27 Junho 2025
O relatório anual do Mapbiomas estima que 156 mil quilômetros quadrados da floresta tropical brasileira foram afetados por incêndios intencionais.
A reportagem é de Naiara Galarraga Gortázar, publicada por El País, 24-06-2025.
Sabemos agora que o incêndio que devorou a América do Sul em setembro passado, justamente quando o Hemisfério Sul entrava na primavera, causou uma devastação histórica na Amazônia brasileira. Em 2024, incêndios intencionais queimaram mais áreas da maior floresta tropical do mundo do que em qualquer outro momento nos últimos 40 anos, segundo medições de satélite. As chamas queimaram exatamente 156 mil quilômetros quadrados de floresta tropical, de acordo com o relatório apresentado nesta terça-feira pelo Mapbiomas, entidade brasileira composta por universidades, ONGs e empresas de tecnologia. Isso é mais do que toda a Grécia. Segundo o Mapbiomas, essa explosão de incêndios na Amazônia se deve a incêndios intencionais para abrir novas pastagens, agravados por uma seca histórica e outros efeitos das mudanças climáticas.
Os incêndios na Amazônia representaram apenas metade dos sofridos pelo Brasil. Mas os danos podem ser graves ou muito graves. O relatório acrescenta que dois terços da área queimada no país nessas quatro décadas eram de vegetação nativa, a mais resiliente e a que mais efetivamente contribui para mitigar o aquecimento global.
Especialistas frequentemente enfatizam que todos os incêndios sofridos pela Amazônia — uma área do tamanho da União Europeia e que abrange nove países — são resultado da ação humana. A vegetação ali, especialmente em suas áreas mais intactas, é tão densa e úmida que, mesmo que um raio durante uma tempestade cause um incêndio, ele geralmente se extingue antes de se espalhar.
Felipe Martenexen, pesquisador do Mapbiomas que coordenou a avaliação de incêndios na Amazônia, insiste neste ponto: este número recorde de incêndios "é resultado da ação humana, especialmente em um cenário agravado por dois anos consecutivos de seca severa", explica em nota da organização. "A combinação de vegetação altamente inflamável, baixa umidade e o uso do fogo [para converter áreas anteriormente florestadas em pastagens ou plantações] criou as condições perfeitas para a propagação de incêndios de grande porte, levando a um recorde histórico", acrescenta Martenexen. Os especialistas alertam para um desenvolvimento preocupante: incêndios que atingiram mais de 1 mil quilômetros quadrados.
Nunca desde 1985 a Amazônia sofreu perdas tão devastadoras devido a incêndios, de acordo com o Mapbiomas. A área devastada no ano passado é o dobro da média anual das últimas quatro décadas. Esta má notícia chega poucas semanas depois de o Brasil comemorar o fato de que o desmatamento na Amazônia caiu 17% (e no Brasil, 32%) em comparação com 2023, também de acordo com as medições do Mapbiomas.
No ano passado, ambientalistas criticaram duramente o governo Luiz Inácio Lula da Silva e seus governadores por sua evidente falta de preparo para combater incêndios tão graves e generalizados, que atingiram quase 200 mil focos. A falta de recursos era gritante. O Brasil conseguiu mobilizar menos aeronaves e bombeiros do que o pequeno Portugal utilizou no mesmo dia.
O mundo está frequentemente atento ao desemprego ambiental no Brasil, já que o país abriga 60% da Amazônia, área crucial para a absorção de gases de efeito estufa e a mitigação das mudanças climáticas. E a atenção para a potência latino-americana se intensificará nos próximos meses, pois sediará a COP30, a cúpula da ONU sobre mudanças climáticas, em novembro. O evento será realizado pela primeira vez na Amazônia, especificamente na cidade de Belém, capital do Pará, um local no mínimo controverso, pois historicamente se destaca nacionalmente por suas altíssimas taxas de desmatamento.
O presidente Lula, que ao retornar ao poder em 2023 restabeleceu a política de proteção ambiental que caracterizou seu país, exceto durante a era negacionista do ultradireitista Jair Bolsonaro, quer que líderes mundiais, seus negociadores e ambientalistas ao redor do mundo observem de perto a região, com sua pobreza arraigada, logística complexa e desafios crônicos que impedem seu desenvolvimento. Eles querem ver em primeira mão a magnitude do desafio que o Brasil e o mundo enfrentam em seus esforços para proteger a floresta amazônica. É o terreno fértil onde o desmatamento ilegal, a mineração, a caça ilegal e a pesca floresceram por décadas, agora convertidos em atividades ilícitas em escala industrial, devastando a Amazônia.
O Mapbiomas destaca que os danos causados pelos incêndios também foram extremamente severos no Cerrado, outro bioma, especificamente na faixa considerada fronteira agrícola no sul da Amazônia.
A maior floresta tropical do mundo foi o epicentro dos incêndios no Brasil no ano passado, parte de uma onda de incêndios que também causou danos severos na Bolívia, Equador, Peru, Venezuela e Argentina. Os incêndios foram tão intensos que uma densa fumaça envolveu dezenas de cidades. Por dias ou semanas, era impossível ver o horizonte olhando pela janela. E os gases de efeito estufa atingiram níveis não vistos em 20 anos. Satélites do Serviço Europeu de Monitoramento da Atmosfera, Copernicus, detectaram uma língua de gás em forma de L atravessando a região.