14 Outubro 2013
"Uma mulher judia que acende as velas de sábado vale mais do que 50 professores universitários". Foi com frases assim que um modesto rabino sefardita como Ovadia Yosef, nascido com o nome de Abdallah, na Bagdá dos anos 1920, morreu como o novo Moisés na Jerusalém de 2013. Foi falando assim para a barriga (muitas vezes vazia) do Israel pobre e sefardita que o grande rabino Yosef ganhou, na última segunda-feira, o mais imponente funeral que a história de Israel se lembra.
A reportagem é de Francesco Battistini, publicada no jornal Corriere della Sera, 09-10-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Um milhão de órfãos choraram por ele nas ruas, e no dia seguinte os sinais ainda podem ser vistos nos manifestos com a tarja preta, nos programas de entrevista, no jornal dos ultraortodoxos Yom le-Yom que não tem outra notícia.
Homenagearam-no até mesmo dois presidentes, Shimon Peres e Abu Mazen, o primeiro ashkenazita e de esquerda, o segundo palestino e mais de uma vez ameaçadoramente mandado para longe ("Se você tivesse uma peste poderia desaparecer da face da terra!") pelo próprio Yosef.
Ovadia não era apenas um rabino: "Era a 'marca' de um mundo feito de religiosos e não só, que marcou os últimos 20 anos deste país", diz o colunista Nahum Barnea. Era o pai político, o líder popular, o supremo juiz e o intérprete último da Torá para milhões de judeus orientais e mediterrânicos – os marroquinos e os argelinos, os etíopes e os iemenitas, os egípcios e os iranianos, "a mulher que acende as velas do sábado" –, o segundo Israel que, a partir das suas pregações, tinha levantado novamente a cabeça e entendido que valia ao menos tanto quanto o primeiro Israel dos pais fundadores e dos ricos ashkenazitas, dos refinados intelectuais europeus e, certamente, dos "50 professores universitários".
O luto vai durar uma semana. O vazio, não se sabe. "Homem da Idade Média", como escreve a imprensa inglesa, Ovadia Yosef vai embora como feudatário que não divide a terra. Há um sucessor natural, o "verdadeiro" grande rabino dos sefarditas, Rabino Amar, mas não é óbvio que ele irá despontar, porque o feudatário não o estimava muito (e não estabeleceu nem mesmo as regras para elegê-lo).
A herança, mais do que religiosa, torna-se política. O Shas, o partido de extrema-direita que Yosef fundou há 30 anos, reduzido ao mínimo e que deixou o governo depois das eleições de janeiro, está dividido entre o carismático Aryeh Deri, que gostaria de se pintar novamente de moderado, e o ex-ministro Eli Yishai, que permitia que os colonos se expandissem cada vez que o primeiro-ministro Netanyahu prometia aos Estados Unidos que eles iriam parar. Depois, há o filho de Yosef, grão-rabino também. E o influente sobrinho, Yehud, que muitas vezes tinha a última palavra.
"Sem o seu fundador – escreveu o jornal Maariv –, o Shas está destinado a voltar a ser uma microcélula de quatro deputados". Mistura de racismo anti-árabe e de realismo político, capaz de detestar Obama e de cortejar Mubarak, de atacar a retirada de Gaza e de desaconselhar a guerra contra o Irã, o Shas conseguiu governar tanto com a direita do Likud quanto com o trabalhista Rabin.
"Para entender para onde ir, agora eles vão se esgoelar e talvez se dividirão", prevê Avraham Diskin, um dos mais famosos cientistas políticos israelenses. "É uma reviravolta também para o país, porque esse partido, sempre agulha da balança, parece estar em decadência. Os partidos ashkenazitas estão mais fortes do que nunca. Pelo que eu vi no funeral, muitos apontam para Deri: era possível notar isso da forma como aqueles que importam estavam perto dele durante toda a cerimônia. É assim que se leem as sucessões no mundo dos sefaraditas. Para entender o futuro, será preciso caminhar pelas ruas do seu bairro de Jerusalém, Yefe Nof. E ouvir de novo as mulheres que acendem as velas".