13 Setembro 2025
"O ídolo foi estilhaçado, voltou a ser apenas madeira, lascas e pó. Agora ele alimenta a terra novamente, não passa de fertilizante. Fertilizante para novas teorias, para novas estruturas".
O artigo é de Candela Antón, antropóloga e comunicadora científica, publicado por El Salto, 11-09-2025.
A teoria do gene egoísta orientou a visão da evolução por muitas décadas, um fetiche que até recentemente permaneceu intocável, que a antropóloga e comunicadora científica Candela Antón se propõe a desmascarar na primeira parte da seção "Destruindo Ídolos".
Eis o artigo.
Com este artigo, inauguramos a seção "Destruindo Ídolos", uma trincheira mensal contra mitos com pés de barro: pegamos um ídolo das humanidades (biológico ou social), o submetemos a um exame crítico e o desmascaramos com evidências sólidas. O objetivo: tornar o complexo compreensível e construir pontes entre a sociedade e a ciência, sem cortinas de fumaça ou dogmas.
Aqui estamos, e queremos cultivar um mundo diferente. Então, vamos começar a destruir ídolos.
De hoje: Richard Dawkins, biólogo evolucionista britânico. Não queremos derrubá-lo. Mas sim seu gene egoísta, sua teoria esculpida em 1976 de que "somos as máquinas de sobrevivência de nossos genes", um totem de madeira nobre, tão polido que quase se assemelha a pedra ou metal. Mas será que somos realmente isso?
A história do seu gene egoísta começa há alguns milhões de anos, no que ele chamou de "sopa primordial". Imagine a Terra jovem, uma espécie de sopa química gigante onde moléculas simples flutuavam sem rumo. De repente, Wham! Algo extraordinário acontece: algumas dessas moléculas desenvolvem uma habilidade quase mágica: a capacidade de fazer cópias exatas de si mesmas. Nasciam os replicadores.
Esses replicadores, precursores dos nossos genes modernos, não tinham cérebro nem intenções, mas tinham uma característica fundamental: alguns eram melhores em se copiar do que outros. E aconteceu que aqueles que eram melhores em se replicar começaram a dominar o jogo. Era uma competição acirrada, onde o vencedor era o mais eficiente em fazer cópias de si mesmo. O vencedor não era o mais forte ou o mais inteligente, como alguns pensavam. O ídolo estremece. A competição o constrói, o estrutura, o sustenta.
Portanto, para Dawkins, o gene nada mais é do que a unidade irredutível da seleção natural. Não são indivíduos, espécies ou ecossistemas que realmente competem nessa batalha evolutiva, mas sim os genes. Eis o cinzel com o qual Dawkins esculpiu seu ídolo: o gene é, em certo sentido, "imortal". À medida que você e eu envelhecemos e morremos, nossos genes saltam de corpo em corpo como eternos passageiros de um trem cujos vagões se renovam geração após geração.
Este gene imortal só quer uma coisa: sobreviver. Só isso. Nada de amor, nada de arte, nada de filosofia, nada de jogos de cartas, nada de dança de sábado à noite. Pura sobrevivência. E nós — você, eu e toda a humanidade em geral — como dissemos antes, "somos as máquinas de sobrevivência dos nossos genes".
Derrubando o ídolo
Vamos trabalhar. Vamos derrubar o ídolo. Primeiro puxão. A princípio, tímidos e ignorados, quase uma voz fraca ao longe. Lynn Margulis, bióloga americana, gritou ainda mais alto em 1970. Células eucarióticas provam que a cooperação é um mecanismo evolutivo! Embora, a princípio, ninguém tenha escutado.
A teoria recebeu um nome elegante em 1981: simbiogênese. Começou a se consolidar ainda mais profundamente. No fim, era uma questão de foco, de estrutura. O eucarioto moderno seria uma espécie de quimera. Um consórcio microbiano que se integrou de tal forma que se tornou uma entidade única. Isso demonstra que existem associações puramente cooperativas que resultam em evolução cooperativa.
O ídolo cambaleia, sua solidez aparentemente comprometida. A pátina da competição se rompe. Então a seleção natural não funciona apenas por meio da competição? Aparentemente não.
Mas isso não basta para derrubar o ídolo. É uma nuance, relevante, muito relevante, mas o gene continua sendo a unidade da herança evolutiva, e nós continuamos sendo suas máquinas de sobrevivência, meras mecas de carne descartável.
Ou talvez não? Agora tudo reverbera. É 2005, e Eva Jablonka e Marion Lamb irrompem em cena como uma debandada. Elas carregam um machado. Com uma lâmina tão afiada que parece cortar o próprio ar. O ídolo treme como uma folha em um vendaval. O machado é chamado de "teoria dos quatro níveis da herança".
1) DNA
Sim, ok, eles também o incluem. É inevitável. Mas eliminam a ideia de que apenas o gene carrega o peso imensurável da evolução. E sim, o DNA é inevitável; é a informação que é replicada, mas não é a única informação que é herdada. E muito menos todo o peso da hereditariedade ou da expressão recai sobre as costas curvadas do gene. Porque, diga-me, leitor ávido, quantas vezes você já ouviu ou leu que este ou aquele gene é responsável por isto ou aquilo? Provavelmente muitas, provavelmente tantas quanto eu.
Mas a realidade é muito mais complexa do que isso, pois uma única característica do nosso corpo pode ser moldada por um grupo de genes. Em outras palavras, na maioria das vezes, reduzir o poder a um único gene nada mais é do que uma maneira de importar filmes de faroeste para o mundo das moléculas. De repente, o ídolo parece menor do que era. Teria encolhido? Tenho certeza de que antes tinha uma envergadura maior, que sua sombra era mais longa.
Em suma, para rastrear a evolução no nível genético, pode ser mais útil focar nas mudanças nas redes de genes do que nos genes em si.
Uma melodia distante, fragmentos de uma partitura ancestral e antiga, se insinua na letra deste artigo. Jablonka e Lamb criam uma imagem vívida para ilustrar o segundo, o terceiro e o quarto níveis.
Imagine a herança como uma partitura. O DNA seria essa mesma partitura escrita: um sistema de notas cuidadosamente copiado geração após geração. Um erro ocasional aparece aqui e ali — um mutante descuidado que muda um acorde —, mas, no geral, a música permanece reconhecível, fiel ao original. É o que sempre nos disseram: que a única coisa que passa de pais para filhos é a partitura, o genoma, e que as interpretações, ou seja, o próprio fenótipo, a própria vida, desaparecem sem deixar vestígios.
Mas então surgiram os gravadores. Com eles, não só a partitura viajou, mas também as performances, com todo o seu contexto, estilo e improvisação. E, de repente, o legado deixou de ser monótono: não era mais apenas o código escrito que importava, mas também as maneiras como a música era tocada, transmitida e reinventada. Agora descobrimos os gravadores.
2) Epigenética
Aquela palavra imponente sussurrada em todos os lugares, mas cujo significado a maioria das pessoas desconhece. Significa que o ambiente modifica a forma como os genes se expressam. Significa que o estresse, a nutrição e as toxinas podem deixar rastros permanentes na prole. O machado balança de um lado para o outro. Com seu movimento, leves marcas aparecem no ídolo. Ele estremece.
3) Herança comportamental
Estamos em 1953. Uma jovem fêmea de macaco-de-Kōjima começa a lavar batatas-doces arenosas na água antes de comê-las. Mais tarde, seus parentes e outros indivíduos próximos começam a adotar esse comportamento. Mas o comportamento sofre mutações, é refinado e se ramifica em várias formas; por exemplo, em vez de se lavar no rio, ela se lava no mar. Esse tipo de tradição gera continuidade evolutiva sem a necessidade de alterações genéticas e influencia a adaptação e, em alguns casos, a especiação. Os pelos da nuca de Dawkins se arrepiam.
4) A herança simbólica
Esta pertence somente a nós. Humanos, sapiens sapiens. Baseia-se na linguagem e nos sistemas simbólicos. O totem começa a rachar e, de dentro, começam a emergir palavras em línguas antigas, línguas incompreensíveis que deixaram de ser faladas há milênios. Aí vem o golpe de misericórdia, o golpe final, o baque final. Porque, uma vez que a informação pode ser representada e transmitida por meio de palavras, escrita, números ou imagens, a evolução cultural adquire velocidade e complexidade sem precedentes. Este nível abre um novo reino de seleção e variação que transforma radicalmente a história de nossa espécie. A evolução não é mais meramente somática. Agora também é cultural.
Uau!
A folha cai. Impiedosamente. E cai novamente. E mais um. Um último golpe. O ídolo foi estilhaçado, voltou a ser apenas madeira, lascas e pó. Agora ele alimenta a terra novamente, não passa de fertilizante. Fertilizante para novas teorias, para novas estruturas. Resta apenas um fragmento da inscrição grandiloquente: "Nós somos a sobrevivência". Seja lá o que isso signifique.
Parabéns. Derrubamos o primeiro ídolo. Que os outros caiam.
Nota
Esta é uma seção de divulgação científica que combina mecânica dramática com rigor científico. O objetivo é claro: tornar o complexo compreensível. Se o tema lhe interessa, não hesite em ler as fontes originais e treinar seu pensamento científico.
Referências
Dawkins, R. (2000). O gene egoísta. Barcelona: Salvat.
Jablonka, E., & Lamb, M.J. (2005). Evolução em Quatro Dimensões: Variação Genética, Epigenética, Comportamental e Simbólica na História da Vida. Cambridge, MA: MIT Press.
Margulis, L. (1970). Origem das Células Eucarióticas: Evidências e Implicações de Pesquisa para uma Teoria da Origem e Evolução das Células Microbianas, Vegetais e Animais na Terra Pré-Cambriana New Haven, CT: Yale University Press.
Margulis, L. (1981). Simbiose na Evolução Celular: A Vida e Seu Ambiente na Terra Primitiva. São Francisco: WH Freeman.
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