18 Junho 2025
Um novo estudo científico mostra que o aditivo alimentar dióxido de titânio (TiO2), amplamente utilizado em produtos de consumo frequente, como doces, pães, sopas e cremes, tem a capacidade de alterar o sistema endócrino e a resposta hormonal aos alimentos, desregular os níveis de açúcar no sangue e causar diabetes, obesidade e outros problemas de saúde.
A reportagem é de Silvia Ribeiro, jornalista e pesquisadora uruguaia, publicada por CLAE, 14-06-2025. A tradução é do Cepat.
No estudo, liderado por pesquisadores da Universidade de Jiaxing Nanhu, na China, os autores destacam os efeitos prejudiciais das nanopartículas de dióxido de titânio como desreguladores endócrinos intestinais [1].
Os alimentos ultraprocessados geralmente apresentam esses efeitos prejudiciais sobre os hormônios que atuam na digestão, mas não há uma compreensão detalhada do porquê causam esse efeito. Esta nova pesquisa aponta possíveis vias de ação desses produtos, indicaram os autores ao jornal The Guardian [2].
O estudo foi baseado na comparação dos efeitos do aditivo na saúde intestinal de três grupos de ratos de laboratório: um grupo foi alimentado com nanopartículas de dióxido de titânio; outro grupo recebeu dióxido de titânio, mas em partículas maiores, e um terceiro grupo não o ingeriu.
O primeiro grupo de ratos alimentados com nanopartículas de TiO2 apresentou níveis significativamente baixos de vários tipos de hormônios intestinais que atuam na digestão, por exemplo, aqueles que dão ao organismo a sensação de saciedade, após a alimentação, e regulam os níveis de glicose. Esse mesmo grupo de roedores também apresentou níveis muito mais altos de glicose ou açúcar no sangue do que o segundo grupo, que foi alimentado com micropartículas, que, embora pequenas, são até 10.000 vezes maiores que as nanopartículas.
Os hormônios secretados pelas células enteroendócrinas no intestino desempenham um papel crítico na regulação da demanda por alimentos energéticos e na manutenção dos níveis de glicose. As nanopartículas de TiO2 interrompem o desenvolvimento dessas células e reduzem seu número. Essa deficiência está associada ao desenvolvimento de resistência à insulina e diabetes tipo 2 [3].
O dióxido de titânio é usado para clarear ou dar mais brilho à cor de vários produtos. Geralmente, é identificado como E171. É um aditivo ao qual se atribui toxicidade e uma lista de graves riscos à saúde, razão pela qual tem sido objeto de controvérsias sobre sua regulamentação e proibição, particularmente em sua formulação em nanopartículas. A União Europeia proibiu seu uso alimentar em 2022, após analisar relatórios que o identificaram como potencial neurotoxina, imunotoxina, causador de lesões intestinais e potencial dano genético.
Naquele ano, a Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar (EFSA, na sigla em inglês) concluiu que o dióxido de titânio não pode mais ser considerado seguro como aditivo alimentar, pois não é possível descartar a genotoxicidade após o consumo dessas partículas. A EFSA também observou que, embora a absorção de dióxido de titânio após a ingestão seja baixa, acumula-se no organismo.
No entanto, os Estados Unidos seguem permitindo o seu consumo e nem sequer é obrigatório informá-lo na lista de ingredientes.
Estima-se que esteja presente em 11.000 produtos naquele país, por exemplo, em marcas de guloseimas muito conhecidas. No México e em outros países da América Latina, é permitido em produtos alimentícios, entre outros. Este aditivo pode ser encontrado em laticínios, guloseimas, gomas de mascar, biscoitos, pães, chocolates, sopas, caldos e molhos comerciais, cremes e sorvetes, e também como revestimento para cápsulas de vitaminas ou produtos farmacêuticos, pastas de dente, protetores solares, cremes e diversos cosméticos.
Um estudo científico publicado em 2024 revisou relatórios de toxicidade e descobriu que o TiO2 em nanopartículas - que pode chegar ao organismo por via oral, dérmica ou intragástrica - acumula-se em diferentes órgãos do corpo: baço, trato digestivo, sistema nervoso central, fígado, rins, sistema reprodutivo e músculo cardíaco, onde pode formar aglomerados com potencial carcinogênico. As nanopartículas de TiO2 também podem atravessar a barreira hematoencefálica e provocar morte celular (apoptose) nos neurônios.
O estudo agora publicado adicionou a essa lista a interrupção de hormônios essenciais no intestino para o processo digestivo, ligada ao surgimento de obesidade, diabetes e problemas imunológicos.
O uso de TiO2 como aditivo aumentou notavelmente ao passar a ser formulado em nanopartículas, em parte porque desta forma deixou de ser branco, podendo ser transparente e conferir outras propriedades que a indústria considera atraentes para as vendas, mesmo que não contribuam em nada para a nutrição. Ser causa de diabetes e obesidade se soma a uma lista de riscos sumamente graves, o que deveria motivar sua proibição.
Também fica claro o grave déficit regulatório acerca da ingestão e exposição de nanopartículas de qualquer elemento, já que além da substância que as compõe, seu tamanho burla a barreira hematoencefálica e o sistema imunológico.
Notas
[1] https://doi.org/10.1016/j.fct.2025.115504).
[2] https://tinyurl.com/yhvmyf74).
[3] https://tinyurl.com/yhvmyf74.
[4] https://doi.org/10.1016/j.dwt.2024.10002).
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