29 Outubro 2025
Da rejeição ao encontro. Da suspeita ao respeito. Da desconfiança à reconciliação. Há 60 anos, era publicada a Nostra Aetate, a declaração conciliar que reescreveu a relação da Igreja Católica com as demais religiões, na qual a comunidade eclesial não rejeita mais nada além "do que é verdadeiro e santo", afirma o texto. Do judaísmo ao islamismo, passando pelo hinduísmo e pelo budismo. "Uma virada imensa. E um documento cuja profecia permanece intacta em um tempo complexo como o nosso. Porque convida a uma autêntica fraternidade universal entre os povos e entre os crentes, que não é a eliminação das diferenças, mas um caminho rumo àquela harmonia trazida pelo Espírito", explica o arcebispo Flavio Pace.
A entrevista é de Giacomo Gambassi, publicada por Avvenire, 23-10-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Secretário do Dicastério para a Promoção da Unidade dos Cristãos, vice-presidente da Comissão para as Relações Religiosas com o Judaísmo, instituída por Paulo VI, o Papa cujo nome está ligado à Nostra Aetate. E é o órgão do Dicastério, do qual Pace é membro, que, juntamente com o Dicastério para o Diálogo Inter-religioso, organiza o evento no Vaticano para celebrar o aniversário da declaração resultante do Concílio Vaticano II.
Um evento internacional, com a presença de Leão XIV, aconteceu na Sala Paulo VI no dia 28 de outubro, dia em que Montini assinou o documento em 1965. O encontro de duas horas, com representantes das diversas religiões do mundo, vindas até mesmo de diferentes contextos geográficos", enfatiza o arcebispo Pace. Será exposto o texto original assinado por Paulo VI. "Em seguida, haverá alguns testemunhos. Depois, o Papa falará. E, finalmente, um gesto que pretende ser uma promessa para o futuro: a entrega das sementes doadas pelo Borgo Laudato si' de Castel Gandolfo que, por um lado, são um chamado para redescobrir as raízes daquele sentimento religioso que permeia toda a humanidade e, por outro, tornam-se um empenho para gerar frutos juntos." No dia seguinte, a audiência geral será inteiramente dedicada à Declaração Conciliar.
Eis a entrevista.
Vossa Excelência, Nostra Aetate é um texto revolucionário, em primeiro lugar no âmbito do judaísmo. Por quê?
O Documento nasceu justamente de uma reflexão sobre a relação da Igreja Católica com o povo e a religião judaica. Pioneiro foi o Cardeal Agostinho Bea. O Concílio havia optado por reler a história da comunidade eclesial, levando em conta o horror do Holocausto. Um "mysterium iniquitatis" que contribuiu para uma mudança de perspectiva na relação judaico-cristã, condicionada por séculos por preconceitos e interpretações bíblicas e teológicas enganosas. Enquanto durante os anos do Vaticano II a Europa católica se sentia compelida a rever sua relação com o judaísmo após os eventos da Segunda Guerra Mundial, as tensões em torno dos primeiros passos do Estado de Israel no contexto do Oriente Médio levaram a um discernimento mais aprofundado que permitiu que o documento fosse ampliado a outras religiões.
O que marca hoje o barômetro das relações entre a Igreja Católica e o judaísmo?
Alguns falam de um notável esfriamento com a guerra em Gaza. É um momento conturbado. Há tensões e dificuldades reais. No entanto, o caminho iniciado com o Concílio não foi interrompido. A atual transição da história deve ser considerada um tempo de regeneração e um estímulo para viver ainda mais profundamente as relações estabelecidas até aqui. O princípio do diálogo exige que nos coloquemos em recíproca escuta. Como cristãos, por exemplo, devemos entender o que significa para um judeu a relação com a terra: não é semelhante à nossa.
Por outro lado, o judaísmo de todas as tradições não deve ver como uma diminuição a referência da Igreja Católica aos princípios do direito internacional em suas relações com o Estado de Israel. Se pedirmos unicamente a escuta de um lado, acaba se exasperando um ponto de vista e nos tornaremos incapazes de comunicar.
O embaixador de Israel junto à Santa Sé, Yaron Sideman, sugere usar o aniversário da Nostra Aetate como uma oportunidade de reaproximação. Compartilha a ideia?
A carta que o Papa Leão enviou imediatamente após sua eleição, não apenas ao Rabino-Chefe de Roma, mas também a líderes judaicos internacionais, foi recebida com grande entusiasmo. Suas palavras simples, mas claras, sobre o legado da Nostra Aetate tocaram muitos. A declaração conciliar removeu qualquer desculpa para aqueles que poderiam se sentir justificados em ver o judeu como um inimigo, de acordo com teorias absurdas do passado. Por outro lado, a legitimidade da existência do Estado de Israel foi reconhecida pela Santa Sé, como demonstram as relações diplomáticas estabelecidas com o próprio Israel. Ao mesmo tempo, a Santa Sé reconheceu a Palestina e mantém relações diplomáticas com ela.
O Papa recentemente evocou o perigo do antissemitismo. Pode a Nostra Aetate ser um antídoto?
Como em todo texto do magistério, o ponto central da Nostra Aetate é a sua recepção, que não é simplesmente uma operação intelectual, mas sim de sedimentação dos seus conteúdos, chamados a entrar na vivência das comunidades. A Nostra Aetate pede-nos que redescubramos as raízes de Jesus, o Judeu, como raízes da promessa de Deus a Abraão, que agora se cumpre. E lembra-nos, como sublinha a Carta aos Romanos, que os dons e o chamamento de Deus são irrevogáveis.
Infelizmente, o antissemitismo é um veneno que volta a se disseminar novamente. Não podemos permanecer cegos. Objeções às políticas do Estado de Israel nunca podem resultar em ações ou palavras contra o povo da Aliança e a sua tradição religiosa. Isso me leva a afirmar que o que aconteceu na sinagoga de Manchester, na Grã-Bretanha, nada tem a ver com a crítica a um governo: é o assassinato de um homem por ser da fé judaica. Uma fé da qual também somos filhos. Pois, dizia Pio XI, espiritualmente somos todos semitas.
Um cristão que ignora o judaísmo corre o risco de viver uma fé decapitada.
Em que medida a Escritura é um ponto de encontro entre a Igreja Católica e o mundo judaico?
É interessante que a Nostra Aetate seja datada de 28 de outubro de 1965, enquanto em 18 de novembro do mesmo ano era promulgada a Dei Verbum, a Constituição Conciliar sobre a Revelação Divina. Assistimos a um caminho de valorização da Palavra na Igreja. Se São Jerônimo repetia que a ignorância das Escrituras é ignorância do próprio Cristo, não se pode faltar a consciência de todos aqueles mecanismos da tradição oral e de compreensão dos textos que derivam do judaísmo.
Além disso, há o capítulo Islã. Da Nostra Aetate ao Documento de Abu Dhabi sobre a Fraternidade Humana.
O Documento, que agora leva o nome da capital dos Emirados Árabes Unidos, onde foi assinado em 2019 pelo Papa Francisco e pelo Grande Imã de al-Azhar, o sunita Ahmad al-Tayyeb, atesta que os progressos resultantes da declaração conciliar afetaram não apenas o judaísmo, mas também a relação com o islamismo. O texto sobre a "fraternidade humana", expressão já contida na Nostra Aetate, é um marco que segue justamente a declaração do Vaticano II.
Mas deve gerar mais frutos. Alguns apontaram que o Documento de Abu Dhabi envolve apenas o islamismo sunita. Exceto o encontro do Papa Francisco com Ali al-Sistani durante sua viagem apostólica ao Iraque, ainda é necessário levar adiante, como o Cardeal Louis Sako frequentemente nos lembra, o diálogo com o mundo xiita. O diálogo não pode ser tecido apenas com o interlocutor que mais nos agrada e deve ir além das conotações políticas. Além disso, não pode ser apenas acadêmico, mas deve envolver as comunidades locais que talvez sejam as primeiras a experimentar a dificuldade do encontro.
O Papa Leão XIV reiterou que as religiões não devem ser "usadas como armas ou muros", mas "vividas como pontes".
Leão XIV é filho de Santo Agostinho, segundo o qual a raiz de todo diálogo está no coração humano. O Espírito nunca se fecha ao encontro e permite encontrar os sinais de Deus mesmo no outro que pode parecer distante. Onde o elemento religioso se torna uma bandeira ideológica, perde o contato com o coração do homem, que é o lugar onde o divino se manifesta.
Nostra Aetate é um convite à paz?
Certamente. O encontro entre as religiões é o encontro entre os povos. O Espírito não cria divisão, mas comunhão. E o diálogo, que continua sendo o eixo central da declaração conciliar, é o caminho para a paz.
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