Festa de Nossa Sra Aparecida – Maria, presença solidária que antecipa a hora da alegria messiânica

10 Outubro 2025

Na festa da mãe Aparecida vamos festejar, louvar, cantar e agradecer muito! O que podemos lembrar desta mãe? Como este texto nos ajuda a perceber o nosso papel na comunidade, em nossas casas, na sociedade? Com Maria mulher que nos inspira? Façamos também a experiência com o mesmo Deus de Maria na atualidade em que vivemos. Recuperemos o verdadeiro rosto de Deus, como aquele que é Deus das mulheres que são consideradas pequenas, das mulheres que são emudecidas, das mulheres que são oprimidas, das/os jovens, das crianças, dos nossos irmãos e irmãs excluídos/as! Tenhamos coragem para denunciar que falta muito vinho da alegria, da vida, do amor, da paz, da dignidade nas nossas vidas. Optemos por assumir novos caminhos. Caminhos que vão fazer história, e esta história vai incomodar, vai desinstalar, desconstruir os conceitos dos que acham que tem poderes.

A reflexão é de Amélia Hakme Romano. Ela é biblista leiga, facilitadora do CEBI-Mato Grosso do Sul, colaborando com escolas e grupos de estudos bíblicos.

Leituras do dia

Est 5,1b-2;7,2b-3
Sl 44(45),11-12a.12b-13.14-15a.15b-16 (R. 11.12a)
Ap 12,1.5.13a.15-16a
Jo 2,1-11 (Bodas de Caná)

Eis a reflexão.

Graça e Paz!

Na liturgia deste domingo em que celebramos a Solenidade de Nossa Senhora Aparecida, vamos meditar sobre o texto que descreve a festa das bodas em Caná da Galileia, que está no Evangelho de João 2,1-11.

Festa é tudo de bom! Festa de aniversário, de casamento, festa da padroeira, festa para as crianças, de natal. Tem festas que nos marcam tanto! Ficam em nossa memória, aquecendo o coração e se tomam um sentido cada vez mais profundo.

“Vinho melhor foi guardado
Pra hora que já soou
Novos céus e nova terra
Primavera começou”
(Zé Vicente)

O texto do Evangelho começa dizendo: “No terceiro dia!” (Jo 2,1).

Recordemos que o inicio do texto coloca o casamento no final de uma semana, três dias depois dos quatro mencionados no capítulo 1 (Jo 1,29; 35; 43). Estamos então no sétimo dia, o da plenitude, segundo a tradição judaica (Gn 1). Para o Evangelho de João, o sinal em Caná aponta para algo novo.

Poderíamos fazer um esquema assim:

1º dia: O testemunho de João Batista (1,19-28)
2º dia: Jesus se aproxima e é apresentado como “cordeiro de Deus “ (Jo 1,29-34)
3º dia: Chamado dos dois primeiros discípulos (um anônimo e André, depois Pedro) 1,35-42
4º dia: Chamado de Felipe e Natanael; e confissão de Natanael “és o Filho de Deus, o Rei de Israel” 1,43-51
No terceiro dia (2,1-12) A SEMANA SE COMPLETA

A primeira parte do Quarto Evangelho é comumente chamada “O Livro dos Sinais”, pois o evangelista relata uma série de sete sinais que, passo por passo, revelam quem é Jesus, e qual é a Sua missão. Embora algumas bíblias traduzem o termo grego que João usa por “milagre”, a tradução mais acertada é “Sinal”. O primeiro desses sinais aconteceu no contexto das bodas de Caná.

Jo 2,1-2: No Antigo Testamento, a festa de casamento era um símbolo do amor de Deus para com o seu povo. É numa festa assim, ao redor da família e da comunidade, que Jesus realiza o seu primeiro sinal. A mãe de Jesus estava na festa. No Reino de Deus a mulher não precisa ser convidada. Ela simboliza o Antigo Testamento. Jesus foi convidado, ele não faz parte do Antigo Testamento. Junto com seus discípulos ele é o novo que chega.

Jo 2,3-5: Acontece que no meio da festa, o vinho acaba! A mãe chega para o filho e diz: meu filho, eles não têm mais vinho!”. Este é um elemento típico do banquete messiânico e simboliza a abundância do banquete e a alegria da festa. Imaginem vocês terminar uma festa de casamento sem ter vinho! A mãe de Jesus faz a denúncia!

O vinho é sinônimo de alegria e não pode faltar numa festa de casamento. Nas núpcias o vinho é servido em abundância e junto com o trigo e o óleo constitui um dos três víveres essenciais da vida humana (Dt 7, 13; 11,14).

Jo 2,6-8: Maria percebe que não é possível que a festa continue. Ela se dá conta de que é preciso uma intervenção de seu filho e confia nele. Por isso ela disse aos que estavam servindo: – “Façam o que ele mandar”. Maria deseja que a festa continue.

Imaginemo-nos nesta festa, cheio de convidados vindos de diferentes lugares, diferentes povoados. Cada um e cada uma foi convidado para celebrar junto com o novo casal seu matrimônio, mas há uma situação irregular: falta vinho, falta alegria e essa ausência começa a ser percebida por algumas pessoas.

A ação vai de dar em torno dos jarros, que aparecem no v.6. Preste atenção como eles são apresentados com cuidado de detalhes, quantos são, de que são feitos. São em número de seis (número que indica imperfeição), são feitos de pedra, estão ali “deixados” meio que abandonados, servem para a purificação dos judeus, e contem cada um cerca de 100 litros. Percebe-se que são pesados, difíceis de ser utilizados. Este fato nos aponta para os abundantes rituais de purificação estabelecidos pela cultura religiosa da época, em relação aos quais havia muita insatisfação, sobretudo por parte dos pobres e muita mais das mulheres, principais vítimas da forma como estes códigos de leis muitas vezes era usado. Veja em Lc 7,36-50!

O simbolismo da água tornada vinho é também importante. Não era qualquer água – era a água da purificação dos judeus. Com essa história, João quer mostrar que doravante os ritos judaicos de purificação estão superados, pois a verdadeira purificação vem através de Jesus. Podemos entender isso como a mudança de uma prática religiosa baseada no medo do pecado, uma prática que excluía muita gente, para uma nova relação entre Deus e a humanidade, a partir de Jesus. Assim, em Caná, Jesus começa a substituir as práticas do judaísmo do Templo, algo que vai continuar ao longo do Evangelho de João.

Jo 2,9-10: A quantia do vinho chama a atenção – 600 litros! Onde antes havia água da purificação para os ritos dos judeus, agora há vinho novo e melhor! E a festa estava quase terminando! O vinho em abundância era símbolo dos tempos messiânicos, e, na tradição rabínica, a chegada do Messias seria marcada por uma colheita abundante de uvas. Assim João quer dizer que a expectativa messiânica se realiza em Jesus. As talhas transbordantes simbolizam a graça abundante que Jesus traz. O mordomo da Antiga Aliança, aquele, que devia saber a origem do vinho da festa, não sabia, enquanto os empregados, sim. Assim, o mestre-sala representa os chefes do Templo que não sabiam a origem de Jesus enquanto os diáconos representam os discípulos que acreditaram n’Ele.

Fazendo comparação entre o vinho antigo e o novo, João quer reconhecer que a Antiga Aliança era boa, mas a Nova a superou. Os ritos e práticas judaicos, ligados à purificação e ao sacrifício, não têm mais sentido, pois uma nova era de relacionamento entre a humanidade e Deus começou em Jesus.

De ter sobrado muito vinho! O que fizeram com a sobra? Recordo aqui uma fala de Frei Carlos Mesters: “estamos bebendo até hoje!”

Apesar de Maria não ser chamada pelo nome, a mãe de Jesus aparece duas vezes no Evangelho de João: no começo, nas bodas de Caná (Jo 2,1-5), e no fim, ao pé da cruz (Jo 19,25-27). Nos dois casos ela representa o Antigo Testamento que aguarda a chegada do Novo e, nos dois casos, contribui para que o Novo chegue. Maria é o elo entre o que havia antes e o que virá depois. Ao pé da cruz, é ela, a mãe de Jesus, que acolhe o “Discípulo Amado”. O Discípulo Amado é a comunidade que cresceu ao redor de Jesus, é o filho que nasceu do Antigo Testamento. A pedido de Jesus, o filho recebe a mãe em sua casa, o Novo Testamento recebe o Antigo. Os dois devem caminhar juntos, pois o Novo não se entende sem o Antigo. Se isso não acontecer, seria como uma casa sem fundamento. E o Antigo sem o Novo ficaria incompleto. Uma árvore sem fruto.

Na festa da mãe Aparecida vamos festejar, louvar, cantar e agradecer muito! O que podemos lembrar desta mãe? Como este texto nos ajuda a perceber o nosso papel na comunidade, em nossas casas, na sociedade? Com Maria mulher que nos inspira? Façamos também a experiência com o mesmo Deus de Maria na atualidade em que vivemos. Recuperemos o verdadeiro rosto de Deus, como aquele que é Deus das mulheres que são consideradas pequenas, das mulheres que são emudecidas, das mulheres que são oprimidas, das/os jovens, das crianças, dos nossos irmãos e irmãs excluídos/as! Tenhamos coragem para denunciar que falta muito vinho da alegria, da vida, do amor, da paz, da dignidade nas nossas vidas. Optemos por assumir novos caminhos. Caminhos que vão fazer história, e esta história vai incomodar, vai desinstalar, desconstruir os conceitos dos que acham que tem poderes.

Coragem! Força e fé!

Que assim seja hoje e sempre, Amém!

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