18 Dezembro 2025
Para especialistas, alto custo, território extenso e pouca visão de longo prazo impedem país de investir em cabos subterrâneos. Crise climática, porém, deve tornar infraestrutura cada vez mais necessária.
A informação é de Valentina Gindri, publicada por DW, 11-11-2025.
O recente ciclone de 10 de dezembro em São Paulo, que derrubou postes e árvores e deixou 2,2 milhões de clientes na capital e região metropolitana sem eletricidade, evidenciou mais uma vez o tamanho do problema. A concessionária de energia da região já protagonizou quatro apagões nos últimos dois anos.
No Brasil, a fiação subterrânea corresponde a menos de 1% da malha elétrica. Estima-se que no Rio de Janeiro o percentual seja de 11%, em Belo Horizonte, de 2%, em Porto Alegre, de 9%, e em São Paulo, de apenas 0,3%.
Para especialistas ouvidos pela DW, os principais motivos para que o Brasil não invista em fiação elétrica subterrânea são o alto custo dessa infraestrutura e a grande dimensão do país.
"A lógica das distribuidoras é que não compensa investir, já que apenas eventualmente tem um tufão, um temporal. Mas os prejuízos dos sinistros climáticos vão ser mais intensos e frequentes, isso vai trazer um custo tão alto, que logo o investimento em fiação subterrânea será mais urgente", destaca Nivalde Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Quais são as barreiras?
Especialistas apontam que o custo para instalar redes subterrâneas é cerca de 10 vezes maior do que o custo de instalação das aéreas.
Para Nivalde Castro, o que impede o Brasil de adotar o modelo é o fato de ser um país em desenvolvimento, com um território de grandes dimensões e uma alta densidade demográfica.
"É um investimento muito alto. Até em países ricos, como EUA e Japão, boa parte da rede é aérea. Nossas cidades crescem rápido, não são como as europeias", aponta.
"Quando faço um investimento, ele entra na tarifa do consumidor quase imediatamente. A Aneel estabelece inclusive um limite permitido de investimento, o chamado investimento prudente.
Já para Roberto D'Araujo, engenheiro elétrico e diretor do Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Energético (ILUMINA), apesar do investimento inicial ser alto, as despesas futuras diminuiriam.
"Na fiação subterrânea, a manutenção é muito mais barata. O problema é a visão de curto prazo das empresas privadas", defende.
Desafio do trabalho conjunto
Especialistas destacam que, para uma migração à fiação subterrânea, seria necessário a interlocução entre vários setores, e não apenas o energético.
No Brasil, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) coordena concessões às distribuidoras. Já a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) regula as empresas de telecomunicação.
"É preciso convencer empresas de telecomunicações para que elas participem também, é um projeto de cidade", destaca Roberto D'Araujo.
Em 2017, o ex-prefeito de São Paulo João Doria fez um acordo com a AES Eletropaulo. A iniciativa se manteve sob o governo de Ricardo Nunes, mas apenas 37 dos quase 65 quilômetros estipulados foram concluídos.
Também em São Paulo, em 2005, uma lei municipal estabeleceu que concessionárias enterrassem por conta própria 250 quilômetros de rede por ano. A Justiça, porém, entendeu que o município não tem competência, já que a concessão é federal.
Em Porto Alegre, uma lei sancionada pelo prefeito Sebastião Melo em 2023 estabeleceu o cabeamento subterrâneo até 2038.
Melhorias no sistema já existente
Para Roberto D'Araujo, é preciso organizar as instalações aéreas existentes e combater irregularidades.
"Muitas cidades nos EUA não têm fiação enterrada, mas existe uma arrumação", argumenta.
"As empresas de telecomunicações pagam um aluguel às distribuidoras. Essa receita deveria ser investida na melhoria da rede", aponta D'Araujo.
"A agência reguladora não fiscaliza de forma eficiente. Só uma melhoria na arrumação dos postes e nas árvores já faria uma grande diferença", conclui.
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