Ajuda-me, Senhor!

Foto: Carlos Sueli / Flickr

14 Outubro 2022

 

Publicamos aqui o comentário do membro da comunidade São João Batista, Marcelo Zanotti, graduando dos cursos de História e Jornalismo da UNISINOS, sobre o Evangelho deste 29º Domingo do Tempo Comum, 16 de outubro de 2022 (Lucas 18,1-8).

 

Naquele tempo, Jesus contou aos discípulos uma parábola, para mostrar-lhes a necessidade de rezar sempre, e nunca desistir, dizendo:

"Numa cidade havia um juiz que não temia a Deus, e não respeitava homem algum. Na mesma cidade havia uma viúva, que vinha à procura do juiz, pedindo: ‘Faze-me justiça contra o meu adversário!’

Durante muito tempo, o juiz se recusou. Por fim, ele pensou: ‘Eu não temo a Deus, e não respeito homem algum. Mas esta viúva já me está aborrecendo. Vou fazer-lhe justiça, para que ela não venha a agredir-me!'

E o Senhor acrescentou: "Escutai o que diz este juiz injusto. E Deus, não fará justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele? Será que vai fazê-los esperar?

Eu vos digo que Deus lhes fará justiça bem depressa. Mas o Filho do homem, quando vier, será que ainda vai encontrar fé sobre a terra?"

(Lucas 18,1-8).

 

Muito tarde, Senhor, para calares, Tu falaste demais. Muito tarde para te renderes, combateste demais. Além disso não foste sensato, avançaste demais, e isso tinha que acontecer, tinha de acontecer. Chamaste de raça de víboras a muita gente, disseste-lhe que o seu coração era um túmulo sombrio sob belas aparências. Beijaste os leprosos que caíam de podres e a estrangeiros vulgares dirigiste a palavra abertamente, à luz do sol. Comeste à mesa de pecadores notórios e disseste que as meretrizes, errando pelas ruas, seriam as primeiras a entrar no paraíso. Estavas bem entre os pobres, os imundos, os aleijados. Foste um péssimo cumpridor dos regulamentos religiosos atuais, pois quiseste até interpretar a Lei e reduzi-la a um mandamento só: Amar. E agora eles vingam-se, tramaram contra Ti, apelaram para as autoridades. E elas vão tomar providências. Serás crucificado. Bem sei, Senhor, que se eu tentar viver mais ou menos desse modo serei condenado. Tenho medo, já me apontam o dedo. Alguns sorriem, outros fazem graça, uns tantos chocam-se, e alguns dos meus amigos não tardarão a trair-me. Tenho medo de parar no meio do caminho. Tenho medo de escutar a sabedoria dos homens que murmura: "É preciso avançar devagarinho, nem tudo se há de tomar ao pé da letra, é bem melhor acomodar-se com o inimigo". E, no entanto, Senhor, sei que Tu és quem tem razão.

 

Tem duas orações antagônicas que gostaria mesmo de oferecer-Te no fim dessa minha pobre oração, duas coisas preciosas. Uma é do ateu Nietzsche. Nietzsche morreu louco. Ele era o próprio pensamento, o raciocínio mesmo e o processo de loucura dele foi uma coisa terrível, porque ele foi revertendo à primeira infância. E terminou incapaz das coisas mais simples, no colo da mãe. No auge desse processo morre-lhe a mãe. Ele vai pro colo da irmã, que era louca, casada com um major, veio a fundar uma colônia nazista no Paraguai e largou ele sozinho. Mas ele tinha uns insights de lucidez. Num desses, ele escreveu o seguinte: “Quem me dera ser mais sagaz. Quem me dera ser essencialmente sagaz. Como a serpente. Mas eu quero o impossível, porque eu quero que a minha sagacidade caminhe ao lado da minha lucidez. Mas um dia, quando a minha sagacidade for embora – Ah, como ela gosta de voar – possa então a minha lucidez caminhar ao lado da minha loucura.”

 

A outra é de Padre Antônio Vieira, que é uma lição de humildade. O padrão da minha vida. O meu mantra é: “Todo poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente.” Isso é uma experiência que nós podemos fazer aí com os poderosos de ocasião. O Padre Antônio Vieira, no sermão do 4º domingo da ascensão, ele sobe ao púlpito, ele era muito requisitado, os sermões dele eram populares. E todos esperando um sermão sobre o quarto domingo da ascensão, o Cristo como imagem. Ele sobe e diz assim: “A mim a imagem dos meus pecados me comove muito mais que essa imagem do Cristo crucificado. Diante dessa imagem do Cristo crucificado eu sou levado a ensoberbecer-me por ver o preço pelo qual Deus me comprou diante da imagem dos meus pecados é que eu me apequeno por ver o preço pelo qual eu me vendi. Por ver que Deus me compra com todo o seu sangue, eu sou levado a pensar que eu sou muito, que eu valho muito. Mas quando noto que eu me vendo pelos nadas do mundo, aí eu vejo que eu sou nada. Eu valho nada.”

 

Ajuda-me a lutar!

Ajuda-me a falar!

Ajuda-me a viver o teu evangelho, com justiça!

Até ao fim!

Até a loucura!

A loucura da Cruz!

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