02 Agosto 2019
O desmatamento em unidades de conservação na bacia do rio Xingu, nos Estados do Pará e Mato Grosso, cresceu 44,7% em maio e junho de 2019 em comparação com o mesmo período do ano anterior, reforçando a tendência de alta no desflorestamento da Amazônia e ampliando as pressões sobre um dos principais corredores ecológicos do bioma.
A reportagem é de João Fellet, publicada por BBC News Brasil, 02-08-2019.
Os dados são do Sirad X, boletim publicado a cada dois meses pela Rede Xingu+, que agrega 24 organizações ambientalistas e indígenas. Além de compilar imagens de satélite, o sistema usa radares que permitem detectar o desmatamento mesmo em períodos chuvosos do ano.
O boletim diz que, entre janeiro e junho deste ano, a região perdeu 68.973 hectares de floresta - área equivalente à cidade de Salvador. A bacia do Xingu abriga 26 povos indígenas e centenas de comunidades ribeirinhas, que dependem do bom funcionamento dos ecossistemas locais para sobreviver. A região tem tamanho comparável ao do Rio Grande do Sul.
Como mais da metade da bacia é composta por áreas protegidas, ela também serve como uma espécie de escudo da Amazônia em sua porção oriental, dificultando o avanço do agronegócio pela floresta. E ela é uma das últimas áreas do bioma amazônico em contato com o Cerrado, o que lhe confere papel central em estudos sobre biodiversidade.
Quando se compara o desmatamento de maio e junho no Xingu com o do bimestre anterior, o aumento foi de 81% para toda a bacia e de 405% para unidades de conservação.
Política ambiental de Bolsonaro
É normal que o índice de destruição cresça no meio do ano, quando o clima mais seco facilita as derrubadas, mas o tamanho do aumento foi considerado alarmante pelos autores do estudo.
Para eles, o crescimento se explica por ações do governo Jair Bolsonaro que fragilizaram o combate a crimes ambientais e por declarações do próprio presidente que estariam encorajando atividades ilícitas, especialmente o garimpo.
Bolsonaro e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, têm pregado uma mudança na política ambiental que reduza a ênfase em punições e considere o impacto econômico de atividades nocivas à natureza.
"O que acontece hoje no Brasil, infelizmente, é o resultado de anos e anos e anos de uma política pública da produção de leis, regras, de regulamentos que nem sempre guardam relação com o mundo real", disse Salles numa reunião com madeireiros em Rondônia, em julho.


Bacia do Xingu, no Pará e Mato Grosso (trecho em amarelo corresponde às áreas protegidas)
Há duas semanas, a BBC News Brasil publicou uma reportagem sobre o avanço do garimpo ilegal em terras indígenas da Amazônia em 2019. Uma das áreas mais impactadas pela atividade fica na bacia do Xingu, a Terra Indígena Kayapó.
Bolsonaro defende liberar a mineração em terras indígenas e costuma dizer que "o índio não pode continuar sendo pobre em cima de terra rica". A medida depende de aval do Congresso.
Várias das principais associações indígenas brasileiras são contrárias à atividade, temendo seus impactos sociais e ambientais.
Segundo os autores do Sirad X, "o garimpo tem se destacado como o principal vetor do desmatamento" em áreas protegidas do Xingu.
Quem desmatou mais
Altamira (PA), onde fica a hidrelétrica de Belo Monte, foi o município da bacia que mais desmatou, com 18 mil hectares de floresta destruídos em maio e junho.
O Pará foi responsável por 82% do desmatamento ocorrido na bacia no bimestre, enquanto o Mato Grosso respondeu por 18%.
A unidade de conservação mais impactada foi a Área de Proteção Ambiental (APA) Triunfo do Xingu, no Pará, palco de 38% de todo o desmatamento ocorrido na bacia em maio e junho.
Segundo o boletim, a reserva já perdeu 36% de suas florestas, o que os autores atribuem à "ausência de zoneamento que defina as áreas destinadas à conservação" e à "falta de operações de fiscalização e monitoramento ambiental in loco".


APA Triunfo Xingu em Julho de 2009


APA Triunfo Xingu em Junho de 2019
A íntegra da reportagem pode ser lida aqui.
Leia mais
- Ao menos 13 milhões de árvores foram derrubadas ilegalmente no Xingu em dois meses
- Desmatamento na bacia do Xingu dobra entre março e abril; área desmatada chega a 12 mil hectares no mês
- Em um mês, o equivalente a 5 mil campos de futebol foram desmatados na Bacia do Xingu
- Desmatamento no Xingu avança mesmo debaixo de chuva
- MPF recomenda combate contínuo à extração ilegal de ouro nas terras dos indígenas Munduruku, no Pará
- Fiscalização do Ibama desativa 29 balsas e máquinas de garimpo na Terra Indígena Kayapó (PA)
- Estudo estima que, em apenas seis meses, cerca de 100 milhões de árvores foram desmatadas na Bacia do Rio Xingu
- Mato Grosso lidera ranking anual de desmatamento na Amazônia Legal
- MPF aponta 2,3 mil responsáveis por desmatamento ilegal na Amazônia
- Monitoramento por satélite identifica desmatamento ilegal de 2,6 mil hectares em áreas cobertas por nuvens em MT
- Sem choque de gestão é impossível eliminar o desmatamento ilegal. Entrevista especial com Ana Paula Valdiones
- Corte de recursos do Ibama ampliará desmatamento
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Desmatamento dispara no Xingu, um dos últimos 'escudos' da Amazônia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU