Os silêncios e a escuta: traços do estilo Francisco

Esse estilo do Papa, a opção Francisco, é tema central de evento organizado pelo IHU

Foto: Vatican Media

Por: João Vitor Santos | 22 Março 2023

São muitas as análises desses dez anos de pontificado de Francisco. Mas, em comum, todas sinalizam para um estilo muito próprio do  pontífice romano. É um estilo pastor, com base muito sólida no que o Concílio Vaticano II fez decantar. Mas seria possível resumir o estilo de Francisco num só gesto? Talvez sim.

 

A frase acima é de uma das pessoas muito próximas a Francisco, que o acompanha em muitas audiências e encontros e que, talvez, personifica esse pontificado num só gesto: a escuta. A frase foi extraída de reportagem reproduzida pelo IHU, que mostra que momentos como este fazem parte do processo de tomada de decisão do papa.

E essa escuta, que Francisco demonstrou em inúmeras situações praticar tão bem, está no cerne do que ele parece querer deixar como marca de seu pontificado: a sinodalidade. Além de promover inúmeros sínodos, em muitos ainda gerando documentos importantes, como o Sínodo da Família, e poucos estudados como Amores laetitia, embora muito criticados, Francisco os anima para que não percam a centralidade da escuta.  

Sínodo Especial para a Amazônia é um dos exemplos. Nele, a Igreja se pôs a ouvir os povos da floresta. “As sínteses das diferentes escutas, consultas, seminários, assembleias e rodas de conversa das comunidades e grupos interessados dos nove países que fazem parte deste bioma somam mais de 1.500 páginas”, observa Paulo Suess em entrevista ao IHU, na qual trata do documento preparatório como parte do processo sinodal.

 

Claro deve estar que tudo isso gera oposição. Estamos diante das resistências domésticas. Porém, o próprio Francisco define o sínodo não como uma reunião de bispos, mas como um processo. Esses bispos ouvem o povo de suas dioceses e leva as reflexões sobre um determinado tema à Santa Sé. O problema é que a Igreja parece ter se esquecido desse modus operandi com origens no Vaticano II.

Como defende Massimo Faggioli, em artigo publicado pelo IHU, a sinodalidade do papa é uma escolha política. Assim, de novo, ele desacomoda toda estrutura eclesial e promove o Sínodo sobre a Sinodalidade, pondo toda a Igreja em saída e a pensar sobre si mesma. É um processo que não está fechado e que talvez nunca se feche.

 

Claramente, essa é uma opção de Francisco de como ser Igreja, um hospital de campanha que sai de si mesmo, ouve e acolhe, sendo capaz que rever seus próprios erros e, também, de se ver num mundo em transformação. Mas não só, pois essa opção consiste em fazer uma escolha pelos pobres, marginalizados, pelo planeta e todas as formas de vida, por uma economia que promova a vida e, essencialmente, uma opção pelo segmento de Cristo, a partir do que diz o Evangelho.

Armando Matteo, professor de Teologia Fundamental na Pontifícia Universidade Urbaniana e subsecretário adjunto do Dicastério para Doutrina da Fé, elabora melhor essa Opção Francisco como um conceito para que, ao menos, tentemos entender e acompanhar os movimentos do atual pontificado. No entanto, antes de nomear o conceito, é preciso senti-lo, “aceitar que estamos em uma mudança de época, que um certo modo de ser fiel acabou, que devemos encontrar juntos um modo diferente para sê-lo hoje. Absolutamente compartilhável”.

 

Em certa medida, é um modo diferente de ser Igreja. Como ser? Com Francisco, conforme pontua Matteo, essa é uma construção em que todos somos chamados a participar: 

“A opção de Francisco é a mais pertinente para dar um futuro ao cristianismo e um cristianismo para o futuro. E se o medo não é infundado, o antídoto para o medo não está longe de nós: é exatamente aquela disponibilidade ao gesto do sonho, com a qual começava a citação do Papa Francisco; ‘sonho com uma opção missionária capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo atual que à autopreservação'" (EG 27). 

  

Assim, nesses dez anos de pontificado, talvez essa Opção Francisco não seja somente uma questão de escolha, mas a possibilidade de resposta à crise da Igreja e do cristianismo aos impactos da transição epocal que caracteriza o mundo atual. E, para o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, mergulhar neste tema é fundamental. Por isso, ele está promovendo o ciclo de estudos: “Opção Francisco. A Igreja e a mudança epocal”.

A primeira conferência será em 18-30-2023, uma mesa de debates com mediação do Prof. Dr. Pedro A. Ribeiro de Oliveira, da coordenação Nacional do Movimento Fé e Política, tendo como debatedores o Prof. Dr. Eduardo Hoonaert, do Centro de Estudos em História da Igreja  – CEHILA, e o Prof. Dr. Paulo Suess,  do Conselho Indigenista Missionário – CIMI. As atividades, feitas por videoconferência, vão até o final do semestre. 

Acesse mais detalhes no site do IHU

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