Rachadinha: centenas de políticos na mira do Coaf e da Justiça

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02 Julho 2020

"Poucos, muito poucos mesmo, se salvam dessa pandemia financeira, operando no seio do Estado. As investigações, em geral, correm em sigilo: encontram conivência nas instâncias posteriores", escreve Aylê-Salassié Filgueiras Quintão, jornalista, professor e doutor em História Cultural.

Eis o artigo.

Está difícil a definição de uma pauta política para a sociedade nesses os próximos dias. A chamada agenda setting – aquele acordo silencioso e invisível entre os políticos e a mídia sobre o tema que deve ser posto em discussão na sociedade – encontra vários desafios. O Covid está ainda por aí, agora caminhando em direção ao topo – entre julho e agosto –, conforme preconizou o ex-ministro da Saúde, médico Luís Mandetta. Mas existem outras expectativas. 

O segundo semestre é aberto com um novo ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, prometendo mudanças na direção do governo que está aí. Mas começa mal, ao ter a imagem marcada por um falso currículo. No Judiciário, tomam posse, como presidentes, os ministros Luiz Fux, no Supremo Tribunal Federal, e Luis Roberto Barroso, no Superior Tribunal Eleitoral. Ministro de carreira, Fux coordenou o grupo de trabalho que formulou o novo Código do Processo Civil (2015). É conhecido ainda por defender a aplicação rígida da Lei da Ficha Limpa (2010), que impede a candidatura de políticos condenados por tribunais colegiados. As eleições municipais batem às portas, embora adiadas para novembro. Contudo, as duas mudanças no Judiciário estão sendo apelidadas de “Puxadinho”, porque novos presidentes dos tribunais superiores eram nomeados em governos petistas. 

Já se tem também em pauta a “Rachadinha”. Impossível tirá-la da agenda como querem muitos, ou prever o futuro que ela reserva para os parlamentares. Para além dos vinte deputados do Rio de Janeiro, já denunciados, o tema promete um escândalo generalizado, envolvendo milhares de políticos em todo o País. De acordo com assessores do CoafConselho de Controle das Atividades Financeiras do Banco Central, o atual processo não poderia parar no Queiroz, embora haja quem admita que ela venha a se tornar uma política pública: “Rachadinha para todos”. 

A “rachadinha” vem de uma verba do Gabinete atribuída a cada senador, deputado federal, estadual e até a vereadores das câmaras municipais mais ricas. Trata-se de uma rubrica contábil no orçamento dos Legislativos, que destina um valor mensal para contratação direta, pelos políticos em exercício, de “secretários parlamentares” para dar apoio aos gabinetes. Só a Câmara dos Deputados gastou até junho, com essa rubrica, R$ 255 milhões, valor que deverá dobrar até dezembro. Façam-se as contas: são 513 deputados federais, 84 senadores, 1.059 deputados estaduais e 59.951 vereadores (Dados de 2015).

Essa verba de gabinete na atual Legislatura está fixada em R$ 111.675,59 mensais, conforme o Ato da Mesa 117/2016. O pessoal contratado é de livre escolha do deputado. Cada deputado pode ter até 25 secretários. O menor nível de retribuição previsto na Lei nº 13.323/16 é R$ 1.025,12; e o maior, R$ 15.698,32. Encargos trabalhistas como 13º, férias e auxílio-alimentação são pagos em outra rubrica do Orçamento da Câmara.

Com raríssimas exceções, os parlamentares federais, estaduais e até vereadores tiram daí, para si, um naco, usando vários artifícios. Sem controles explícitos, contratam empregados particulares pelo Brasil, com o dinheiro da mesma verba pública. Cada um tenta fazê-la dar filhotes, pagando baixas remunerações a esse pessoal de apoio ou cobrando um percentual (10% a 30%) de retorno à conta do parlamentar. Havia na Câmara Federal um deputado que tinha 40 funcionários no gabinete. Houve caso de funcionário recebendo salário do Gabinete no exterior. Em Goiás um deputado empregava o time de futebol com essa mesma verba.

Parte desse dinheiro pode, sim, ir para o bolso do parlamentar, para sua mulher, os filhos, parentes, para o jardineiro dele, para a empregada doméstica, para os cabos eleitorais e até para as amantes. Na Primeira República estas eram apelidadas de coquetes: cada um tinha uma ou duas. São “secretários parlamentares”. Todos recebem uma carteira de identificação do órgão legislativo ao qual está vinculado o parlamentar. E todos passam a ter direitos a serviços médicos, transportes, vale refeição do Legislativo e arrotam a condição de assessor no Congresso Nacional.

Os deputados e senadores se defendem alegando serem obrigados a manter um escritório (particular) no estado de origem. Alguns desses escritórios funcionam como uma extensão do gabinete em Brasília, ou é mantido com o pagamento do pessoal com aquele percentual “rachadinho”, tirado de uma contribuição “compulsória” dos salários dos que são pagos com a verba de gabinete. É uma das chances de compensar os que ajudaram o parlamentar na campanha. Não se exige frequência, nem ponto. As atividades são, supostamente, desempenhadas nas regiões e bairros de votação do deputado. O sujeito vai ao gabinete uma vez por semana ou por mês, e assina todos os pontos. Alguns o fazem pelo correio.

É parte do jogo, e que não chega a ser irregular, segundo alguns juristas, mas que é, sobretudo, imoral, uma imoralidade, aparentemente, endêmica nos legislativos. Poucos, muito poucos mesmo, se salvam dessa pandemia financeira, operando no seio do Estado. As investigações, em geral, correm em sigilo: encontram conivência nas instâncias posteriores. Essa de financiar milicianos eu nunca ouvira falar! ...

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