02 Agosto 2025
"A presença cristã no mundo digital não é chamada a brilhar como uma insígnia, mas a arder como uma chama. Uma chama mansa e corajosa, que não busca a visibilidade, mas a verdade. Num mundo que chama de "criador" quem produz conteúdo para o mercado, são necessários hoje criadores de sentido, artesãos da esperança, narradores de futuro."
O artigo é de Antonio Spadaro, jesuíta e ex-diretor da revista La Civiltà Cattolica, publicado por Avvenire, 31-07-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
No cenário cada vez mais denso da comunicação digital, a figura do "criador" emergiu como um ponto crucial não apenas para o marketing, mas também para a cultura. Quem cria conteúdo não se limita a difundir mensagens, mas molda imaginários, orienta comportamentos e define linguagens. Nesse cenário, a mensagem cristã também é chamada a se confrontar com uma realidade que não pode mais ser considerada simplesmente uma ferramenta a ser usada, mas um ambiente cultural e antropológico a ser habitado em profundidade. Não se trata mais, portanto, de "usar bem as mídias sociais" para evangelizar, mas de compreender que o ambiente digital é um espaço teológico, uma esfera na qual se jogam as grandes questões da existência hoje. Como escreveu Bento XVI em 2013, em um de seus discursos mais lúcidos sobre o tema: "O ambiente digital não é um mundo paralelo ou puramente virtual, mas faz parte da realidade cotidiana de muitas pessoas, especialmente dos mais jovens".
Essa afirmação exige uma mudança conceitual: a web não é um "outro lugar" a ser colonizado com a mensagem cristã, mas um ambiente real a ser vivenciado com autenticidade e coerência. A internet não é um canal, mas um espaço relacional onde tomam forma sentimentos, solidões, feridas e esperanças.
Nesse contexto, a retórica da influência – que durante anos dominou o léxico da comunicação digital – dá lugar a um conceito mais exigente: a criação de sentido. O termo "criador", cada vez mais difundido hoje, refere-se não apenas a quem publica conteúdo, mas também a quem gera visões de mundo. Trata-se de uma virada significativa: o valor do conteúdo não está mais vinculado apenas à sua capacidade de "funcionar", mas à sua origem e à sua destinação humana. Não basta mais mudar opiniões: é preciso ativar a imaginação coletiva, gerar experiências transformadoras. O Papa Francisco, dirigindo-se aos artistas, expressou claramente essa exigência: "Tenham a coragem de sonhar novas versões do mundo". Essa indicação, embora não seja explicitamente pensada para os criadores digitais, também pode ser aplicado ao seu papel: não se limitar a reproduzir o que já foi dito, mas propor narrativas capazes de abrir o futuro, de preservar a complexidade e de resistir à simplificação agressiva das plataformas.
No mundo das mídias sociais, onde tudo é medido, registrado e otimizado, emerge um paradoxo: o algoritmo sabe tudo sobre o comportamento, mas nada sobre a verdade interior. Ele pode prever cliques e tempos de permanência, mas não consegue captar o que move o espírito humano. No entanto, o risco é que mesmo quem se comunica esqueça essa distinção e se deixe definir apenas pelas métricas. Nesse sentido, as palavras do Papa Francisco na encíclica Dilexit nos proporcionam um respaldo fundamental: "Na era da inteligência artificial, não podemos esquecer que a poesia e o amor são necessários para salvar o humano.... o ordinário-extraordinário, nunca poderão estar entre os algoritmos".
A fé, por ser relação viva, não se deixa reduzir a um sistema de indicadores de desempenho. O conteúdo realmente evangélico não nasce de um calendário editorial, mas de uma experiência de sentido que arde por dentro e não pode ser silenciada. O fogo – não a visibilidade – é o verdadeiro critério. Um post, um vídeo, um gesto comunicativo tornam-se significativo não porque viralizam, mas porque habitados por uma verdade que questiona.
Às vezes, corre-se até o risco de pensar que um post funciona se for cheio de força ou mesmo, de alguma forma, sexy ao masculino ou feminino, com um apelo de pose. Não existe um “physique du rôle” católico. E a ostentação do poder própria da atração, em qualquer forma que esteja, corre sempre o risco de ser sedutor e, assim, nulificar a própria mensagem que pretende comunicar, mesmo que em boa-fé.
Soma-se a isso outro perigo: a crescente tendência à hiperpersonalização dos conteúdos, que encerra cada um numa bolha algorítmica. A informação torna-se espelho, não janela. Vemos apenas conteúdos afins, opiniões semelhantes, visões familiares. O resultado é uma perda progressiva do sentido de alteridade, que se torna não um interlocutor, mas uma ameaça. E assim o adversário, na dialética pública, transforma-se num inimigo. A comunicação — mesmo a comunicação religiosa — corre então o risco de se tornar um instrumento de exclusão em vez de comunhão.
As palavras de Francisco, proferidas de improviso em um encontro com os bispos da América Central, soam como um alarme cultural: "Estou preocupado com a forma como a compaixão perdeu sua centralidade na Igreja. Até mesmo grupos católicos a perderam, ou... a estão perdendo, para não ser pessimista. Também nos meios de comunicação católicos: a compaixão não existe. Há estigma, condenação, maldade, denúncia de heresia..." A comunicação da fé não pode ser centrada na vigilância doutrinária ou na denúncia moralista. Sem compaixão, a mensagem cristã corre o risco de se tornar irreconhecível.
O Papa Leão XIV também caminha nessa direção, levantando com força a questão da qualidade da linguagem e da cultura da comunicação em seu primeiro encontro com os jornalistas: "Hoje, um dos desafios mais importantes é promover uma forma de comunicação capaz de nos tirar da 'Torre de Babel' em que às vezes nos encontramos, da confusão de linguagens sem amor, muitas vezes ideológica ou tendenciosa. Portanto, o seu serviço, com as palavras que vocês usam e o estilo que adotam, é importante. A comunicação, de fato, não é apenas a transmissão de informações, mas a criação de uma cultura, de ambientes humanos e digitais que se tornam espaços de diálogo e discussão."
O ambiente digital, portanto, não é apenas uma questão de conteúdos, mas um ambiente relacional. O objetivo não é construir uma base de fãs, mas gerar fraternidade. Não servem conteúdo "de efeito", mas sim conteúdo capaz de ferir no sentido evangélico do termo, de demover, de interpelar. E, em alguns casos, até mesmo de ficar calados. Porque, numa época de reações contínuas, o silêncio pode ser revolucionário.
Por fim, resta uma palavra que sintetiza toda a questão: fogo. Numa cultura que premia as luzes artificiais, os flashes e os filtros, o que realmente transforma não é o que brilha, mas o que arde. Não serve parecer radiantes, mas ser capazes de gerar calor, orientação, esperança. O fogo, ao contrário da luz artificial, não apenas ilumina: aquece, consome, purifica e guia.
A presença cristã no mundo digital não é chamada a brilhar como uma insígnia, mas a arder como uma chama. Uma chama mansa e corajosa, que não busca a visibilidade, mas a verdade. Num mundo que chama de "criador" quem produz conteúdo para o mercado, são necessários hoje criadores de sentido, artesãos da esperança, narradores de futuro.