01 Julho 2025
"...", escreve Francesca Mannocchi, jornalista e documentarista italiana, em artigo publicado por La Stampa, 27-06-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Na manhã de ontem, o Ministro da Segurança Nacional israelense, Itamar Ben Gvir, membro da extrema direita sionista, escreveu: "A ajuda humanitária que está entrando em Gaza é uma vergonha absoluta. O que é necessário em Gaza não é uma suspensão temporária da ajuda ‘humanitária’ mas uma suspensão total". Ele acusou o Hamas de assaltar a ajuda e controlar os alimentos na Faixa de Gaza e acrescentou: "Interromper a ajuda nos levará rapidamente à vitória". Não foi a primeira vez. Em 3 de março, em uma convenção de seu partido de extrema direita, Otzma Yehudit, ele disse: "O governo também deve ordenar o bombardeio dos estoques de ajudas que se acumularam em enormes quantidades em Gaza durante e antes do cessar-fogo, juntamente com um corte completo da eletricidade e da água". Outro ministro de extrema direita, o Ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, é o responsável, segundo relatos do Canal 12 israelense e do jornal Haaretz, pela decisão de Netanyahu, tomada há dois dias, de bloquear a ajuda humanitária à parte norte de Gaza. Smotrich é o mesmo ministro que, em março, em um discurso defendendo a estratégia israelense de destruição indiscriminada de Gaza, afirmou que o objetivo da guerra sempre foi "conquistar, limpar e permanecer" para que Gaza "seja desmantelada até torna-la irreconhecível" e que autorizariam a entrada de pouquíssima ajuda para "permitir que o mundo continue a fornecer proteção internacional a Israel. Estamos aniquilando tudo o que resta na Faixa". De acordo com os dois veículos de comunicação, Smotrich teria ameaçado deixar o governo após assistir a um vídeo mostrando indivíduos armados em caminhões de ajuda humanitária. Netanyahu e o Ministro da Defesa, Katz, pediram ao exército que preparasse um plano de ação em dois dias para impedir que o Hamas tomasse as ajudas, embora o próprio exército israelense afirme não poder confirmar se os homens armados nos caminhões são realmente membros do Hamas ou não.
Jornalistas palestinos em Gaza afirmam que os homens armados são seguranças enviados por famílias e tribos para proteger os caminhões contra saqueadores. Alguns vídeos e relatos vindos diretamente da Faixa de Gaza contradizem as informações do governo israelense.
Gennaro Giudetti, trabalhador humanitário em Gaza há meses, disse ontem ao La Stampa que, após uma longa espera, há poucos dias entraram de Kisufim - no centro da Faixa - 100 paletes de medicamentos, incluindo sangue e plasma, com destino a Deir el-Balah. Dos caminhões, os trabalhadores humanitários gritavam para as pessoas famintas que encontravam pelo caminho para não tocarem em nada e não assaltarem os caminhões, pois as caixas continham material destinado aos hospitais e, de fato, ao longo de todo o trajeto, as ajudas – escassas e insuficiente para as necessidades da população – nunca correram o risco de serem atacadas. Outro trabalhador humanitário, um palestino de Gaza, que trabalha para uma agência das Nações Unidas e pediu para falar anonimamente, contatado por telefone ontem, disse: "As pessoas assaltam os caminhões com estiletes ou facas de cozinha para tentar abrir os paletes e as caixas e pegar um pouco de farinha, mas não há um controle único, não há um único grupo armado em Gaza, não se pode estabelecer se alguém que para um caminhão pertence ao Hamas ou foi instruído pelo Hamas a fazê-lo. Talvez devêssemos primeiro nos perguntar por que os caminhões são assaltados. E a resposta é uma só: por causa da fome." O Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários alertou na quarta-feira que, apesar da retomada parcial da ajuda humanitária, a fome está aumentando em Gaza. E as distribuições, já escassas, continuam sendo alvo de violência. "O volume e o ritmo atuais das entregas continuam extremamente insuficientes." Em 22 de junho, os parceiros da ONU contavam apenas 200.000 refeições distribuídas diariamente em 45 cozinhas comunitárias, em comparação com mais de um milhão no final de abril. Isso representa uma queda de 80% em menos de dois meses. Israel continua a proibir às organizações humanitárias de realizar distribuições de forma independente, e todas as padarias apoiadas pela ONU permanecem fechadas. E a ajuda humanitária, tão fragmentada, está mais exposta a saques por centenas de milhares de pessoas famintas, e os números – divulgados diariamente por agências da ONU – são cada vez mais catastróficos. A Classificação Integrada da Segurança Alimentar (ICP), em maio, constatou que meio milhão de pessoas em Gaza enfrentam uma fome catastrófica e que 71.000 crianças e 17.000 mães precisarão de tratamento urgente para desnutrição aguda. Números que levaram as Nações Unidas a condenar na terça-feira o que chamaram de "militarização do alimento" por Israel em Gaza, classificando-a como um crime de guerra e instando seus militares a "pararem de atirar em pessoas que tentam obter comida".
A contagem regressiva dos hospitais:
"Essa manhã, liguei para nossa equipe em Gaza para verificar as condições de energia dos hospitais, ciente da crescente penúria de combustível necessário para os geradores que alimentam todas as formas de assistência vital. A resposta que recebi foi aterradora: sobram apenas quatro dias de combustível, depois tudo vai parar", disse Loris de Filippi, que recentemente deixou Gaza após nove meses na UNICEF e que compartilha com o La Stampa as informações das Nações Unidas que chegam diariamente da Faixa de Gaza. Um vídeo de dois dias atrás que ele compartilhou mostra o departamento de neonatologia do hospital al Helou: a eletricidade cai repentinamente por falta de combustível e os geradores só voltam a ligar após quarenta minutos. Um apagão na unidade de terapia intensiva neonatal matou uma recém-nascida que estava em uma incubadora com um ventilador que parou de funcionar. Os médicos tentaram reanimá-la, mas não havia nada a fazer. De acordo com as últimas atualizações compartilhadas por organizações que operam na Faixa de Gaza, em 26 de junho, restam apenas 140.000 litros de diesel no norte da Faixa e 272.052 litros no sul, as últimas reservas disponíveis para todos os setores essenciais: telecomunicações, distribuição de água, alimentação e, acima de tudo, saúde. Isso significa que, se não entrar mais nenhum combustível, em quatro dias as incubadoras, respiradores e bombas de oxigênio deixarão de funcionar e as ambulâncias que devem transportar os feridos para os hospitais ficarão paralisadas.