que foi bom para eles: uma religião que os abraçou, que estava cuidando deles do ponto de vista social, promovendo trabalho e auxiliando com a alimentação e, consequentemente, oferecendo um serviço espiritual. O pentecostalismo baseado em milagres, falar em línguas, transespiritual, fez com que as pessoas se vissem em uma condição muito parecida com aquela que vivenciaram no catolicismo popular, mas com uma ética e valores morais um pouco diferentes e mais negociáveis em relação ao catolicismo.

 

 

Esperança X benefícios

 

Aí tem uma questão de classe: houve essa migração do catolicismo para o pentecostalismo, mas também foi uma opção do sujeito religioso, que estava em constante mudança. No pentecostalismo, as pessoas não têm medo de mudar de doutrina ou serviço religioso. Para elas, como se trata de uma questão de sobrevivência – e o pentecostalismo está presente principalmente nas periferias e trata sobre questões de sobrevivência nesses espaços –, se agarram àquilo que dá mais esperança ou que oferece mais benefícios. Trata-se de um sujeito racional, que tem uma vontade própria e quer mudar. Se o catolicismo deixou de o atender, ele muda. Tanto é assim que o catolicismo perdeu fiéis. Os censos de 1990 para os anos 2000 revelam como, em 20 anos, o acréscimo entre os evangélicos foi de 29%. O salto é muito grande.

 

O pentecostalismo também tem a tradição do carisma. Os pentecostais são muito carismáticos, conversam com todos, e as pessoas se identificam com isso. Quando um branco, como eu, que sou metodista, falo com uma pessoa negra sobre John Wesley [clérigo anglicano e teólogo arminiano cristão britânico, líder precursor do movimento metodista], isso não faz o menor sentido no arcabouço epistemológico dela. No pentecostalismo, o discurso é diferente: eles falam sobre o irmão que pode ajudar quem está em determinada situação, arrumando um trabalho para quem precisa ou dando uma cesta básica etc. Ou seja, as redes de solidariedade entre eles são muito interconectadas e a periferia, em São Paulo, na constituição da metrópole, tem um aspecto muito forte nesse sentido, de reunir pessoas que às vezes estavam passando fome.

 

 

IHU – Hoje, o pentecostalismo continua sendo predominante nas periferias de São Paulo?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Sim. Na minha pesquisa, abordei a complexidade do pentecostalismo na periferia urbana. Alguns dados depois do censo de 2000 funcionam como um divisor de águas no sentido de mostrar como os pentecostais estão ativamente nas periferias.

 

As periferias da região metropolitana de São Paulo são constituídas majoritariamente por igrejas pentecostais. Os pentecostais estão habitando essas regiões. Salta aos olhos como as pessoas, nesses locais, se apoiam mutuamente, querem ter uma experiência religiosa, mas, não necessariamente, querem se vincular àquele lugar; elas transitam livremente entre outras comunidades. Mas muitas pessoas me relataram que “abraçaram o pentecostalismo e o pentecostalismo as abraçou” como uma profissão de fé e uma experiência comunitária.

 

A transmissão dos valores pentecostais faz com que as pessoas se juntem nessas comunidades – e eu até ousaria dizer, estrategicamente, nas periferias. Isso porque estamos falando de pessoas – em alguns lugares – com baixa escolaridade e pouco poder econômico. Algumas características específicas do pentecostalismo o fazem aderir à periferia e a ali permanecer. Grandes igrejas espalhadas pela cidade de São Paulo são pentecostais, mas, incrivelmente, elas são frequentadas por pessoas que também vivem nas periferias, que vão para os templos em caravana ou de ônibus. Em algumas igrejas são realizados diversos cultos ao longo do dia para as pessoas poderem se organizar e participar, ou seja, para poderem ir da periferia até as zonas centrais. Isso não deixa de ser uma atividade social em que as pessoas se organizam, vestem uma roupa diferente, para participar desses momentos.

 

 

IHU - Pode nos dar um panorama da favela do DER, no município de São Bernardo do Campo, a mais antiga do ABC?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – A favela do DER é a primeira favela de São Bernardo e do ABC paulista. Ela existe há 70 anos e está localizada no quilômetro 20 da Rodovia Anchieta, a primeira rodovia duplicada de São Paulo para o porto de Santos. Ela remonta à época em que pessoas migraram do Nordeste para São Paulo justamente para construir a rodovia. É interessante observar a história da favela, que está diretamente ligada à construção da rodovia. Para que fosse possível construí-la, na década de 1940 e 1950, foram abertos vários acampamentos ao longo da atual região da favela para fazer a duplicação ao longo do curso da rodovia. Quando a obra foi concluída, a intenção era acabar com a favela, mas os moradores que vieram do Nordeste trouxeram as famílias e já estavam acostumadas com a vida em São Paulo e não queriam voltar para suas localidades de origem. As pessoas fizeram manifestações e, por fim, o Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de São Paulo - DER manteve as casas das pessoas, mas não fez nenhum investimento na região. Ou seja, o Estado “tapou os olhos” e a favela cresceu exatamente junto ao Centro da cidade de São Bernardo. Ela está localizada a aproximadamente um quilômetro do Paço Municipal.

 

Desde seu surgimento, a favela passou por duas urbanizações. Uma delas foi nos anos 1970, quando São Bernardo começou a crescer junto com a cidade de São Paulo e, naquela época, uma parte da favela foi urbanizada. Depois, nos anos 1990, por uma questão política, urbanizaram outra parte, mas a favela continuou crescendo e uma parte ainda não é urbanizada, não tem coleta de esgoto, não tem endereço fixo. As pessoas enfrentam problemas, hoje, por exemplo, com a questão do delivery: se o entregador não localiza o endereço, a pessoa tem que passar o endereço de um vizinho e se deslocar até a casa dele para conseguir pegar o seu pedido. Recentemente, o Estado está fazendo uma ação na região, pintando as casas que estão voltadas para a rodovia, para amenizar o choque estético.

 

A maioria das igrejas que estão na favela do DER são pentecostais. Também tem uma presença da Igreja católica, mas não tem nenhuma igreja protestante histórica na região. Do lado esquerdo da favela tem um bairro de classe média alta e, do direito, é o Centro da cidade. Então, ela é um entreposto para o tráfico de drogas. Nas visitas que fiz, pude ver que o tráfico de drogas “rola livremente” na favela e as pessoas da igreja sabem da situação e não há problemas quanto a isso porque todas as pessoas se conhecem; é uma favela pequena.

 

 

IHU – Qual foi e tem sido a influência do pentecostalismo na vida das pessoas que vivem na favela? Pelo que você relata, de um lado, elas se ajudam e se relacionam em função do vínculo religioso, mas, ao mesmo tempo, a precarização em termos de saneamento é grande. A presença das igrejas nas comunidades não melhora o entorno?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Inicialmente, eu tinha a intenção de compreender como o pentecostalismo contribuía para melhorar a vida das pessoas na comunidade, mas desde o início da pesquisa, não encontrei nada a esse respeito. Isso porque basicamente as pessoas ficam alheias a esse tipo de situação.

 

A igreja é formada por migrantes, pessoas que participam dela desde a sua fundação, nos anos 1960. Algumas pessoas se preocuparam com questões de melhoria, como a regularização do imóvel, mas não há uma preocupação social da igreja e dos jovens no sentido de melhorar as condições da rua, instalar lixeiras, ou criar outros espaços de convivência, como quadras de esporte para a comunidade. As atividades da igreja são muito proselitistas no sentido de que visam somente o evangelismo. Aos domingos pela manhã, às 7h30, eles costumam evangelizar os jovens que voltam das baladas, na passarela que corta a Av. Anchieta, que passa bem em frente à favela. Enquanto isso, na região há uma série de problemas: uso de drogas, locais não urbanizados, com lixo no chão. Mas, para eles, o fato de essa região ser descuidada não é um problema e tampouco reclamam do fato de o Estado a ter abandonado. A ideia é ser proselitista, trazer pessoas para a igreja e salvar almas. Na favela do DER, a comunidade pentecostal é muito clássica; não há, entre eles, ingerência na sociedade no sentido de ter uma preocupação social. Aí entra a questão da sobrevivência. Ou seja, a sobrevivência está ligada à vivência do pentecostalismo e à necessidade de salvar almas para Cristo. Nesse sentido, eles não veem necessidade de se preocupar com problemas terrenos, mas sim com o que está por vir.

 

 

IHU - Qual é o perfil e a visão de mundo dos jovens de 18 a 29 anos que participam da Igreja Assembleia de Deus Ministério São Bernardo do Campo na Favela do DER, entrevistados para a sua pesquisa?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – A igreja tem 300 membros, mas somente 30 jovens: 18 mulheres e 12 homens. Consegui entrevistar quase todos. Os dados e as entrevistas corroboram as pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE de que entre os pentecostais predominam as mulheres e pessoas negras. Alguns concluíram o ensino médio e estão fazendo algum curso técnico e, à época, somente dois estavam na faculdade. A maioria dos jovens cresceu na igreja e têm uma visão muito conservadora a partir da seguinte máxima: o mundo é maligno, as pessoas precisam se voltar para Cristo, e não existe vida fora da fé e da igreja.

 

Alguns casos me chamaram muito a atenção. Um deles era o de um rapaz, filho de pastor, que, durante um tempo, resolveu “curtir a vida”, saiu da igreja, mas retornou. Com 25 anos e dois filhos, ele costumava dizer que a pior coisa que fez na vida foi ter saído da igreja. Ele tem uma visão muito mais conservadora, com algumas perspectivas extremamente moralistas e regulatórias, do que outros. A igreja tem um livrinho de regras, as quais ele tentava seguir ao máximo. Por exemplo, homens não podem ter barba, se são integrantes de alguns grupos, devem usar terno e as mulheres só podem usar saia e vestido – calça, nem pensar –, devem se abster de álcool, cigarro. Essas são algumas práticas comuns dentro do pentecostalismo, que são hipervalorizadas.

 

Outro caso que me chamou a atenção foi o de uma moça de 19 anos, que engravidou no final da adolescência, mas não se casou com o namorado. Eles moraram juntos por um tempo, mas quando a criança completou um ano e meio, separaram. Desde então, ela estava tentando voltar para a igreja, mas carregava o estigma de mãe solteira e não participava ativamente das atividades da igreja. Havia, em relação a ela, uma coercitividade: os demais não a destratavam, mas a mantinham a distância para não “contaminar” o restante do grupo. Ela tinha interesse em cursar psicologia para ajudar as mulheres da igreja porque, segundo ela, aquelas que participam da assembleia não são valorizadas se não estão em cargo de liderança. Ela queria poder ajudar essas mulheres, conversar e fazer uma terapia sobre essas questões, mas a igreja não dava espaço porque ela destoava de todas as regras estético-morais da comunidade.

 

 

Outro rapaz era deficiente físico e a estrutura do local não favorecia o deslocamento dele em função de ser cadeirante. Então, a participação dele no culto dependia de alguém buscá-lo em casa, mas nem todos têm carro. Ele tinha concluído o ensino médio, mas não sabia o que queria fazer da vida e vivia na seguinte situação: participava da igreja para ter uma interação social, porque não fazia nenhum tipo de terapia e não participava de nenhum grupo ou associação para pessoas deficientes.

 

De modo geral, os jovens são muito solidários e tentam, inclusive, fazer todas as atividades em conjunto. Se decidiam ir ao cinema, todos tinham que ir. Essa era uma forma de ajudarem, mas isso também tinha um caráter regulatório. Quando eles participavam de alguma atividade mais evangelística, em parques da cidade, se dividiam em grupos e geralmente iam somente os solteiros, para fazer proselitismo.

 

 

IHU – De que tipo de atividades sociais eles participam?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – As práticas são aquelas comuns entre as comunidades pentecostais: cultos promovidos pela juventude, participação em ministérios, divididos entre os que são realizados pelos homens, como de música, de administração e ensino, e os que são realizados pelas mulheres, voltados para atividades com as crianças, com outras mulheres e a cozinha. Eles também fazem atividades evangelistas em parques das cidades, vigílias de oração nas sextas-feiras, antes do culto de ceia, que é realizado aos sábados, e ajudavam na distribuição de cestas básicas entre aquelas pessoas que estão em condições de maior vulnerabilidade.

 

Encontros pós-culto

 

Eles também costumam realizar encontros pós-cultos nas casas dos jovens: jogam jogos de tabuleiro, preparam algo para comer em conjunto, como hambúrguer, compram alguma comida pronta quando têm dinheiro sobrando. Em um desses encontros, as meninas demoraram um pouco mais para chegar e, quando chegaram, as solteiras estavam de calça. Eu perguntei por que elas tinham ido trocar de roupa depois do culto e explicaram que como iam se sentar no chão para jogar os jogos, queriam estar mais à vontade, o que não era possível de saia ou de vestido. Apesar de as mulheres não poderem usar calça, não houve, nem entre eles nem entre o líder dos jovens, nenhuma reação coercitiva por causa disso e percebi como eles negociam as regras religiosas. O entendimento é que eles também têm direito a algum tipo de lazer e, se não podem ir para uma balada, se não podem sair para um lugar diferente, é melhor ficarem em um ambiente seguro, em que as pessoas entendam as necessidades específicas e compartilhem dos mesmos ideais. Nesse sentido, eles têm uma perspectiva regulatória muito solidificada internamente, mas, externamente, eles têm um certo receio em não seguir as regras.

 

Em uma das ocasiões em que participei de um culto de ceia, vesti uma camisa, com a intenção de estar o mais parecido possível com eles, aparei a barba e tirei os brincos. Mas, quando cheguei na igreja, os homens estavam todos de terno. Eu, no meio deles, destoava completamente. Apesar disso, eles me acolheram muito bem. Mas, internamente, entre eles, há uma coesão que procura regulá-los para que não saiam desse universo. Nesse sentido, eles se protegem e quem não está disposto a participar dessas regras como eles determinam, está excluído.

 

IHU – Há uma razão ou justificativa para o formalismo em relação à roupa?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Não tem uma explicação lógica. Eles seguem um livrinho que determina as várias condutas. Por exemplo, são contra o aborto, o casamento de pessoas do mesmo sexo, a eutanásia e uso de drogas.

 

 

IHU – Muitos intelectuais ainda veem a religião como uma alienação e, inclusive, outras denominações religiosas veem os pentecostais desse modo. Ao mesmo tempo, em um contexto em que cresce o número de pessoas depressivas e solitárias, as igrejas pentecostais possibilitam aos jovens modos de sociabilidade e convivência. Como você compreende esses dois fenômenos em relação ao pentecostalismo?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Querendo ou não, a religião é uma alternativa para a sociabilidade segura e saudável. Depois da pesquisa, trabalhei em uma ONG na Zona Sul de São Paulo, que promovia cursos de qualificação para jovens. Muitos dos jovens que chegavam lá estavam “perdidos”, no sentido de que não tinham perspectiva de vida, não tinham concluído o ensino médio, demoravam para se tornar autônomos e faziam dois ou três cursos até conseguirem ter uma vida mais autônoma. Nesse sentido, tinham um período de maturação muito demorado. Eles costumavam dizer: “O que tiver que fazer, eu faço; mas não sei o que eu quero fazer”.

 

Em contrapartida, os jovens que participavam de grupos religiosos tinham algo mais ou menos pré-determinado, porque têm lideranças em quem se espelham. Muitos jovens da periferia não têm pai, mas têm o pastor, um amigo, um missionário com quem dialogam na escola dominical e desejam ter as habilidades que essas pessoas têm. Eles começam a desenvolver essas habilidades por conta da influência dessas pessoas, porque até então não tinham figuras que de fato as norteassem. A religião tem, sim, esse aspecto. Também tem um aspecto alienador em alguns casos, mas, como sociólogo, não descarto o papel determinante que a religião tem na vida das pessoas e no rumo que elas vão tomar. A religião cria uma representatividade e maximiza algumas oportunidades que as pessoas não teriam. Para alguns jovens, estar na igreja é uma questão de sobrevivência no sentido de comer, ter acesso a uma cesta básica e relações sociais saudáveis. Ou a pessoa participa da igreja e tenta ter um futuro, ou participa do tráfico. A escolha é racional porque a pessoa sabe que se for pelo caminho do tráfico, terá uma vida mais curta. Nas periferias, essa realidade é muito nítida.

 

A convivência com grupos religiosos cria habilidades e competências que as pessoas precisam inclusive fora da vida religiosa, para trabalhar, porque elas precisam ter uma oratória eloquente, saber se portar, e a religião cria muitas regulações positivas. As pessoas começam a ter essa sociabilidade saudável e uma visão de amplitude para o que é a vida, especialmente entre a juventude religiosa.

 

 

IHU – Durante a pesquisa, como foi a sua socialização com os jovens? Vocês trocaram impressões sobre semelhanças e diferenças na vivência religiosa, considerando que você é metodista?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Como eu também sou músico, consegui conversar bastante com um dos jovens, que me colocou em contato com os demais. Nós conversávamos sobre os aspectos litúrgicos das igrejas, ele perguntava como era o culto na minha igreja e eu explicava em comparação com o da igreja deles. Ele já tinha participado de um culto na igreja Batista, onde os ritos são parecidos com os da Metodista.

 

Os pentecostais são muito dedicados à música. Eles ensaiam, religiosamente, todos os domingos depois da escola dominical. No momento de louvor na comunidade, sempre tem um coro dos varões, um das mulheres, um dos adolescentes e outro dos jovens. Cada coro canta uma ou duas músicas. Eu fiquei impressionado com o fato de eles se doarem tanto para a igreja, de terem uma sociabilidade em torno da igreja no sentido de querer socializar em espaços seguros e garantir o máximo de coesão social entre eles. Para se ter uma ideia, a escola dominical começa no domingo, às 8h30 da manhã, na sequência tem o culto e depois eles ensaiam para o coro. Eles saem da igreja por volta das 13h30 e voltam às 17h30. Fora as outras atividades que eles têm durante a semana. Eles têm uma perspectiva de que precisam ir para a igreja porque ali é o espaço de adorar e buscar a Deus, de estar com os irmãos.

 

IHU – Na sua igreja, a sociabilidade entre os jovens é diferente?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Nós participamos dos cultos, que são ou domingo pela manhã ou domingo à noite e, durante a semana, às vezes, temos reuniões, mas muitas estão sendo realizadas online porque têm mais adesão. Esporadicamente, tem alguma programação aos sábados. A nossa igreja é mais tradicional e damos mais importância ao calendário litúrgico. Eles, não. Eles precisam participar da Igreja porque pensam que, se não participarem, não estarão cultuando a Deus da maneira correta. Para eles, estar na sociedade pode contaminá-los, então, eles têm que estar na igreja para haver a valoração do crente.

 

 

 

IHU – Vocês conversavam sobre questões teológicas e compreensões divergentes, distintas e comuns?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Eles têm essa prática, mas eu optei por deixar essa questão de lado porque percebi que o aspecto moral, para eles, é muito mais importante. Participei de aulas de escola dominical e eles usam muitas frases de efeito no sentido de buscar um inimigo em comum. Os pentecostais falavam muito menos do evangelho ou de coisas que são boas por conta do cristianismo e muito mais em combater o pecado e a sociedade que deturpa os valores de Deus. Eles têm uma regulação muito moral e em alguns momentos não há espaço para discussão teológica. Os adolescentes que moram na DER, por vezes, participam de cursos de teologia teen [para adolescente], que são promovidos pela igreja sede. Os cursos custam 20 reais mensais, somente para pagar o lanche e o material, e o restante é por conta da igreja. As aulas do curso têm o objetivo de explicar por que o casamento de homem com homem ou mulher com mulher não é permitido, por que não se pode abortar etc. Ou seja, as aulas são pautadas muito mais na moralidade do que em questões teológicas ou de dar sentido para a vida.

 

IHU – Qual é a particularidade dos jovens pentecostais em relação a outros jovens de outras denominações religiosas?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Vou caracterizar do ponto de vista negativo e positivo, para facilitar a compreensão. Do ponto de vista negativo, tem o regulatório no sentido de assumir valores e compromissos para participar ativamente da comunidade. Isso é muito tóxico, prejudicial e tem um aspecto regulatório que é imposto: seguir tradições e regras para contrapor a sociedade, porque o evangelho é contrapor a sociedade. É sempre uma lógica de achar um inimigo em comum.

 

Do ponto de vista positivo, a vivência religiosa gera um senso de comunidade que dificilmente é possível encontrar, inclusive em grupos de amigos. Isso cria um senso de comunidade e de ações fraternas que contribuem, inclusive, para a formação do caráter no sentido de que algumas pessoas têm um dissenso social mais aguçado. Sem falar nas habilidades desenvolvidas dentro da prática religiosa. Percebi isso nos grupos do DER, em jovens que não tinham nenhuma estrutura familiar, mas que aprenderam inúmeras habilidades com a religião. É uma situação complexa porque são pessoas que, de um lado, vivem em situação de vulnerabilidade e, quando buscam uma sociabilidade, de outro lado, acabam sendo reguladas o tempo todo.

 

Como a pessoa vai contribuir com aquela religião, com diálogo, com amizade, sendo regulada o tempo todo? A religião também pode ser um espaço de crescimento, mas será que a regulação em tempo integral é necessária? A pessoa que participa de uma prática comunitária sabe o que é certo ou errado, mas as práticas regulatórias acabam por desregular as pessoas.

 

 

IHU – A que atribui a predominância do pentecostalismo nas periferias?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Não conheço trabalhos quantitativos com base em dados do IBGE ou da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD que tratem das razões de o pentecostalismo estar mais profundamente presente nas periferias. Mas, na favela do DER, não vi nenhuma igreja protestante histórica: Batista, Metodista ou Presbiteriana. Em outras periferias que já visitei e nas quais já trabalhei, também não vi igrejas dessa linha. Sempre vejo ou igrejas católicas, mais carismáticas, ou pentecostais. Se fizermos um tour rápido por várias periferias e favelas de São Paulo, vamos observar a predominância de igrejas pentecostais. Durante um período, participei de uma igreja que era uma espécie de congregação da Metodista em uma periferia, mas alguns dos nossos valores e percepções teológicas eram incompatíveis com aquela realidade.

 

IHU – Quais, por exemplo?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Como a resistência das pessoas em transformar a situação do seu entorno, sendo que muitas vezes não tinham salário digno nem para pagar o dízimo. Havia uma racionalização da religião nesse sentido e as escolhas a serem feitas eram difíceis para eles. Por isso, as redes na periferia são muito fortes. As pessoas se ajudam muito no que é necessário para cada dia. Aí entrava outra questão: como fazê-los compreender a importância de racionalizar a política se estão preocupados com a sua sobrevivência e a sobrevivência da família? Em alguns momentos, tentei instigar os entrevistados sobre isso e muitos falaram que a perspectiva deles é votar em pessoas que seguem valores próximos aos do evangelho. Perguntei se não tinham o interesse de votar em alguém que pudesse fazer algo em benefício da comunidade, para melhorar a situação da comunidade, e eles responderam que não. Para eles, o importante é estarem alinhados com os valores do reino, que são: manter a família unida, preservar as instituições e garantir o protagonismo da igreja. Ou seja, eles têm um entendimento de que suas ações podem começar a se pulverizar na sociedade e quanto mais ações crentes forem se pulverizando, mais a sociedade vai se transformando para ficar mais próxima de algo ideal ao reino de Deus.

 

 

IHU – Eles não têm uma preocupação macro, com a sociedade em geral, mas com o local, com o vizinho?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Sim, internamente os laços deles são muito fortes, mas externamente, quando se trata de ingerência política, de estar de fato em posições estratégicas da sociedade, eles não têm essa preocupação. Isso é o que eles dizem, por exemplo, na sede, que fica em um bairro de classe média. Ao mesmo tempo, as redes locais deles são muito capilarizadas. Na comunidade, todo mundo conhece alguém de uma igreja que pode ajudar com alguma coisa, seja com um trabalho, com uma cesta básica, com o pagamento de uma consulta médica, ou conhece alguém que pode ajudar dentro do hospital ou do posto de saúde, ou uma assistente social para fazer uma visita a uma família ou um pastor para consolar alguém. Eles são muito dinâmicos.

 

Outra coisa característica é que embora eles recebam benefícios em alguma igreja, eles não se sentem obrigados a ficar lá nem a ter vinculação com as pessoas. Eles usufruem dos serviços e podem mudar para outras comunidades. O templo de uma igreja retangular que visitei, por exemplo, é dividido entre o lugar dos homens, das mulheres, dos adolescentes e dos jovens, na região central da nave. Nas galerias e na parte de trás, ficam as pessoas que são mais frequentadoras, mas não têm vinculação com a igreja. As pessoas que estão em evidência, que servem na igreja, participam da comunidade e fazem todos os trabalhos da dinâmica comunitária, estão no centro. As pessoas que não têm proximidade preferem ficar à margem arquitetônica da disposição do templo. As pessoas que estão no centro são as mesmas que estão no culto todos os domingos e as pessoas que se sentavam nas laterais não participam das atividades pós-culto nem dos cultos durante a semana. Nesse sentido, a igreja investe naquele núcleo, nos jovens que querem participar de algum congresso ou atividades. Para o restante do pessoal era oferecido o serviço espiritual e cesta básica.

 

 

IHU – Como os metodistas reagem ao pentecostalismo?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – Hoje, por conta da polarização política, e em função da pandemia, este foi um tema da escola dominical da nossa comunidade: como reagir a irmãos que infelizmente são antivacinas ou negacionistas? Tenho muitos parentes pentecostais e é difícil pensar sobre essas questões e não ver a religião como um item determinante nessa visão geral pregada por eles, de que “nós temos uma moral elevada”. Este é um arquétipo que para mim, como estudioso, não vale, especialmente quando as pessoas negociam a sua religiosidade. Há distorções nas regras gerais que eles praticam, mas eles tentam não demonstrá-las publicamente.

 

A igreja Metodista vem perdendo muitos fiéis nos últimos anos, principalmente para os pentecostais, porque as pessoas se identificam mais com pautas morais e com lideranças mais coercitivas e regulatórias, em detrimento de uma teologia, no caso da metodista, que tenta acolher as pessoas, que visa a melhoria integral do ser humano, independentemente de sua origem ou situação. Parece que as pessoas preferem as regulações pentecostais porque podem esquecer a realidade tenebrosa, mas, na Metodista, tentamos conversar sobre os temas e problemas comuns, como a fome, a falta de solidariedade etc. O sentido que o pentecostalismo dá para a vida das pessoas é muito transcendente: quando formos ressuscitar, quando Jesus voltar, tudo isso, aliado à promoção do proselitismo, custe o que custar, mesmo se for necessário ser intolerante ou negar a salvação para algumas pessoas. A ideia do metodismo não é essa; é criar possibilidades para as pessoas acessarem o evangelho de uma maneira muito caridosa, inclusive.

 

Durante a pesquisa, era comum ouvir relatos de pessoas dizendo que precisavam se manter distantes disso ou daquilo. Mas como mostrar para as pessoas que sou cristão, que as pessoas também precisam de Deus, se eu tenho que me manter distante delas? Para compensar isso, eles evangelizam os que estão usando drogas, os que estão voltando da balada, dizendo que essas pessoas precisam voltar para Jesus, conhecer a igreja e aí começam a dar glória a Deus. Isso tem valor, sim, e é uma ação solidária, mas até que ponto isso funciona? O que se faz com essas pessoas depois? Se tenta reintegrá-las à sociedade? De que maneira? Vamos contar com a ação do Estado ou não? As ações miraculosas são muito marcantes no pentecostalismo, mas a questão é: até que ponto só isso é suficiente para a transformação de uma pessoa?

 

 

IHU - Em que consiste a "ética pentecostal", que também foi tema da sua pesquisa?

 

Sérgio Eugênio Ferreira de Camargo – As características marcantes do pentecostalismo, como falar em línguas estranhas, o transespiritual, como o batismo no espírito santo, e os milagres, são também os pontos predominantes na ética pentecostal. As pessoas são muito comprometidas com ações voltadas para a evangelização, com o proselitismo. Elas têm uma comunhão muito forte com os irmãos e desenvolvem ações que tenham mais conexão com o ponto moral. Essa tríade “espiritual, ações de evangelização e a comunhão” é extremamente comum na literatura do pentecostalismo.

 

Dentro da comunidade, os pentecostais são conectados com a caridade a partir de uma visão assistencialista e mantêm isso como uma prática sistemática. Para além disso, hoje eles têm uma ingerência e querem, sim, participar de ações na esfera política, especialmente no legislativo e no judiciário. Nos últimos anos, com as últimas indicações ao Supremo Tribunal Federal - STF, há uma pressão, sim, dos protestantes históricos, mas também dos pentecostais, para determinar leis ou promulgar decretos e pautas públicas que não diminuam o poderio religioso das igrejas. Nos últimos seis anos, pautas de direito de reprodução e sexualidade perderam força. Em compensação, pautas mais liberais e patriarcais no sentido de aumento de poderio das instituições religiosas, no caso dos evangélicos, aumentaram.

 

 

Hoje, a bancada evangélica tem projetos mirabolantes que não condizem com as necessidades do país, como ações econômicas ou políticas de garantias de direitos, de promoção de equidade, de políticas públicas voltadas não para um assistencialismo barato, mas para a distribuição de renda. A situação é complexa porque os pentecostais são a maior porcentagem dos evangélicos no país. Logo, eles têm influência direta nessas ações. Senadores e deputados que têm essas pautas como agenda têm muita influência. Então, a ética pentecostal, embora tenha surgido como algo comunitário, no sentido de escravos comungarem as diferenças, está cada vez mais sectária. Isso me preocupa muito do ponto de vista político, porque a ética pentecostal vem sendo absorvida por igrejas não pentecostais ou igrejas históricas que sempre tiveram um caráter mais moderado em relação a essas agendas.

 

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