11 Dezembro 2025
"Os meios de comunicação, que sabem desempenhar papéis de grande relevância, como no caso das denúncias de abusos, às vezes se acomodam à preguiça de esquemas desgastados, renunciando ao aprofundamento e à investigação. Mas também as instituições eclesiais se revelam despreparadas e frágeis, incapazes de surfar a onda midiática e recolhidas num formalismo estéril."
O artigo é de Lorenzo Prezzi, teólogo italiano e padre dehoniano, publicado por Settimana News, 10-12-2025.
Eis o artigo.
Um caso de rebelião de três idosas freiras diante do convite para deixarem o seu mosteiro austríaco de Goldenstein está transbordando nos meios de comunicação alemães e internacionais, inclusive BBC e CNN: vídeos, podcasts, reportagens, livros e mais de 260 mil seguidores. Com alguma repercussão também na Itália. Um gesto de resistência e de desobediência transformou-se numa “série de TV”, levantando a pergunta se as freiras, de “vítimas”, não teriam sido transformadas em “figurantes”.
O papel performativo dos meios de comunicação, neste caso como em eventos semelhantes, soma-se à questão muito séria do encolhimento até quase o desaparecimento da presença da vida consagrada em vastas áreas da Europa.
Um fechamento problemático
Antes de tudo, os fatos. As freiras, Bernadette (88 anos), Regina (86) e Rita (81), pertencem às agostinianas que, por muitas décadas, administraram uma escola católica no castelo de Goldenstein (Salzburgo, Áustria). Entre as pequenas alunas esteve também a futura atriz Romy Schneider.
A redução no número de monjas motivou o fechamento da comunidade em 2022. A propriedade do imóvel passou para a arquidiocese de Salzburgo e para o mosteiro dos Cônegos Regulares Agostinianos Austríacos de Reichersberg, que garantiram a custódia do edifício e o cuidado das freiras presentes, enquanto a saúde delas permitisse autonomia.
A idade avançada e a internação hospitalar de uma delas levaram o prior do mosteiro a sugerir a transferência das freiras para uma residência da Caritas, não muito distante, equipada com assistência médica. Foi descartada a hipótese de outro mosteiro agostiniano, que exigiria mudança para o exterior. Mas as monjas, que voltaram a ser três, saem da casa de repouso e, com a ajuda de um chaveiro, trocam as fechaduras do edifício e, em setembro, retornam a morar em Goldenstein.
O retorno das monjas a Goldenstein
Neste ponto, a narrativa se divide. As freiras afirmam — ou permitem que se conte — que foram forçadas à internação na casa de repouso sem terem sido previamente informadas, e encontram apoio significativo em um grupo de moradores que lhes assegura assistência.
Por meio das redes sociais, que as monjas começam a usar com o apoio de voluntários, o curioso conflito intraeclesial amplia o consenso, as disputas e o interesse. Multiplicam-se os vídeos das freiras rezando, cozinhando, encontrando pessoas… colocando em dificuldade as razões do prior, Markus Grasl.
Como responsável pelo imóvel e superior das monjas, em razão de uma nomeação vaticana como comissário apostólico comum nessas circunstâncias, ele garante que houve diálogo prévio, que a transferência não foi compulsória e que as visitava todas as semanas para se assegurar de que tudo corria bem.
Além disso, anteriormente, havia sido proposta uma intervenção no edifício para remover barreiras arquitetônicas e permitir uma permanência mais longa, mas a proposta foi recusada. No momento em que pareceu que a capacidade de autogestão diminuía, então, segundo os acordos, ele teria acompanhado as monjas à nova residência.
Simpatizantes e manipuladores
Enquanto isso, os apoiadores garantem às “resistentes” alimentação, assistência médica, competência midiática, garantias jurídicas (advogados) e apoio do ambiente ao redor. As autoridades eclesiais advertem que a saída das monjas do quadro jurídico canônico implicaria para elas eventual responsabilidade em caso de quedas, imprevistos ou possíveis agravamentos de saúde.
Tratando-se de fatos internos à ordem, o bispo local, Franz Lackner (presidente da conferência episcopal), não está autorizado a intervir, mas declara-se disposto a ajudar se for solicitado. O vigário diocesano para a vida religiosa, Gottfried Laireiter, convida as duas partes ao diálogo, inclusive com mediações consideradas confiáveis.
O conflito, que não apresenta desdobramentos de orientações eclesiais opostas nem tentações cismáticas, parecia encaminhar-se a uma solução com a proposta do prior de aceitar a renovada presença das monjas em Goldenstein, restabelecendo a normalidade da vida consagrada: clausura, orientação espiritual, plena assistência médico-sanitária e a remoção das barreiras arquitetônicas do edifício.
Mas também com o pedido de sair do circo midiático, de renunciar à presença dos advogados e de assumir, no momento de uma progressiva invalidez, a aceitação de soluções externas de cuidado. As freiras, apoiadas por seu advogado, recusam porque a solução proposta constituiria uma “obrigação de silêncio”, limitaria a relação com os apoiadores, foi elaborada sem o parecer delas e não oferece garantias certas de permanência.
Neste ponto, o prior Grasl recorre ao dicastério vaticano, para onde, porém, também chega uma carta das freiras acusando-o de não ter dialogado com elas e pedindo sua substituição.
O “compimento”
A briga monástica não é tão rara assim. São conhecidos os casos espanhóis das freiras de Belorado (mais grave pelas implicações jurídicas e eclesiais) e das monjas de Maiorca, o italiano do mosteiro de Ravello, ou o suíço do mosteiro de Wonnenstein. Episódios que evidenciam uma questão importante: o desaparecimento da vida consagrada no Ocidente. O caso de Goldenstein acrescenta o papel imprevisto dos meios de comunicação.
A crise numérica atinge cerca de 1.300 congregações e ordens femininas de direito pontifício (assim como as famílias religiosas masculinas), mas sobretudo as congregações de direito diocesano que, em razão das cerca de 2.900 dioceses, são mais numerosas e nem todas são cadastradas em nível central. Aquelas localizadas no quadrante ocidental, mas também as de outros continentes ligadas a bispos individuais, têm um tempo de vida mais curto em comparação com as congregações de dimensão internacional e atravessam hoje uma fase muito difícil.
Quais são os sinais do que se chama de “compimento”? O número reduzido de membros, a ausência de estruturas de formação e de formadores, a dificuldade de encontrar superiores e figuras de liderança (ecônomos, superiores, supervisores…), graves desequilíbrios financeiros, fraturas internas insuperáveis… Conferências episcopais e representantes de religiosos e religiosas em nível nacional estão se mobilizando.
Elaboram-se diretrizes envolvendo tanto bispos quanto religiosos e religiosas, preparam-se grupos de intervenção para enfrentar casos individuais, propõe-se apoio externo de gestão econômica e pastoral às comunidades que já não conseguem mais fazê-lo sozinhas, colocam-se em ação visitantes e comissários pontifícios. Criam-se, assim, as condições para que o fim não aconteça ao acaso e não arraste consigo formas desagradáveis de agressão por parte de interesses patrimoniais externos. É emblemático o caso da Holanda, onde, de cerca de 170 congregações e mosteiros, prevê-se que, num futuro próximo, sobreviverão apenas cerca de trinta.
A Irmã Regina Pröls, consultora da Conferência dos religiosos e religiosas alemães, recorda que muitas congregações em fase de encerramento confiaram suas instituições a outros institutos ou grupos de fiéis, mas ressalta que isso só pode acontecer com base numa confiança recíproca entre os membros e as figuras externas. Assim acontece que mulheres casadas, formadas para essa tarefa, passem a dirigir comunidades femininas de consagradas, organizando os momentos de oração, as compras, o correio e as atividades administrativas.
No caso de um conflito obstinado, como em Goldenstein, as coisas tornam-se muito mais difíceis. Estão em jogo o respeito aos votos religiosos e a possibilidade de encontros diretos entre as partes. Irmã Katherina Drouvé, abadessa em Rüdesheim, está entre as consultoras em casos de fechamento de mosteiros e conventos. Ela recorda as perguntas recorrentes das religiosas diante dessa eventualidade: “Como nos manteremos no futuro? Como cuidaremos de nossas irmãs mais idosas? O que acontecerá no plano financeiro e jurídico? Quem guiará nossa comunidade?”. E lembra com sabedoria: “Quando nos abandonamos e cedemos o controle, temos mais tempo para o nosso carisma religioso”.
O carisma não é uma propriedade
No fundo da questão está o dom carismático. Ele pertence ao fundador e à família religiosa que ele promoveu? O carisma está, sim, ligado ao fundador e ao grupo inicial, mas “pertence” à Igreja. Nela ele nasce, cresce e se difunde. No momento em que a instituição que o interpretou chega ao seu compimento, o dom carismático permanece na Igreja e continua a alimentar sua vida, talvez sob outras formas e em outras famílias religiosas.
Um nó espiritual e teológico ilustrado pelo padre Luigi Nava (Vida consagrada, n. 3, 2024):
“Todo projeto fundacional encerra em si a promessa de Deus […]. O tempo da promessa marca a nossa história, e nele expressamos a gratidão pelo caminho percorrido. Num percurso de compimento, sentimo-nos devedores do dom por Ele concedido; e, em perspectiva, entregamos novamente à sua disponibilidade o nosso dom. Aqui está a graça do desprendimento: não somos donos do dom, nunca o fomos, e o próprio dom nos concede a liberdade de devolvê-lo ao Senhor. O compimento, portanto, encerra em si a promessa de Deus, o dom da sua fidelidade apesar e além do esgotamento dos nossos limites.”
João Paulo II assim se expressava em 1994:
“Dito isso, é necessário, porém, precisar que nenhuma forma particular de vida consagrada tem a certeza de uma duração perpétua. As comunidades religiosas individuais podem extinguir-se. Historicamente constata-se que algumas de fato desapareceram, assim como também desapareceram certas Igrejas particulares […] A garantia de duração perpétua até o fim do mundo, que foi dada à Igreja no seu conjunto, não é necessariamente concedida aos institutos religiosos individuais.”
Os “meios de comunicação” entre compromisso e preguiça
O caso Goldenstein faz emergir com força o papel que os meios de comunicação podem ter hoje quando o declínio de uma comunidade ou de uma família religiosa ocorre num contexto de conflito.
Numa entrevista à agência APA, a nova presidente da Conferência Austríaca das Ordens Religiosas declarou-se preocupada e surpresa com a ênfase midiática gerada pelo caso, com a apresentação de uma relação superior–monjas amplamente aproximada e distorcida. Irmã Christine Rod, secretária da mesma conferência, admite: “Vivemos numa época de encenação midiática que prospera ao exagerar o conflito e a unilateralidade”.
Ao papel dos meios de comunicação alude também o canonista Daniel Tipi: “Pergunto-me o quanto de toda essa operação foi realmente uma iniciativa das freiras e o quanto veio de fora. Sem esse apoio, provavelmente as monjas não teriam sido capazes de levar adiante a ação ou talvez nem sequer teriam considerado seriamente a ideia”.
Em certo momento, o prior Markus Grasl recorreu a uma agência de comunicação. O responsável por ela, Harald Schifft, observa:
“Acho bastante desconcertante que o mosteiro, o claustro, estejam se transformando num ‘parque de diversões’, com representantes da mídia entrando e saindo continuamente. Numa situação tão tensa, não há possibilidade alguma de chegar a argumentações razoáveis e de ser ouvido. No estado atual, um encontro pessoal é inútil. Precisamos da paz e da tranquilidade necessárias, longe dos holofotes da mídia, para podermos nos reaproximar. No momento, porém, o conflito continua a se ampliar cada vez mais por meio dos meios de comunicação.”
Os meios de comunicação, que sabem desempenhar papéis de grande relevância, como no caso das denúncias de abusos, às vezes se acomodam à preguiça de esquemas desgastados (instituições fortes contra indivíduos fracos), renunciando ao aprofundamento e à investigação. Mas também as instituições eclesiais se revelam despreparadas e frágeis, incapazes de surfar a onda midiática e recolhidas num formalismo estéril.
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