07 Junho 2025
"É necessário valorizar o estilo de vida daqueles que conseguiram durante séculos conviver com a natureza, sem destruí-la. É preciso aprender a cuidar do meio ambiente, sabendo que este cuidado nos favorece com melhores condições de vida e saúde. Os povos das florestas têm muito a nos ensinar e podem oferecer o remédio para as crises climáticas e suas consequências" escreve Sandoval Alves Rocha, SJ.
Sandoval Alves Rocha é doutor em Ciências Sociais pela PUC-Rio, mestre em Ciências Sociais pela Unisinos/RS, bacharel em Teologia e bacharel em Filosofia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE, MG), membro da Companhia de Jesus (jesuíta), trabalha no Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (Sares), em Manaus.
A Constituição Federativa do Brasil declara no Artigo 225 que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Trata-se de uma determinação jurídica amplamente conhecida pelos brasileiros, mas infelizmente não cumprida.
A sociedade contemporânea pautada pelo principio da acumulação capitalista com viés individualista tem ignorado este direito fundamental, criando formas cada vez mais sofisticadas de devastação e desrespeito à natureza. A lista de agressões ao meio ambiente é longa e estamos nos acostumando com estes procedimentos destrutivos e suicidas. O texto jurídico frisa que o direito ao ambiente equilibrado impõe aos poderes públicos e à coletividade as obrigações de defender e preservá-lo, pensando não somente em nós, mas também nas gerações futuras.
Diante desta situação, faz-se necessário ampliar os esforços de conscientização da população através de uma educação ambiental responsável e eficiente. Os desastres climáticos que nos afetam mostram que ninguém pode se eximir desta obrigação de cuidar do meio ambiente, através de intervenções de diferentes impactos. Precisamos alterar o nosso modo de vida e para que isso aconteça é necessário realizar importantes mudanças na estrutura econômica e social, superando o individualismo, o instrumentalismo, o capitalismo predatório e o consumismo irresponsável.
É inaceitável que muitos atores políticos se utilizem do poder que possuem no executivo, no legislativo ou no judiciário para aprofundar o cenário de destruição que já nos afeta de forma tão letal. Recentemente o PL 2.159/2021, ou o PL da Devastação, que fragiliza o licenciamento ambiental, tem sido intensamente repudiado pela sociedade. Políticos ligados ao agronegócio, à agropecuária, à atividade madeireira e à mineração se mobilizam para viabilizar a aprovação deste projeto na Câmara dos Deputados, ensejando continuar seus planos de devastação ambiental.
54 senadores votaram a favor do Projeto da Devastação, realizando um retrocesso na legislação ambiental em uma época em que as crises climáticas se agravam e produzem milhares de vítimas no Brasil e no mundo. O PL 2.159/2021 simplifica as regras de licenciamento para obras; restringe a necessidade de realização de consulta prévia apenas para povos já titulados; permite a Licença por Adesão e Compromisso, possibilitando ao próprio empreendedor o direito de se auto licenciar, a partir do preenchimento de um formulário online.
Seguindo esta lógica destrutiva, a Secretaria de Meio Ambiente do Município de Manaus constrói um prédio para a sua sede, promovendo a devastação no Parque dos Bilhares, zona sul da capital amazonense. Fragmento do Parque dos Bilhares, que é lugar de lazer e convivência com a natureza, está ameaçado pela construção cuja estrutura prevê a matança de 135 árvores. O coletivo Salve o Parque dos Bilhares luta para que a construção seja interrompida e realizada em um local que não provoque deterioração do meio ambiente. Centenas de assinaturas são protocoladas nos órgãos ambientais, solicitando o cancelamento da obra.
Estas situações mostram a urgência de uma maior sensibilização ambiental na Amazônia e em todo o Brasil, começando pelos poderes públicos que passam a impressão de que trabalham contra o meio ambiente. Acabamos de realizar a 5ª Conferência do Meio Ambiente, onde houve propostas que implicam maior esforço de preservação e respeito para com a natureza, mas é notável o grande poder de um reduzido setor ruralista que busca manter os seus privilégios às custas da extinção da biodiversidade e do ambiente ecologicamente equilibrado.
É necessário valorizar o estilo de vida daqueles que conseguiram durante séculos conviver com a natureza, sem destruí-la. É preciso aprender a cuidar do meio ambiente, sabendo que este cuidado nos favorece com melhores condições de vida e saúde. Os povos das florestas têm muito a nos ensinar e podem oferecer o remédio para as crises climáticas e suas consequências.
Ao propor o Principio da Responsabilidade, Hans Jonas intuiu que a tecnologia não resolveria os nossos problemas, mas poderia torna-los ainda mais graves. Ao lado do avanço tecnológico é preciso um senso ético e o cuidado pelo outro, esteja ele próximo ou distante. Esta alteridade que desponta hoje é o meio ambiente que pede por socorro e ao qual não devemos virar o rosto sob o risco de nos desumanizar e perder o senso de responsabilidade e até de autopreservação. A meio Ambiente pede socorro por si e por nós, que parecemos perdidos.