Óleo no litoral brasileiro e os royalties do pré-sal: Brasil não está preparado para gerir um plano de contingência. Entrevista especial com David Zee

Cabo de Santo Agostinho | Foto: Salve Macaraípe - Fotos Públicas

Por: Patricia Fachin | 01 Novembro 2019

O aparecimento de óleo nas praias do Nordeste ao longo dos últimos 60 dias, a morosidade em retirá-lo do mar e as dificuldades para concluir as investigações mostram que “não estamos preparados para lidar com uma crise e gerir um plano de contingência, uma vez ocorrido o acidente”, diz o oceanógrafo David Zee à IHU On-Line. Segundo ele, depois de acionado o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Águas sob Jurisdição Nacional – PNC, “pouca coisa funcionou, porque faltou equipamento, faltou treinamento e faltou um planejamento de comando”.

Na entrevista a seguir, concedida por telefone, ele lamenta que recursos oriundos dos royalties do pré-sal não foram destinados para criar um plano de contingência efetivo. “Infelizmente, a divisão desses recursos é feita entre estados, municípios e a União, e na hora de aplicar esses recursos, o que se percebe é que o governo federal aplica alguma coisa, mas na esfera estadual se investem menos recursos e na esfera municipal menos ainda. Percebemos que muitos municípios costeiros que receberam royalties do petróleo transformaram esses recursos em porcelanato para cobrir a avenida beira-mar”, informa.

Na avaliação do oceanógrafo, o Brasil precisa investir urgentemente num centro permanente de comando e gestão de riscos. “Não se pode, na hora em que ocorre um acidente, reunir um bando de pessoas e ver no que vai dar”, afirma. Segundo ele, os órgãos responsáveis pela fiscalização ambiental do território marinho não têm um sistema de monitoramento por satélite, nem pessoal especializado para vigiar pontos de alto risco de vazamento de petróleo. “Tem que ter um ‘big brother’ em cima desses pontos, porque não podemos contar unicamente com a ética das empresas que produzem petróleo de denunciar quando há um vazamento”, sugere.

Zee defende ainda que as empresas de petróleo, que têm centros de pesquisa ultrassofisticados de exploração, invistam na prevenção e na contingência de riscos. “Não quero demonizar a indústria do petróleo, mas assim como o Brasil é campeão em produção em águas profundas, tem alta tecnologia de prospecção em águas profundas, ele também poderia ser campeão no planejamento, na prevenção, na contingência, para quando acontecerem acidentes. Poderíamos dar um exemplo para o mundo de como somos capazes de preservar os recursos marinhos, ainda mais agora, que o Brasil pleiteia o aumento do seu território marinho, com a Amazônia Azul”. E questiona: “Temos condições de dar segurança para eventuais navios que são atacados? Temos condições de fornecer comunicação para todas as embarcações? Temos um poder de fiscalização para esse novo território marinho que pretendemos receber? Com este acontecimento, temos que colocar a mão na cabeça e pensar com seriedade que atitudes podemos tomar para que amanhã a comunidade internacional aceite o pleito do Brasil de aumentar o seu espaço territorial marinho”.

David Zee (Foto: Reprodução | Youtube)

David Zee é graduado em Engenharia Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, mestre em Coastal and Oceanographic Engineering pela Universidade da Flórida e doutor em Geografia Ambiental pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Atualmente é professor adjunto da Faculdade de Oceanografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ.

 

Confira a entrevista.

IHU On-Line - Depois de terem se passado mais de 60 dias após o aparecimento das primeiras manchas de óleo nas praias de Pernambuco, a investigação sobre a origem do óleo e a origem do vazamento ainda não é conclusiva. Quais são as dificuldades encontradas na investigação e com quais hipóteses os especialistas estão trabalhando?

David Zee – Houve várias dificuldades para detectar as causas e tomar as devidas providências. A primeira grande dificuldade é que quem provocou esse lançamento não o denunciou e não pediu ajuda, então tudo leva a crer que deva ter sido uma ação criminosa no sentido de que não houve um aviso. Geralmente, quem provoca esse tipo de acidente tem a obrigação de denunciá-lo para que as autoridades possam tomar as providências o mais rápido possível. Como não foi feita a denúncia, a segunda dificuldade que tivemos foi saber quanto tempo esse óleo ficou no mar. Com certeza ficou bastante tempo, uma vez que ele já se encontra em uma situação bastante intemperizada e já foi bastante processado no meio ambiente seja pela radiação solar, seja pelo contato com a água do mar e o tempo que decorreu disso.

Só para se ter uma ideia, nas primeiras 72 horas, grande parte das substâncias voláteis se perde, e isso representa aproximadamente de 20 a 35% do volume do material despejado — o que representa uma perda muito grande. Com o passar do tempo, o óleo tende a se adensar cada vez mais e é o que está acontecendo: observamos que estamos num momento em que o óleo está quase indo para o fundo do mar. Isso é um problema muito sério porque, se o óleo mergulhar no leito submarino, vai provocar poluição e um prejuízo muito grande, principalmente nos substratos duros, os rochedos, as lajes e os arrecifes. Percebemos que ao longo do litoral que foi contaminado — desde o Maranhão até o sul da Bahia — tem alguma coisa em torno de 2.500 km de costa, o que representa 1/3 da costa brasileira. Estamos com a presença do óleo encostando no litoral há quase dois meses, sem falar do tempo em que o óleo ficou boiando no mar sem que ninguém soubesse.

Eu fiz um levantamento e percebi que praticamente 1.200 km desse litoral atingido é de praias arenosas, que são locais que sofrem impacto, mas um impacto médio, porque se o óleo encostar na areia a remoção é fácil, pois a areia funciona como que um material para absorver o óleo. Contudo, na outra metade do litoral, que é de mais ou menos 1.200 km, uns 400 km são de manguezais e 800 km são de arrecifes de corais e arrecifes de lateritas e arenito, que têm o substrato duro. Ali a vida marinha consegue se fixar e se proliferar e nesses ecossistemas de mangues ou de arrecifes, que são os mais vulneráveis e mais sensíveis, o impacto é de grande proporção. Uma vez que o óleo encosta nesses arrecifes ou nos mangues, não há muito o que fazer e, inclusive, o melhor é não fazer nada, porque ao esfregar, se induz à contaminação, e ao lançar produtos químicos no mar para dissolver o óleo, piora ainda mais a situação, visto que os produtos químicos são mais venenosos que o próprio petróleo. Então, o melhor, se o óleo encostar nos arrecifes, é não mexer. A atitude mais correta é não deixar o óleo encostar nos arrecifes.

Estas atitudes dependem de uma gestão que garanta a rapidez da ação, a qual depende de treinamento, de um planejamento prévio. Isso está no papel, mas na prática não funciona tão bem. Então, precisamos tomar outras atitudes preventivas e planos de contingência mais efetivos, com equipamentos suficientes e com a concatenação de comandos, o que percebemos que faltou.

IHU On-Line – Como ninguém assumiu a responsabilidade do despejo de óleo no mar, os especialistas trabalham com a hipótese de que o óleo vazou de um navio. Essa hipótese é factível? Existe alguma informação sobre a origem do óleo? Ele de fato veio da Venezuela?

David Zee – Entre os fatos circunstanciais, primeiro foi dito, com grande margem de certeza e acerto, que o petróleo tem origem na Venezuela. Se formos analisar o óleo vazado na Venezuela, todas as condicionantes ambientais de ventos e correntes, caso houvesse um vazamento lá, não trariam o óleo para o Brasil, muito menos para o Nordeste; ao contrário, o óleo iria para o Golfo do México, porque os ventos sopram de leste para o oeste, assim como as correntes oceânicas.
Além disso, tem uma segunda questão, que é exatamente a falta de aviso sobre o vazamento: quem originou esse problema foi algum navio e o responsável não alertou as autoridades. Isso é muito factível porque, diante da situação da Venezuela, de extrema carência, de um certo caos e desorganização, os procedimentos de segurança dos navios que saíram daquele país não devem estar nas melhores condições. Outra questão é o bloqueio comercial que existe com os produtos da Venezuela, imposto pelo governo americano. De certa forma, os países que são amigos dos EUA não deveriam comprar óleo da Venezuela, mas muitos deles têm essa necessidade e precisam comprar, no entanto não podem fazer isso de uma forma tão clara. Então, imagine que um navio comprou óleo da Venezuela e teve que levá-lo para a África, o Oriente Médio ou a Ásia e teve que passar ao largo da costa brasileira. Ao acontecer o acidente, ele tinha duas opções: pedir socorro e aí se denunciaria, ou ficar quieto e dar o seu jeito. Provavelmente o jeito que ele deu foi se livrar da carga para não “afundar junto”. Essas são possibilidades bastante reais e possíveis. Uma vez que o navio passou ao largo da costa brasileira, lançou o óleo no mar, o qual não é lançado de forma instantânea e pontual, mas linearmente ao longo da rota do Brasil, e aos poucos. É por isso que o óleo aparece e desaparece e depois de três dias aparece de novo. O óleo se encontra numa situação em que está quase afundando, o que indica que passou muito tempo no mar. Esses fatos circunstanciais levam a esse cenário de eventualmente ter havido um lançamento clandestino em alto-mar, em função de algum tipo de problema que a embarcação possa ter tido e, por causa disso, o óleo está chegando à costa brasileira.


Pessoas recolhem óleo no mar (Foto: Joyce Farias)

IHU On-Line - O governo federal tem recebido críticas por ter demorado mais de 40 dias para acionar o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Águas sob Jurisdição Nacional - PNC. O que é esse Plano e quando ele deveria ter sido acionado?

David Zee – Existem medidas preventivas e medidas de contingência. As medidas preventivas são o monitoramento, o planejamento de como atuar e o treinamento para prevenir ou mitigar a possibilidade de risco do acidente. Medidas de contingência são aquelas ações que podemos realizar uma vez ocorrido o acidente. Estávamos exatamente nesta fase: houve o acidente e, acionado o Plano de Contingência, observamos que pouca coisa funcionou, porque faltou equipamento, faltou treinamento e faltou um planejamento de comando.

Temos que aprender com esses erros porque outros acidentes podem ocorrer. No próximo acidente, pelo menos, é desejável que tenhamos aprendido alguma coisa com esse, que foi algo inédito, mas que também mostrou que não estamos preparados para lidar com uma crise e gerir um plano de contingência, uma vez ocorrido o acidente.

IHU On-Line - Segundo notícias da imprensa, existe um protocolo internacional que orienta como deve ser feita a retirada de óleo do mar em casos de vazamento, e ele não foi seguido neste caso. Em que consiste esse protocolo e por que ele não foi seguido?

David Zee – Este é um protocolo muito bem detalhado, feito por pessoas experientes que já passaram por essas dificuldades. O grande problema é que para poder acionar esse protocolo é preciso ter investimentos: investimento em pesquisa, em treinamento de pessoas e, principalmente, na compra de equipamentos para atender a esse tipo de acidente. Mas tudo isso estava faltando. Sem dúvida nenhuma poderíamos ter feito essa lição de casa, porque afinal de contas todo mundo comenta a divisão dos royalties do petróleo, a divisão dos recursos obtidos no leilão do petróleo. Infelizmente, a divisão desses recursos é feita entre estados, municípios e a União, e na hora de aplicar esses recursos, o que se percebe é que o governo federal aplica alguma coisa, mas na esfera estadual se investem menos recursos e na esfera municipal menos ainda. Percebemos que muitos municípios costeiros que receberam royalties do petróleo transformaram esses recursos em porcelanato para cobrir a avenida beira-mar, que não têm nada a ver com o assunto. Grande parte desses recursos, ou ao menos parte deles, deveria ser destinada para o desenvolvimento do plano de contingência e do plano de prevenção, sem falar na compra de equipamentos e treinamentos de pessoal. Mas tudo isso requer uma técnica refinada e especializada. Portanto, nada melhor que isso fique sob a responsabilidade das grandes empresas que exploram o petróleo no Brasil: elas deveriam ter, nas suas regiões estratégicas, polos de treinamento, de ação imediata de socorro e polos de prevenção, de tal forma que lá pudessem estar concentradas não só mão de obra qualificada, mas principalmente a oportunidade de fazer o treinamento de vários municípios ou estados que não têm como objetivo fim a manipulação do petróleo diariamente.

A Defesa Civil e a Secretaria de Meio Ambiente têm que ter pessoal especializado nesse tipo de procedimento, de modo que quando acontecesse um acidente, soubessem como proceder, para quem ligar, qual é a cadeia de comando, que precisa estar estabelecida. Isso não precisa ser feito para o Brasil inteiro, mas principalmente para os estados com maior risco e propensão de ter esse tipo de acidente. Na região Sudeste e do Espírito Santo até o Paraná, deveriam existir polos de ação imediata de combate à poluição por óleo. No Nordeste, mais do que nunca, é preciso localizar estrategicamente cidades que possam ter esse tipo de polo para treinamento e difusão de conhecimento e da tecnologia, para não sofrermos no futuro tanto quanto estamos sofrendo agora com perdas econômicas no turismo, por exemplo. Além do turismo, que é uma das principais fontes de renda do Nordeste brasileiro, tem a questão da alimentação e da pesca, porque muitos pescadores artesanais dependem da pesca de subsistência. Como responder a essa população mais vulnerável ante a falta de capacidade de administrar esse tipo de problema? É uma responsabilidade muito grande; precisamos pensar não apenas para o negócio da indústria do petróleo — ao qual sou favorável, mas também tem que haver investimentos de segurança e prevenção adequados —, como também para todos os usos do oceano, de tal forma que um uso dos oceanos não atrapalhe outros usos, como entretenimento, produção de alimentos, turismo. O turismo brasileiro é um turismo de meio ambiente, então é preciso preservar esses recursos vivos e naturais.

IHU On-Line - O senhor declarou recentemente que esse derrame de óleo só é comparável ao que aconteceu no Golfo do México, em 2010. Que providências foram tomadas à época e como o governo americano tratou o caso? Ainda há resquícios desse óleo no mar? Os procedimentos adotados naquela ocasião podem servir de orientação para tratar o derramamento de óleo no Brasil?

David Zee – As semelhanças e as correlações que podem ser feitas entre esse acidente e o do Golfo é que lá ocorreram dois acidentes sérios e um deles é o de Macondo, quando vazou uma quantidade enorme de óleo durante oito meses, poluindo todo o litoral da Luisiana e do Texas. A semelhança é a área de expansão do óleo: lá área de expansão foi menor do que a do Brasil, mas em termos de quantidade o óleo que foi derramado lá foi muito maior. Além disso, no caso do Golfo do México, tínhamos conhecimento da origem do petróleo.

Em termos de impacto, de espalhamento de óleo, diria que este é o maior de que tivemos notícia no Brasil. Em termos de volume escoado, não temos a informação; temos apenas a quantificação do óleo que tocou o litoral brasileiro e isso não quer dizer que foi a totalidade do óleo que foi lançado ao mar, porque ao longo do trajeto, do ponto de lançamento até chegar ao litoral brasileiro, com certeza uma grande parte se evaporou e uma grande parte está no fundo do mar.

IHU On-Line - Na imprensa circularam muitas fotos de voluntários retirando o óleo do mar com as próprias mãos. O diretor técnico da Federação Internacional de Poluição por Petroleiros - ITOPF disse que essa é a melhor técnica a ser adotada neste caso. Esse é o procedimento mais adequado? Essa atividade, por outro lado, pode colocar a saúde das pessoas em risco ou não, por conta da toxicidade do óleo?

David Zee – A técnica ou a estratégia mais adequada é não deixar o óleo tocar em áreas vulneráveis do litoral, portanto é preciso rapidez na detecção de óleo no mar e rapidez na retirada, em alto-mar até, antes que chegue ao litoral. Isso porque o litoral é uma área bastante diversa e, por essa razão, existem diferentes níveis de vulnerabilidade e de perigo. Portanto, a estratégia mais adequada é não deixar o óleo chegar ao litoral. Mas uma vez chegando, não há dúvida de que o que foi feito também não é o ideal, porque deveria haver pessoas especializadas, um comando de gestão previamente estabelecido e, novamente, equipamentos de proteção individual.

Muitas pessoas foram fazer a retirada do óleo com as mãos nuas, o que é um procedimento incorreto. Sem falar na inalação de substâncias voláteis e nocivas do óleo, que causam náusea, vômito etc. O que a população fez foi praticamente um ato de amor e desespero ao ver um acidente dessa natureza e diante de respostas muito lentas. No desespero, as pessoas tomaram para si essa responsabilidade, o que é um perigo, porque elas estão se expondo.

IHU On-Line - Segundo levantamento feito pelo Ibama, até o dia 28-10-2019, 254 localidades foram afetadas pelas manchas de óleo e fala-se que a foz de cinco rios foi afetada, por exemplo. Por conta disso, o impacto ambiental pode ser ainda maior, por levar o óleo para os rios?

David Zee – Esse tipo de ocorrência vai deixar um legado de pelo menos 30 anos de lembranças ruins, porque a recuperação desses ecossistemas não vai ser inferior a 30 anos, considerando as condições anteriores ao vazamento. Durante esse período vamos ter resquícios e sinais desse desastre. Essa situação afeta a vida de milhares de pessoas que vivem no litoral brasileiro.

O óleo tem sustâncias tóxicas e nocivas e estará presente em ecossistemas de proliferação de vida marinha, como são os manguezais, e em ecossistemas onde a diversidade é muito rica. Certamente esses ambientes vão sofrer uma depressão por conta do óleo e isso afetará toda a cadeia alimentar desses organismos, chegando até o homem, sem dúvida nenhuma.


Levantamento do Ministério do Meio Ambiente mostra cidades que foram atingidas pelo petróleo

IHU On-Line - O senhor falou sobre a necessidade de investir na prevenção de acidentes desse tipo. Que tipo de investimento é mais urgente para o Brasil, de que equipamentos o país precisa, que pesquisas são necessárias e o que o senhor entende por investimentos nessa área?

David Zee – A primeira coisa é investir num centro permanente de comando e gestão de riscos e de procedimentos para quando ocorrem esses acidentes. Não se pode, na hora em que acontece, reunir um bando de pessoas e ver no que vai dar. Deveria haver um centro organizado funcionando efetivamente, sendo coordenado.

O que apreendemos com este acidente? Que a Marinha é quem tem os meios flutuantes para chegar até o local, que não é todo mundo que tem acesso a esses meios. Que as empresas de petróleo, que têm centros de pesquisa ultrassofisticados na exploração, precisam investir também na prevenção e na contingência e não apenas no desenvolvimento de tecnologia de exploração e transporte. É preciso pensar no dia depois do acidente. Elas devem contabilizar muito bem o prejuízo de imagem, mesmo não sendo culpadas. Se acontece o acidente com uma dessas empresas, daqui a pouco vai surgir uma opinião pública dizendo que não se pode explorar petróleo no Brasil, o que é um absurdo. Tem que explorar, mas com segurança. Então, as empresas precisam perceber que essas imagens negativas podem afetar a viabilidade econômica da exploração de petróleo. O Brasil precisa desses recursos para progredir. Então, é preciso pensar com responsabilidade.

A Marinha, os centros de pesquisa, as agências de fiscalização, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama, a Agência Nacional do Petróleo - ANP, as secretarias de meio ambiente dos estados, nenhum deles têm um sistema de monitoramento por satélite. Não tem pessoal especializado para poder, diuturnamente, dia e noite, vigiar pontos de alto risco de vazamento de petróleo, seja por rotas de navegação, nos oleodutos, nas bacias produtivas, nos terminais. Tem que ter um “big brother” em cima desses pontos, porque não podemos contar unicamente com a ética das empresas que produzem petróleo de denunciar quando há um vazamento. Este vazamento de óleo é um grande exemplo de que existem lacunas que não estão devidamente protegidas. Quem paga as consequências? Hoje estamos procurando os culpados, mas eles só servem para prevenir o futuro. O que temos que fazer primeiro é a retirada deste óleo, porque já há notícias de que ele pode chegar ao sul da Bahia, na região de Abrolhos, o que é ainda mais alarmante.

IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?

David Zee - Só conseguimos avançar quando temos serenidade para avaliar os problemas que aconteceram. Não quero demonizar a indústria do petróleo, mas assim como o Brasil é campeão em produção em águas profundas, tem alta tecnologia de prospecção em águas profundas, ele também poderia ser campeão no planejamento, na prevenção, na contingência, para quando acontecerem acidentes. Poderíamos dar um exemplo para o mundo de como somos capazes de preservar os recursos marinhos, ainda mais agora, que o Brasil pleiteia o aumento do seu território marinho, com a Amazônia Azul.

A convenção da ONU exige que os países que estão pleiteando mais áreas de domínio marítimo tenham a capacidade de dar segurança a esses territórios. Temos condições de dar segurança para eventuais navios que são atacados? Temos condições de fornecer comunicação para todas as embarcações? Temos um poder de fiscalização para esse novo território marinho que pretendemos receber? Com este acontecimento, devemos colocar a mão na cabeça e pensar com seriedade que atitudes podemos tomar para que amanhã a comunidade internacional aceite o pleito do Brasil de aumentar o seu espaço territorial marinho.

 

Leia mais