Combate a desmatamentos é duramente criticado por defensores da Amazônia

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30 Julho 2020

“O Exército brasileiro não foi criado para comandar operações ambientais, por isso faz menos com muito mais recursos”. A frase de uma das ambientalistas mais importantes da região amazônica, Ivaneide Bandeira, engrossa o coro das organizações não-governamentais que criticam o expressivo esforço militar para evitar desmatamentos e queimadas com base em decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).

A reportagem é de  Luciana Oliveira, publicada por Amazônia Real, 29-07-2020.

Em conjunto, o Instituto Democracia e Sustentabilidade, Instituto Socioambiental, International Rivers Network, Observatório do Clima, Transparência Internacional-Brasil, Grupo de Trabalho Infraestrutura da Amazônia e WWF-Brasil protocolaram em 16 de julho um requerimento no Tribunal de Contas da União (TCU) para apurar gastos e eficiência das ações militares.

As organizações ambientais também querem saber se as instituições financeiras estão cumprindo a regra de não conceder crédito rural, subsidiado com recursos públicos, a imóveis com áreas desmatadas ilegalmente e embargadas.

Operação Verde Brasil 2, liderada pelo vice-presidente, general Hamilton Mourão, não consegue conter a devastação da floresta (Foto: cabo Estevam/CcomSex)

“Os militares estão gastando um dinheiro absurdo para pouco resultado. O que está por trás disso? Temos instituições criadas com fins de proteção e com experiência técnica de anos. O governo tinha que fortalecer o trabalho do Ibama, do ICMbio e da Funai”, afirmou Ivaneide Bandeira, coordenadora da Kanindé, Associação de Defesa Etnoambiental de Rondônia que há 28 anos atua para proteger o meio ambiente, os povos e territórios indígenas.

As organizações não-governamentais condenam o resultado da Operação Verde Brasil 2, liderada pelo vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, e criada para, em tese, proteger a floresta. Em junho, houve o aumento de 25% nos alertas de desmatamentos registrados no sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Um total de 1.034,4 km² da floresta amazônica foi devastada, um aumento recorde desde o início da série histórica de monitoramento em 2015. No primeiro semestre, foram 3.069,57 km², um quarto a mais do que nos seis primeiros meses de 2019.

Operação Verde Brasil de combate ao desmatamento em Rondônia (Foto: cabo Estevam/CcomSex)

A segunda etapa da Operação Verde Brasil começou em 11 de maio e durou 30 dias. Com um orçamento de R$ 60 milhões, apresentou resultados irrelevantes. Mas o Ministério da Defesa fez questão de destacar que 110 embarcações foram apreendidas, 124 veículos retidos por irregularidades e 14 mil metros cúbicos de madeira ilegal foram confiscados.

Em 10 de julho, Mourão admitiu que o resultado foi frustrante com relação ao combate a desmatamentos porque a operação começou tarde. “O começo em maio vai nos dar uma situação, vamos dizer assim, uma melhor em relação às queimadas, mas não ao desmatamento”, declarou. Quatro dias depois, em reunião do Conselho da Amazônia, o general declarou que tem “planejamento para manter a GLO, se necessário, até o final do atual mandato presidencial, em 31 de dezembro de 2022”. O decreto nº 10.341/2020 deu poderes às Forças Armadas na GLO.

A atuação da GLO em cheque

A primeira edição da Operação Verde Brasil foi realizada de agosto a outubro de 2019, quando a Amazônia ardia em chamas e a resposta do governo de Jair Bolsonaro também já chegava tarde. Naquele período, o Inpe registrava mais de 58 mil focos ativos no bioma. O Ministério da Defesa informava o combate de apenas 1.835 focos de incêndio por vias terrestres e aéreas e 352 autos de infração.

A missão militar na fiscalização ambiental da Amazônia envolve as Polícias Federal e Rodoviária Federal, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio), Força Nacional de Segurança Pública, Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) e Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam).

Operação Verde Brasil de combate ao desmatamento em Rondônia (Foto: cabo Estevam/CcomSex)

Além disso, três comandos militares são acionados: Príncipe da Beira (CCj PB), em Porto Velho (RO); Barão de Melgaço (CCj BM), em Cuiabá (MT); e Marechal Soares de Andrea (CCj MSA), em Belém (PA).

Em 19 de junho, o jornal O Estado de S. Paulo denunciou que os dados da Operação Verde Brasil 2 foram inflados para embutir o resultado de operações que não tinham ligação com o apoio militar. “Em vez de 104 tratores de esteira, escavadeiras e máquinas agrícolas, a pasta (Ministério da Defesa) informou que, na realidade, foram destruídos 27 equipamentos desse tipo”, diz a reportagem.

O Ministério Público Federal (MPF) pediu que fosse aberto processo no Tribunal de Contas da União (TCU) para investigar a execução financeira da operação militar. Outra reportagem do Estadão havia mostrado que operação militar Verde Brasil 2 havia executado, até 3 de julho, apenas 0,7% de seu orçamento previsto, o equivalente a R$ 2,3 milhões dos R$ 60 milhões previstos. “A execução insignificante do orçamento relativamente às ações de combate ao desmatamento na Amazônia indica que o programa Verde Brasil 2 não passou de peça publicitária”, resumiu o subprocurador-geral do MP Lucas Rocha Furtado em sua representação.

A agência Amazônia Real ouviu em Rondônia fiscais do Ibama, ICMbio e da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Ambiental de Rondônia (Sedam) sobre o comando do Exército no combate a desmatamentos e queimadas e outros delitos ambientais. O Estado está entre os dez com mais alertas de desmatamentos no semestre com 14% de participação na devastação, segundo o Imazon.

“Nossas equipes têm ‘know-how’ e principalmente, comprometimento para conduzir as operações. O governo tinha que investir esse volume de dinheiro nos órgãos e servidores competentes para proteger o meio ambiente, pois o benefício é de longo prazo. Com os militares, não. Quando acaba o dinheiro, a GLO, vão embora para os quartéis e o problema continua. E o pior é que ainda vão divulgar que foi o Exército quem salvou a Amazônia”, desabafou um fiscal do ICMbio, que pediu anonimato.

Um fiscal da Sedam, que também pediu para não revelar seu nome com medo de retaliações, afirmou que não há colaboração entre militares e os atuais agentes de fiscalização. Isso acabou por criar um clima de animosidade nas operações conjuntas desde que o governo nomeou dezenas de militares nos órgãos ambientais. “Os militares não gostam de interferência no comando como orientações técnicas para atingir melhor resultado. Qualquer observação é vista como ordem de baixo para cima, de fiscal para militar. Esse é o nosso trabalho e fazemos bem. Com o que eles têm poderíamos fazer muito mais”, disse. “Estão gastando e ganhando muito dinheiro! Tem um verdadeiro festival de diárias pagas a militares que substituíram fiscais muito mais qualificados. Se compararmos, os militares têm muito mais estrutura e são bem melhor remunerados para fazer o trabalho de controle ambiental. É infame a situação”.

No dia 19 de julho, o programa Fantástico, da TV Globo, mostrou reportagem sobre o aumento dos alertas de desmatamento e o enfraquecimento das políticas ambientais. O MPF pede em Ação Civil Pública o afastamento imediato do ministro Ricardo Salles por improbidade administrativa, patente na desestruturação dos órgãos de fiscalização promovida oficialmente pelo titular da pasta.

Ouvido pela reportagem da TV Globo, o ex-presidente do ICMbio, Adalberto Eberhardt, foi um dos entrevistados e contou por que ficou apenas três meses no governo Bolsonaro. “O Exército fazendo operações fardado, com fardas verde-camufladas na Amazônia, fazendo show para a imprensa, para televisão e o Ibama e ICMbio que são os órgãos realmente responsáveis pelo setor, em casa esperando as coisas acontecerem”, desabafou.

Para o fiscal do Ibama ouvido pela Amazônia Real, haverá um enfraquecimento ainda maior dos órgãos ambientais e a um custo altíssimo se a Operação Verde Brasil se estender até o final do mandato do governo Bolsonaro. “É o Exército que vai lucrar midiaticamente com uma missão conjunta para a qual contribuiu menos. A intenção é desqualificar nosso trabalho. Não é uma parceria legítima a que usa o trabalho de um para promover o outro”, criticou Eberhardt.

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