Itália. Não morreremos católicos: a religião acabou em 1980. Pesquisas mostram o distanciamento com a Igreja

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05 Julho 2017

Para a geração que está fazendo suas escolhas de vida agora, os sacramentos já não são sequer um tributo obrigatório à tradição e pais. A Fundação Critica Liberale divulgou o seu décimo primeiro Relatório sobre a secularização na Itália. Os numerosos dados apresentados são muito interessantes especialmente quando vistos em uma perspectiva histórica, ou seja, no arco que cobre os últimos vinte anos. Analisando este período, verifica-se que existem alguns indicadores que atestam uma secularização crescente e maciça.

O comentário é de Marzo Marzano, publicada por Il Fatto Quotidiano, 04-07-2017. A tradução é de Luisa Rabolini.

O mais importante é dos casamentos ‘concordatário’ (ou seja, católicos), cujo número caiu drasticamente de 1994 a hoje: 23 anos atrás, casaram-se na Igreja 235.990 casais, em 2014 são menos da metade, 108.054. A essa impressionante diminuição corresponde um aumento do número de casamentos civis, que passaram, no mesmo período, de 55.817 para 81.711.

Nesse âmbito, presume-se também que tenham aumentado os casos de união estável (condenada pela Igreja católica), visto que o número total de casamentos diminuiu, em vinte anos, mais de 100.000 unidades, ou seja, cerca de 35 por cento, passando de 292.000 em 1994 a 189.000 em 2014.

É evidente que, a fim de serem avaliados corretamente, esses dados precisariam ser comparados com a evolução demográfica e a composição religiosa da população (devido aos migrantes não católicos) no mesmo intervalo de tempo, mas não há dúvida de que eles atestam o crescimento de um maciço descolamento da forma católica de vida familiar.

Na mesma direção segue outro indicador, o relativo à quantidade de divórcios, que dobrou no período de 1994 a 2014. Embora o relatório não informe quantos destes envolvessem casamentos religiosos, o índice ainda assim é impressionante. E há grande chance de aumentar mais ainda no futuro próximo, devido à recente introdução de ‘divórcio breve' (lei de 2015 que simplifica o procedimento, ndt) e das novas disposições em matéria de obrigações financeiras com o cônjuge.

Para um terceiro indicador inequívoco de secularização, vamos integrar os dados do Relatório com aqueles do Istat: em 1994 os filhos (então chamados 'naturais') nascidos fora do casamento eram 7,7 por cento dos nascidos vivos; de acordo com o Istat, agora são quase 29 por cento dos recém-nascidos, seu percentual sobre o total de nascimentos praticamente quadruplicou em pouco mais de duas décadas.

No caminho contrário, o percentual de batizados entre as crianças diminuiu significativamente, passando de 92 por cento em 1994 para 76, em 2014. O conjunto desses dados, portanto, evidencia um distanciamento cada vez maior da população italiana das práticas religiosas católicas.

No Relatório também aparecem outros dados que pareceriam contradizer essa tendência, levando a pensar a uma fase estacionária ou, no máximo, a um leve recuo na catolicidade dos italianos. Por exemplo, o número de primeiras comunhões, em vinte anos diminuiu muito pouco: de 513.300 em 1994 para 446.521 em 2014. O mesmo argumento aplica-se a outros indicadores, tais como a frequência nas aulas de religião, que retrocedeu poucos pontos nos últimos 20 anos e manteve-se perto de 90 por cento dos estudantes ou a percentagem de destinação de 8 por mil do imposto de renda para da Igreja Católica, que também ficou estacionário em torno de 45 por cento das escolhas totais e 80 por cento entre aqueles que expressam uma preferência.

Então, o que está acontecendo? Os italianos são esquizofrênicos? Eles agem de forma irracional e incoerente?

Eu não creio nisso, e acho que essas grandes diferenças podem ser explicadas dentro de um contexto geracional. Quase todos os levantamentos por amostragem realizados nos últimos anos vêm nos mostrando como o grande salto para a secularização e afastamento radical da "religião dos pais" tenha sido feito pela geração nascida após 1980. É entre os nascidos após essa data que o descolamento da Igreja é galopante e torna-se um comportamento de massa. São esses indivíduos que, recentemente ingressados no segmento superior da idade adulta e envolvidos com as primeiras grandes escolhas existenciais, casam-se cada vez menos, passam a morar juntos cada vez mais, têm filhos fora do casamento e os batizam menos.

Nas gerações anteriores, a secularização, embora presente, tinha um ritmo mais lento e havia autorizado muitos hierarcas católicos a esperar que a Itália representasse um exceção em uma Europa que estava se tornando cada vez menos religiosa. Nas faixas etárias centrais, entre aqueles que hoje enviam seus filhos à catequese, no entanto, ainda está generalizada aquela que o sociólogo britânico definiu como uma religiosidade "vaga", segundo a qual as pessoas afastam-se cada vez mais da prática regular e do sentimento de convicções religiosas genuínas, mas continuam a ser, por assim dizer, culturalmente fiéis à tradição espiritual da qual provêm. Frequentam pouco a missa, mas levam os filhos a receber os sacramentos. E muitas vezes, inclusive, se casam na Igreja apenas para não causar desgosto à mãe. Religiosidade "vaga", escreve Voas, é um estado de transição, de um mundo religioso a um sem Deus.

Hoje, aquela ilusão não encontra mais suporte e até mesmo a hierarquia católica é forçada a admitir que também a Itália, mesmo com seus ritmos próprios, é varrida pela grande corrente de secularização que investe o mundo desenvolvido (e não apenas a Europa, mas também as Américas, incluindo a latina).

O Papa Francisco decidiu dedicar o próximo Sínodo ao tema dos jovens. Quem discutirá o assunto será principalmente a hierarquia idosa. Os jovens já foram embora.

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