31 Julho 2025
Apesar da confirmação da tarifa americana de 50% sobre produtos importados do Brasil, as centenas de exceções e o adiamento da aplicação da taxa para a próxima quarta-feira (6/8) aliviaram a tensão dos produtores brasileiros. No entendimento dos especialistas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico, trata-se de um recuo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, o que abre margem para alguma negociação. Mas isso não impede que a medida seja levada para discussão na Organização Mundial do Comércio (OMC).
A reportagem é de Rafael Neves, Rafa Santos e Mateus Mello, publicada pela revista Consultor Jurídico, 30-07-2025.
Nesta quarta-feira (30/7), Trump assinou uma ordem executiva que oficializou o “tarifaço” anunciado no dia 9. Com previsão inicial de entrar em vigor nesta sexta-feira (1º/8), a taxação foi apresentada como resposta a uma suposta perseguição ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e a alegadas “ordens de censura secretas e ilegais” do Supremo Tribunal Federal contra empresas de tecnologia americanas.
A ordem executiva desta quarta voltou a atacar o Judiciário brasileiro, mas incluiu a isenção para produtos como suco de laranja, castanha-do-pará, mica, minério de ferro, prata, ouro, amianto, carvão, celulose, fertilizantes, cera e produtos da aviação civil (pneus, motores e peças). Ao todo, 694 produtos do Brasil ficaram fora da lista.
Para Carlos Augusto Daniel Neto, sócio do escritório Daniel e Diniz Advogados, a decisão de Trump mostra que o bolso pesou, ainda que o republicano tenha mantido o tom de interferência na Justiça brasileira.
“As exceções estabelecidas contribuem para diminuir a temperatura entre os dois países, pois contemplam diversos produtos importantes do comércio Brasil-EUA. A decisão do governo americano sinaliza à racionalidade econômica mais do que aos interesses políticos da medida.”
O mesmo entendimento tem o advogado tributarista e professor de Direito Tributário Breno Dias de Paula.
“O adiamento da aplicação das sobretaxas e a concessão de exceções a determinados produtos brasileiros (especialmente aço, alumínio e produtos agrícolas) têm um efeito imediato: dão margem à diplomacia e ao diálogo comercial, reduzindo a necessidade de o Brasil recorrer de imediato a mecanismos formais de disputa, como o Sistema de Solução de Controvérsias da OMC.”
“Houve um movimento de flexibilização na disputa comercial, sinalizando abertura ao diálogo e à negociação bilateral. Do ponto de vista do Direito Internacional, essa postura reduz, ao menos por ora, a necessidade de judicialização”, concorda o especialista em Direito Aduaneiro Augusto Fauvel.
Embora as exceções e o adiamento colaborem para acalmar os ânimos, as justificativas para a nova tarifa ainda dão margem para a judicialização do caso. Morvan Meirelles Costa Junior, sócio do escritório Meirelles Costa Advogados, entende a ordem executiva como uma confirmação de que a tarifa extra é, sobretudo, ideológica.
“O governo brasileiro pode estar incentivado a ir em frente com uma eventual disputa na OMC justamente para marcar a posição ideológica contra o que representa Trump, que é alguém da extrema direita que está tentando, no fundo, influenciar a eleição do ano que vem no Brasil”, observou ele.
Sócio do Daniel e Diniz Advogados, o advogado aduaneirista Leonardo Branco ressalta que os setores que não foram beneficiados com as exceções podem tentar influenciar o governo a ir por esse caminho.
“A expectativa de violação das regras do comércio internacional, sozinha, já pode ser entendida como um elemento suficiente para a abertura de consultas perante a OMC. Setores que forem prejudicados podem acionar o governo para recorrer a ela.”
O professor universitário Otávio Venturini, doutor e mestre em Direito e Desenvolvimento, observa que há também a possibilidade de acionamento da Justiça dos Estados Unidos, com a discussão girando em torno da “legitimidade da motivação do decreto e da possível extrapolação dos poderes legais, em especial os conferidos pela Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional (IEEPA) ao presidente americano”.
Saulo Stefanone Alle, especialista em Direito Internacional, concorda com Venturini e defende que isso seja levado em conta pelas autoridades que estão tentando negociar saídas menos danosas para o arroubo autoritário do chefe do Executivo americano.
“A definição formal dos setores afetados pelo ‘tarifaço’ determina o objeto de uma eventual tentativa de discussão perante a Justiça americana, e os setores efetivamente interessados e envolvidos. Quanto ao momento, isso deve ser avaliado no contexto da estratégia de negociação e gerenciamento da questão.”