Uma porta sempre aberta

Foto: Cathopic

01 Março 2024

A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo João 2,13-25 que corresponde ao 3º Domingo de Quaresma, ciclo B do Ano Litúrgico. O comentário é elaborado por Ana Maria Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.

Estava próxima a Páscoa dos judeus e Jesus subiu a Jerusalém. No Templo, encontrou os vendedores de bois, ovelhas e pombas e os cambistas que estavam aí sentados. Fez então um chicote de cordas e expulsou todos do Templo, junto com as ovelhas e os bois; espalhou as moedas e derrubou as mesas dos cambistas. E disse aos que vendiam pombas: “Tirai isso daqui! Não façais da casa de meu Pai uma casa de comércio!”. Seus discípulos lembraram-se, mais tarde, que a Escritura diz: “O zelo por tua casa me consumirá”. Então os judeus perguntaram a Jesus: “Que sinal nos mostras para agir assim?” Ele respondeu: “Destruí este Templo, e em três dias eu o levantarei”. Os judeus disseram: “Quarenta e seis anos foram precisos para a construção deste santuário e tu o levantarás em três dias?” Mas Jesus estava falando do Templo do seu corpo. Quando Jesus ressuscitou, os discípulos lembraram-se do que ele tinha dito e acreditaram na Escritura e na palavra dele. Jesus estava em Jerusalém durante a festa da Páscoa. Vendo os sinais que realizava, muitos creram no seu nome. Mas Jesus não lhes dava crédito, pois ele conhecia a todos; e não precisava do testemunho de ninguém acerca do ser humano, porque ele conhecia o homem por dentro.

O Evangelho deste domingo começa com a aproximação da Páscoa: "Estava próxima a Páscoa dos judeus". Desse modo, enquadra a narrativa que nos dá no contexto da festa mais importante para o povo judeu: a memória da Páscoa, a saída do Povo que era escravo sob o domínio do imperador do Egito e a posterior Aliança selada com Deus no Sinai e as orientações para mantê-la, conforme narrado na primeira leitura deste domingo no livro do Êxodo capítulo 20,1-17.

Jesus entra no templo e não encontra um espaço sagrado onde a fraternidade e a solidariedade nascidas do vínculo de amor com o Deus que disse: "Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirou da escravidão do Egito" (Êxodo 20,2). Pelo contrário, a história nos conta que "no Templo, ele encontrou os vendedores de madeira, ovos e lenha e os cambistas que estavam sentados ali". Jesus encontra um mercado onde o vínculo com Deus se tornou um negócio econômico que beneficia poucos e gera dependência naqueles que realmente buscam a Deus e precisam Dele. Suas palavras são duras, mas muito claras: "Não façais da casa de meu Pai uma casa de comércio”.

O Templo, construído com o esforço do povo por mais de quarenta anos, tornou-se um negócio onde reinam a mesquinhez, a exploração da fé simples e humilde do povo que deve pagar as despesas exigidas por aqueles que se consideram intermediários entre Deus e seu povo.

Lembremo-nos de que o evangelho de João foi escrito no fim do primeiro século, ou seja, vários anos após a destruição do templo. Possivelmente havia uma certa nostalgia no sentimento popular em relação àquele lugar sagrado ao qual as pessoas iam em peregrinação várias vezes por ano. Eram momentos sagrados, locais de encontro onde as pessoas compartilhavam sua fé, notícias e dificuldades - pessoais e comunitárias - e confiavam suas necessidades e esperanças ao Deus de Israel. Mas a essa fé popular foram acrescentados limites sociais progressivos e demandas econômicas que implicavam o empoderamento de alguns e a subjugação de outros. Alguns se beneficiavam dessa fé à custa do pagamento de animais, da troca de moedas e da adoração que se seguia. O Templo não era mais o local de oração e de encontro com o Deus que se revelou no Sinai, mas era um negócio, o "mercado da fé", onde a adoração a Deus era uma mera aparência aproveitada por alguns.

O texto nos mostra a total rejeição de Jesus a essa realidade: "Ele expulsou todos do Templo, juntamente com os ovos e a madeira; afastou as moedas e derrubou as mesas dos cambistas". Jesus se apresenta como o novo Templo onde habita o Deus da vida. Não se trata de um templo suntuoso, resplandecente de grandeza e magnitude, mas, ao contrário, o templo é o seu próprio corpo que morre na cruz e é perfurado por uma lança (cf. Jo 19,34).

Jesus é o templo onde Deus se faz presente. É necessário entrar nele para respirar seu próprio Espírito e ser habitado por ele. A porta de entrada para esse novo templo é a sua Páscoa, morte e ressurreição! É uma porta aberta que não tem preço, onde ninguém é excluído, mas para cada realidade humana, para cada pessoa, a porta está aberta para entrar.

Às vezes, favorecia-se um cristianismo baseado no sacrifício e na dor, deixando a alegria e a vida para o "além", ou seja, para depois da morte. Mas a cruz faz sentido à luz da Ressurreição e, como diz Paulo quando escreve à comunidade de Corinto: "anunciamos um Cristo crucificado, pedra de tropeço para os judeus, loucura para os pagãos, mas para os que são chamados, tanto judeus como gregos, um Cristo que é o poder e a sabedoria de Deus" (1 Cor 1,24).

Nesta caminhada rumo à Páscoa, somos convidados a nos perguntar: como essa porta que nos leva ao templo se apresenta em nossa vida hoje? Talvez seja por meio de uma realidade social que nos chama a nos aproximarmos dela, ou de alguém que está à beira do caminho por acreditar que não é digno de entrar no "templo", ou de alguém que está esperando uma palavra de vida e consolo. Quais são os sinais da presença de Jesus, morto e ressuscitado, que nos chamam a segui-lo e a comunicar sua vida em tantas situações de dor, desânimo e, em muitos casos, pessimismo?

Fazemos memória do objetivo geral da Campanha da Fraternidade 2024: “Despertar para o valor e a beleza da fraternidade humana, promovendo e fortalecendo os vínculos da amizade social, para que, em Jesus Cristo, a paz seja realidade entre todas as pessoas e povos” e deixamos que essas palavras façam eco na nossa vida e nosso redor.

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