27 Mai 2025
"Hoje, existe um risco real de que a guerra não seja mais percebida como um flagelo, mas como um mal necessário ou mesmo uma oportunidade", escreve Giovanni Ricchiuti, em artigo publicado por Vita Pastorale, junho de 2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Giovanni Ricchiuti é presidente da Pax Christi Itália e arcebispo emérito de Altamura - Gravina - Acquaviva delle Fonti.
Europeus, estadunidenses, japoneses, russos e outras nações envolvidas lembraram o fim da Segunda Guerra Mundial em maio de 1945, 80 anos depois daquele dia que permitiu vislumbrar um futuro de paz para o mundo. E, poucos meses depois, naquele mesmo ano, em 26 de junho, foi assinada a Carta da ONU, que começava com estas palavras de esperança: "Nós, os povos das nações unidas, resolvidos a preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que, por duas vezes, no espaço de nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade...".
Essa citação foi a referência do Congresso Pax Christi, concluído em 6 de abril passado, em Assis, na Pro Civitate Christiana, cujo tema era "Derrotar o flagelo da guerra". Na abertura do encontro, quis expressar, em nome dos cerca de 200 participantes do movimento, solidariedade e proximidade ao Arcebispo de Manfredonia-Vieste-San Giovanni Rotondo, Franco Moscone, pelas duras críticas recebidas após seu discurso denunciando a insensatez da guerra e dos gastos militares na Europa e o "genocídio" do povo palestino em Gaza.
Hoje, existe um risco real de que a guerra não seja mais percebida como um flagelo, mas como um mal necessário ou mesmo uma oportunidade. Lemos em muitos jornais nacionais afirmações como "...a opinião pública é influenciada pelas ações de minorias que trabalham para manter a Itália inerme, indefesa, e estão dispostas a colocar o país em rota de colisão com Estados europeus que não querem permanecer inermes.
Três correntes remam nessa direção. Há o irenismo católico, animado não apenas, segundo a tradição, pelos católicos pós-Dossetti. [...] É um trabalho árduo, mas alguém tem que fazê-lo: convencer nossos concidadãos de que, nos próximos anos, teremos que tentar defender as nossas vidas e as liberdades que desfrutamos junto com outros europeus."
E daí se seguem insultos aos "irenistas", crentes e não crentes, tachados de "iludidos", "pacifingidos", "fomentadores da paz", considerados "incapazes" de formar uma plataforma política com a qual discutir. É verdade, havia a palavra insistente, forte, ousada e corajosa de Francisco, como no discurso ao corpo diplomático em 8 de janeiro de 2024: “As guerras modernas já não se travam apenas em campos de batalha delimitados, nem dizem respeito apenas aos soldados [...] não há conflito que não acabe, de alguma forma, por atingir indiscriminadamente a população civil. Os acontecimentos na Ucrânia e em Gaza são uma prova evidente disso”.
Por outro lado, ouvimos continuamente outras intervenções de colunistas, políticos e jornalistas que intervêm para apoiar a escolha pelo rearmamento europeu, que prevê a possibilidade de mobilizar 800 bilhões de euros para despesas militares: “Só a corrida aos armamentos pode salvar a economia europeia. Um reforço militar maciço em toda a Europa poderia conseguir o que os governos não conseguiram fazer ao longo dos anos: dar um impulso a uma economia estagnada...”. E há também aqueles que, com descaramento, zombam daqueles que se manifestam contra a guerra: “Fora a guerra da história é o slogan mais idiota que já ouvi!”. Mas será que aqueles que se sentam no Parlamento Europeu, com exceção dos poucos que votaram contra a resolução belicista hipocritamente chamada de "defesa" e "segurança", ainda terão a coragem de falar sobre as "raízes cristãs" da Europa? Não seria mais coerente devolver a Oslo o Prêmio Nobel da Paz concedido à Europa em 10 de dezembro de 2012? Fortes ventos de guerra sopram e no ar, como escrevia Don Tonino Bello, sente-se o "cheiro de enxofre". E até mesmo falar de paz se torna suspeito, senão perigoso. Putin ameaça usar armas nucleares; Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, repete constantemente que "a ameaça de guerra pode não ser iminente, mas não é impossível". E o governo italiano, infelizmente, está trabalhando para alterar a lei 185/90 com emendas que tornariam a exportação de armas mais fácil e menos transparente.
Toda essa “mobilização” deve ser combatida e denunciada, como faz a campanha de pressão sobre os bancos armados: banchearmate.org e como a denunciámos ao Parlamento. Italiano, juntamente com a Ação Católica, Acli, Focolari, Associação João XXIII, Pax Christi, Agesci, Libera com os Evangelhos e, juntamente com a Rete italiana pace e disarmamento. “O desarmamento é antes de tudo um dever, o desarmamento é um dever moral!”, repetia frequentemente o Papa Francisco, que no passado 18 de março nos convidava a “desarmar as palavras, para desarmar as mentes e desarmar a Terra. Há uma grande necessidade de reflexão, de calma, de sentido de complexidade”. Um convite a sermos mulheres e homens “razoáveis” e não, como escrevia São João XXIII, “alheios à razão”.
Não faltam vozes dissidentes, muitos jornalistas ou ativistas não violentos, que pagam com a vida o seu serviço à verdade. Assim como o exemplo de muitos jovens objetores de consciência ao serviço militar na Ucrânia, Rússia, Israel e, certamente, onde existem outros conflitos para os quais devem ser abertos corredores humanitários para os acolher e dar-lhes assistência e proteção. Durante o período pascal, a saudação do Ressuscitado ressoou em nossas comunidades eclesiais, em toda a Igreja: "A paz esteja convosco"! Com a esperança de que nós, cristãos, muitas vezes silenciosos, amantes mais da "diplomacia" do que da "profecia", voltemos a "gritar" que, se queremos a paz, devemos preparar a paz!