11 Dezembro 2025
Aprovada às pressas, a PEC 48/2023 reacende disputa sobre direitos territoriais e ameaça a proteção socioambiental garantida pela Constituição.
A reportagem é de Karina Pinheiro, publicada por ((o))eco, 10-12-2025.
A aprovação, em dois turnos, da PEC 48/2023 pelo Senado Federal, proposta que pretende constitucionalizar a tese do Marco Temporal e restringir o direito originário dos povos indígenas às suas terras, provocou reação imediata da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). Em posicionamento divulgado nesta quarta-feira (10), a organização classificou a decisão como um grave retrocesso jurídico, político e ambiental, e alertou para a intensificação de conflitos fundiários na Amazônia e em todo o país.
A votação acelerada, realizada sem diálogo com representantes indígenas, reacendeu um embate que o Supremo Tribunal Federal (STF) enfrentou ao declarar a tese do Marco Temporal inconstitucional. Para o STF, condicionar a demarcação à presença física de povos indígenas em 5 de outubro de 1988 ignora expulsões, violências e deslocamentos forçados historicamente impostos pelo próprio Estado brasileiro, por frentes de colonização, garimpo, desmatamento e grandes projetos econômicos.
Ao insistir na tese rejeitada pela Corte, o Senado cria, segundo a Coiab, um ambiente de insegurança jurídica que sabota três pilares centrais para a proteção socioambiental: o respeito à Constituição de 1988, a integridade dos procedimentos de demarcação e a proteção dos territórios mais preservados do país. A organização reforça que o texto constitucional reconhece os direitos territoriais dos povos indígenas como originários, isto é, anteriores ao Estado brasileiro, e não subordinados a qualquer marco temporal.
A Coiab também contesta a justificativa, defendida por parte dos senadores, de que a PEC aumentaria a “segurança jurídica”. O diagnóstico é o oposto: ao fragilizar demarcações e desconsiderar a jurisprudência consolidada do STF, a proposta tende a multiplicar conflitos em áreas já pressionadas pela grilagem, pelo garimpo e pela expansão de atividades econômicas irregulares. Para a organização, a instabilidade que se vê hoje decorre da omissão histórica do próprio Estado, que não cumpriu o prazo constitucional para regularizar territórios indígenas.
Em sua manifestação, a Coiab afirma que seguirá mobilizada para que a Câmara dos Deputados rejeite o que considera um ataque frontal aos direitos constitucionais dos povos originários. A organização reforça que a defesa dos territórios indígenas é inseparável da preservação das florestas, da proteção da biodiversidade e da segurança climática do país.
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