08 Janeiro 2015
Aos 55 anos, Daniel Sturla, natural de Montevidéu, é um dos três latino-americanos nomeados para o colégio cardinalício pelo papa Francisco, uma verdadeira aposta se se levar em conta que o Uruguai é uma exceção na região, com apenas 42% de católicos entre sua população e uma verdadeira separação entre Igreja e Estado desde 1917; 40% dos uruguaios se declaram ateus ou agnósticos, segundo dados do Centro de Pesquisas Pew, dos EUA.
A reportagem é de Magdalena Martínez, publicada pelo jornal El País, 07-01-2015.
Por isso, a escolha de Sturla tem mais a ver com seu perfil moderno e aberto ao diálogo do que com a possibilidade numérica de reverter a perda de fiéis na América Latina, onde vivem 40% dos católicos do mundo. Outro dos cardeais nomeados pelo papa, Alberto Suárez Inda, procedente do México, prega em um país com 79% de católicos. O terceiro latino-americano nomeado cardeal é o panamenho José Luis Lacunza, residente em um país com 72% de católicos, segundo um estudo da Corporación Latinobarómetro de 2014.
Desde sua chegada ao arcebispado de Montevidéu, o salesiano Sturla se mostrou favorável à legalização da maconha ("não tenho uma posição contrária"), mesmo demonstrando "dúvidas" sobre seu êxito no combate à dependência de drogas. Em novembro de 2014, reuniu-se com as organizações de gays e lésbicas e declarou que "ser homossexual não é pecado", pedindo desculpas se a Igreja ofendeu os que optaram por ter relações com o mesmo sexo.
Mas, assim como o papa Francisco, Sturla tem seus limites e se opôs ao casamento homossexual (legal desde 2013) e recentemente provocou polêmica ao criticar um manual destinado aos professores colegiais para que possam abordar as situações de diversidade de gêneros nas classes.
Ultimamente, as grandes lojas de departamentos e de brinquedos transbordaram com produtos natalinos. Mas, no Uruguai, oficialmente em 6 de janeiro não chegam os Reis Magos: comemora-se o "dia da criança"; 25 de dezembro é "o dia das famílias"; a Semana Santa chama-se "semana de turismo" e a festa da Imaculada é "o dia das praias". Desde 1919 o Uruguai tem o único calendário laico de sucesso no mundo cristão, como reconheceu o novo cardeal Sturla em um de seus artigos teológicos, depois de compará-lo aos fracassos da Revolução Francesa e da Revolução Bolchevique russa, que conseguiram abolições efêmeras do calendário gregoriano.
Sturla, que tem longa experiência como professor e teólogo, prega contra um inimigo na sombra, o duas vezes presidente José Batlle y Ordóñez (1856-1926), que separou a Igreja do Estado em 1917 e forjou o caráter liberal e laico da sociedade uruguaia. Atualmente, a Igreja Católica tem inimigos mais diretos com o forte avanço dos grupos evangélicos procedentes do Brasil. Em 2013, a Igreja Pare de Sofrer inaugurou o maior templo das últimas décadas em Montevidéu. O edifício, situado no centro da capital uruguaia, representou um investimento de US$ 15 milhões (cerca de R$ 40 milhões) e foi uma verdadeira demonstração de poder.
Diante desse fenômeno, os católicos uruguaios se refugiaram no ensino, setor considerado uma alternativa ao sistema público, que registra um retrocesso dos resultados no primeiro e segundo graus. A melhora da educação é uma das prioridades dos cidadãos uruguaios, tema que concentrou o diálogo entre o novo cardeal e o papa Francisco, segundo a imprensa local.
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Cardeal uruguaio escolhido por Francisco vem de país latino com minoria católica - Instituto Humanitas Unisinos - IHU