01 Agosto 2025
Nota técnica encaminhada pelo Ministério Público Federal (MPF) ao Palácio do Planalto defende o veto a mais de 30 dispositivos do Projeto de Lei nº 2.159/2021, vulgo “PL da Devastação”. Segundo o órgão, a proposta aprovada pelo Congresso Nacional inclui dispositivos que comprometem a proteção do meio ambiente e violam preceitos constitucionais e tratados internacionais.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 31-07-2025.
O MPF questiona por exemplo a criação de modalidades permissivas de licenciamento, como o autolicenciamento e a Licença Ambiental Especial (LAE), que permitiriam a aprovação de empreendimentos de grande impacto socioambiental com base apenas em declarações dos próprios interessados, sem análise prévia de órgãos técnicos.
“Embora apresentado sob o pretexto de modernizar e conferir celeridade ao licenciamento ambiental, o texto aprovado contém dispositivos que, na prática, promovem o desmonte de um dos mais importantes instrumentos da política ambiental brasileira e da defesa dos Direitos Humanos”, afirma o documento.
Outro ponto crítico levantado na nota técnica é a exclusão de órgãos como a FUNAI no processo de licenciamento de obras que afetem territórios tradicionais não homologados. Segundo o MPF, o Supremo Tribunal Federal (STF) já reconheceu os direitos territoriais dos Povos Indígenas e de Quilombolas como originários e independentes de conclusão formal dos processos administrativos.
O PL da Devastação dificulta a análise dos impactos indiretos de grandes obras sobre essas comunidades, contrariando o princípio da precaução e o direito à consulta prévia, livre e informada, previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Caso sancionado, o PL da Devastação excluirá 121 Terras Indígenas da Amazônia Legal (26% do total da região) de zonas de proteção no entorno de grandes obras, informa o InfoAmazonia. Assim, as comunidades potencialmente afetadas por empreendimentos em seu entorno não terão mais voz no processo de licenciamento ambiental. “O projeto de lei está fazendo com que o licenciamento não enxergue essas comunidades”, pontuou Alberto Fonseca, professor da Universidade Federal de Ouro Preto.
A manifestação do MPF acontece enquanto o governo federal avalia eventuais vetos ao PL. Enquanto ambientalistas, cientistas e, agora, procuradores da República pedem a Lula o veto da maior parte ou da totalidade do projeto, setores ligados ao agronegócio e à mineração defendem vetos mais pontuais e limitados.
O site de notícias Sumaúma abordou a mobilização da sociedade civil contra o projeto e a expectativa em torno da decisão de Lula, prevista para acontecer até o dia 8. Além da pressão sobre o presidente, as organizações também estudam barrar o PL na Justiça caso o veto não aconteça ou seja derrubado pelo Congresso.
Correio Braziliense, CNN Brasil, Folha, Metrópoles, O Globo, SBT e VEJA, entre outros, repercutiram a nota técnica do MPF contra o PL da Devastação.
O desmantelamento do licenciamento ambiental promovido pelo Congresso Nacional mostrou como o Legislativo parece indiferente ao bem comum da população brasileira e às responsabilidades do Brasil como anfitrião da COP30. Em artigo no Valor, os cientistas Thelma Krug (ex-vice-presidente do IPCC), Paulo Artaxo (professor da USP e integrante do IPCC), Moacyr Araújo (vice-reitor da UFPE), Jean Ometto (pesquisador do INPE e membro do IPCC), Bráulio Borges (pesquisador do IBRE/FGV), Roberto Kishinami (especialista do iCS), Eduardo Assad (FGV Agro) e Paulo Saldiva (professor da USP) classificaram o PL da Devastação como um grande retrocesso não apenas para a proteção ambiental, mas também com implicações imediatas à economia e à competitividade econômica do país. “O projeto de lei aprovado pelo Senado retrocede mais de 40 anos de construção da legislação que criou o Sistema Nacional de Meio Ambiente e o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, e inúmeros outros avanços que puseram o Brasil na vanguarda da proteção ambiental”, afirmaram.