30 Dezembro 2025
"A queda do sentido moral infecta o próprio cotidiano, e a regra do engano muitas vezes tem uma aplicação sistêmica na pequena fraude, na sonegação fiscal, no interesse privado acima de tudo e na corrupção", escreve Gianfranco Ravasi, ex-prefeito do Pontifício Conselho para a Cultura, em artigo publicado por Il Sole 24 Ore, 14-12-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Eis a regra dos negócios: faça aos outros o que você não gostaria que fizessem a você. Inserida em um jornal de economia e finanças, nossa coluna de viés espiritual e moral está legitimada a abordar também esse horizonte que o grande economista Amartya Sen não hesitava colocar sob o guarda-chuva da filosofia social ética, transcendendo o mero perímetro das finanças e dos mercados. Assim, propomos uma observação crítica bastante amarga sobre a prática dos negócios: ela foi formulada por um dos maiores escritores ingleses do século XIX, Charles Dickens, em seu romance Martin Chuzzlewit, nascido da desilusão do autor após sua primeira viagem aos Estados Unidos, onde encontrou uma sociedade muito diferente daquela que imaginara. A regra que prevalecia ali era precisamente o oposto do lema evangélico de "fazer aos outros o que gostaria que fizessem a vocês" (Mateus 7,12). Nos negócios, ao contrário, valeria o princípio que, no inglês de Dickens, poderia ser traduzido também assim: "Façam aos outros, porque eles o fariam a você". É claro que outro escritor, o francês Alexandre Dumas pai, em seu célebre O Conde de Monte Cristo, advertia impiedosamente que "nos negócios não há amigos, mas, no máximo, sócios".
Embora o discurso se aplique às poderosas corporações econômicas e financeiras, o duro conteúdo de nossa reflexão, infelizmente, estende-se também aos níveis mais baixos da sociedade. A queda do sentido moral infecta o próprio cotidiano, e a regra do engano muitas vezes tem uma aplicação sistêmica na pequena fraude, na sonegação fiscal, no interesse privado acima de tudo e na corrupção. Contudo, tentemos inverter essa deriva com uma nota final. Submetemo-nos à regra denunciada por Dickens porque perdemos o sentido não apenas de ética, mas também de generosidade, da gratuidade, da solidariedade, da doação e do perdão.
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