12 Agosto 2025
"Sejam ou não resultado de um genocídio, é preciso reiterar que esses massacres continuam sendo fruto de crimes gravíssimos contra a humanidade, ou crimes de guerra, cometidos sistematicamente, ainda por cima por tropas de um Estado que se afirma liberal-democrático", escreve Pasquale de Sena, em artigo publicado por Avvenire, 10-08-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Pasquale de Sena é professor de Direito Internacional e Direitos Humanos na Universidade Católica de Milão.
Há alguns dias, vem se travando uma discussão acalorada (basicamente nas páginas do jornal La Repubblica, mas não só) sobre se os massacres de civis atualmente em curso em Gaza se qualificam como genocídio. Todos agora já conhecem as posições de Grossman e Segre. Posições contrastantes sobre o assunto, mas essencialmente coincidentes por derivarem de um ponto de vista específico; a saber, o da pertença comum ao povo judeu daqueles que as expressaram. Não quero voltar a tratar delas aqui, embora, dada a enormidade do que já aconteceu e do que ainda se avizinha (com a anunciada retomada da ocupação militar da Faixa), fortes perplexidades se difundiram na opinião pública sobre a "utilidade" desse debate.
Mas será realmente inútil discutir esse problema hoje? E, mais ainda: é a isso que devemos nos limitar, ou os eventos em curso nos dizem algo mais amplo, para o qual também devemos voltar nossa atenção? Quando falamos de genocídio a propósito dos massacres em curso em Gaza, nunca devemos esquecer que esse crime foi invocado principalmente pelas vítimas civis, residentes na Faixa e por alguns movimentos palestinos independentes, não ligados ao Hamas. O termo é usado politicamente? Sim, concordo; mas de maneira semelhante ao que já aconteceu no passado, por vítimas civis de outros massacres, para chamar a atenção para sua situação.
Certamente, o uso do termo por movimentos políticos, não diretamente ligados às vítimas, tem sido mais amplo do que no passado. Não me parece, no entanto, que este último fenômeno seja simplesmente um sintoma de antissemitismo, ou melhor, de antijudaísmo. Pelo menos da minha perspectiva (como jurista), nele se expressa uma forma de denúncia da macroscópica insuficiência das posições tomadas pela comunidade internacional (entendida como comunidade interestatal) diante do macroscópico desvio das normas fundamentais do direito internacional da resposta de Israel aos crimes horríveis de 7 de outubro.
Mas o crime de genocídio continua sendo, em primeiro lugar, um conceito jurídico, vão me dizer. Aqui também, não há dúvida. Caberá à Corte Internacional de Justiça (CIJ), que está atualmente tratando do caso, determinar sua existência, em termos da responsabilidade de Israel como Estado. E terá que fazê-lo, ao contrário do que foi argumentado, de forma totalmente independente da possibilidade de comparação (ou não) da situação de Gaza com o Holocausto. Ou seja, em relação àquelas mesmas normas e princípios aplicados à tragédia de Ruanda e à de Srebrenica, e derivados da Convenção sobre o Genocídio de 1948, da qual 153 Estados são atualmente signatários.
Enquanto essas normas estiverem em vigor, elas serão aplicáveis a qualquer hipótese de genocídio, mesmo quando envolver apenas uma parcela de uma determinada população. Qualquer que seja a decisão da Corte, poderá, é claro, ser discutida, mas o precedente não é discutível. Nem o são as obrigações de prevenção que a Convenção impõe, vejam bem, até mesmo a Estados terceiros ao conflito, conforme esclarecido pela própria CIJ. Essas obrigações têm sido sistematicamente violadas por Israel, e há pesadas dúvidas sobre seu cumprimento por esses Estados (principalmente os europeus).
Portanto, se debater a qualificação dos massacres em curso não é inútil, também não é suficiente.
Sejam ou não resultado de um genocídio, é preciso reiterar que esses massacres continuam sendo fruto de crimes gravíssimos contra a humanidade, ou crimes de guerra, cometidos sistematicamente, ainda por cima por tropas de um Estado que se afirma liberal-democrático. E é preciso dizer, em alto e bom som, que tudo isso ocorreu, e está ocorrendo, em flagrante desrespeito à proibição – inderrogável - de cometer violações de direitos humanos fundamentais, mesmo que fosse em reação a violações de mesmo tipo, como os assassinatos em massa, a tomada (e retenção) de reféns ou mesmo o uso de escudos humanos pelo Hamas.
Em suma, a contribuição assim dada à desumanização de civis palestinos parece ser igual e oposta àquela resultante de atos de terrorismo contra civis israelenses. Isso também, infelizmente, deve ser visto pelo prisma do direito. Isso porque a proibição em questão nada mais é do que uma conquista fundamental do direito internacional contemporâneo. Limitar-se a declarações, evitar ações concretas, claras e inequívocas em oposição à deriva atual, significa contribuir para o desmantelamento, em sentido técnico, de tal conquista. Uma escolha equivocada e míope, cujas consequências poderiam nos afetar, mais cedo ou mais tarde.