Por: Jonas Jorge da Silva | 12 Abril 2022
O Brasil em um mundo interdependente, pressionado pela instabilidade advinda dos conflitos geopolíticos, a malversação de suas riquezas estratégicas e suas políticas de privilégio às exportações agrícolas em detrimento da soberania alimentar interna. Problemas que estão na ordem do dia e que exigem respostas heterodoxas para frear o canibalismo das elites dominantes.
No último dia 9 de abril, ao abordar o tema O Brasil na geopolítica da emergência socioambiental mundial, pela série de debates [online] Brasil: emergências socioambientais e horizontes políticos, Bruno Lima Rocha Beaklini, cientista político e professor de relações internacionais, criticou a subserviência da economia brasileira aos interesses do agronegócio, bem como a perversidade da especulação financeira na formação internacional do preço dos alimentos, no contexto da agricultura de alta performance.

Bruno Lima Rocha Beaklini, na atividade "O Brasil na geopolítica da emergência socioambiental mundial"
A iniciativa do CEPAT conta com a parceria e o apoio de diversas instituições: Instituto Humanitas Unisinos - IHU, Núcleo de Direitos Humanos da PUCPR, Conselho Nacional do Laicato do Brasil - CNLB, Observatório Nacional Luciano Mendes de Almeida – OLMA e Departamento de Ciências Sociais, da Universidade Estadual de Maringá.
Embora seja reconhecido como um dos celeiros do mundo e muito rico em recursos naturais, o Brasil é refém da política de internacionalização de sua produção primária. Junto a isso, também vive um processo contínuo de desindustrialização, cada vez mais alentado por uma política entreguista, que só intensificou sua perda da soberania e controle nacional sobre o complexo de óleo e gás, ficando ainda mais enfraquecido no âmbito internacional.
Para atacar esse problema, Beaklini considera que é indispensável uma posição soberana e independente do Brasil, reconhecendo que até mesmo no enfrentamento das questões socioambientais não se deve abrir mão do petróleo, mas, sim, subordiná-lo aos interesses da transição ecológica que deve ser realizada.
Também lembrou que tudo o que chega até a mesa dos brasileiros é impactado pela estrutura exportadora do país, que exige uma longa malha viária, transporte a diesel e importação de insumos, como é o caso dos fertilizantes, atualmente no centro dos debates por causa da deflagração da invasão russa à Ucrânia. Lamentavelmente, os custos do agronegócio, de sua dependência do petróleo e derivados à forma como são precificados nos sistemas internacionais, recaem sobre os ombros do cidadão comum.
Em contraposição a esse modelo, Beaklini avalia que a defesa dos territórios socioambientais brasileiros passa pelo zoneamento ambiental, os territórios de produção primária e a adoção de subsídios para a economia familiar camponesa. As chamadas hortas comunitárias, por exemplo, podem se tornar um exemplo de impacto no fortalecimento do poder de compra de alimentos nas cidades.
É preciso ir somando medidas de enfrentamento aos efeitos nocivos da economia dominante, com estratégias como a organização coletiva em regiões metropolitanas, o cultivo de sementes crioulas, a defesa dos mananciais e reservatórios e a luta por solos urbanos menos impermeáveis que os atuais, entre outras.

André Langer, do CEPAT, e Bruno Lima Rocha Beaklini na atividade "O Brasil na geopolítica da emergência socioambiental mundial"
Pensando em termos de agroecologia, com processos de produção livres de agrotóxicos e outros insumos químicos, o grande desafio está em estabelecer uma distribuição geográfica próxima, planejada, regionalizada. É isto o que pode garantir uma resistência às pressões do agronegócio, libertando a agricultura familiar camponesa do oneroso custo do transporte e das exigências de produção em larga escala, conforme a requerida para exportação.
Desde que adequadamente subsidiada, a produção agrícola familiar camponesa pode servir como um antídoto ao privilégio abusivo do agronegócio, que expõe a produção agrícola brasileira a uma enorme dependência de outros atores internacionais, gerando inflação nos preços dos alimentos, inclusive com riscos de escassez e desabastecimento interno.
Para Beaklini, a defesa dos biomas e territórios brasileiros é uma bandeira fundamental, que supera as hipócritas propagandas ambientais de agências e bancos internacionais. Em sua avaliação, quem verdadeiramente defende os biomas brasileiros são as populações que neles vivem, ainda que enfrentando contradições. A luta de povos originários e comunidades tradicionais em defesa de seu território representa a batalha em favor da humanidade em tempos de emergência climática.
Eis a íntegra da exposição e debate:
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Brasil, agronegócio e geopolítica - Instituto Humanitas Unisinos - IHU