Um Green Deal verde desbotado: a Europa exporta os danos ambientais para outros países, e a nova PAC vai na direção oposta

Mais Lidos

  • “A destruição das florestas não se deve apenas ao que comemos, mas também ao que vestimos”. Entrevista com Rubens Carvalho

    LER MAIS
  • Povos Indígenas em debate no IHU. Do extermínio à resistência!

    LER MAIS
  • “Quanto sangue palestino deve fluir para lavar a sua culpa pelo Holocausto?”, questiona Varoufakis

    LER MAIS

Revista ihu on-line

Zooliteratura. A virada animal e vegetal contra o antropocentrismo

Edição: 552

Leia mais

Modernismos. A fratura entre a modernidade artística e social no Brasil

Edição: 551

Leia mais

Metaverso. A experiência humana sob outros horizontes

Edição: 550

Leia mais

06 Novembro 2020

Em 11 de dezembro de 2019, a Comissão Europeia apresentou o Green Deal europeu, a agenda que vai garantir que a economia se coloque em linha com os acordos de Paris para conter o aumento das temperaturas em 2 graus.

A reportagem é de Mariella Bussolati, publicada por Business Insider, 05-11-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.

É também uma tentativa de garantir que os desafios para o clima e o meio ambiente se transformem em oportunidades de crescimento e não sejam limites. Foi um momento importante, um grande reconhecimento, há muito esperado. De fato, a filosofia apresentada não parece apenas uma fachada: é proposta uma nova forma de produção, circular, que corta as emissões, mas também os poluentes e respeita a biodiversidade. A meta, neutralidade climática até 2050, depois foi parcialmente revisada pela lei europeia sobre o clima, aprovada em 8 de outubro, que eleva em 60 % a meta de redução de emissões para 2030 e introduz um orçamento para os gases com efeito de estufa, a eliminação dos subsídios aos combustíveis fósseis até 2125.

Parece que a Europa esteja finalmente na vanguarda daqueles que tentam remediar uma situação que poderia revelar-se catastrófica. Parece que aqueles que governam finalmente entenderam os apelos dos cientistas.

O Green Deal europeu, no entanto, corre o risco de não ser tão verde quanto parece. Em artigo publicado na Nature, escrito por três pesquisadores do Karlsruhe Institute of Technology, na Alemanha, os autores revelam que, embora os Estados membros assumam ares de ambientalistas, na verdade estão exportando seus danos ambientais para outros países.

Alguns exemplos: a Europa importa 500 milhões de dólares de carne do Brasil todos os anos, a maior parte produzida em áreas desmatadas. Os organismos geneticamente modificados estão proibidos desde 1999. Não são produzidos na Europa, mas a soja e o milho são importados do Brasil, EUA e Canadá. O resultado é que 80% do gado italiano é alimentado com sementes OGM.

Os estudiosos defendem que as medidas ambiciosas do Green Deal parecem mais uma fachada, já que a União Europeia é altamente dependente das importações agrícolas: no mundo, só perde para a China. Isso permite produzir menos intensivamente dentro das fronteiras, mas depois obriga a importar de países que têm leis muito mais permissivas que as europeias.

Por outro lado, também emergem contradições dentro da Europa. Apesar do Green Deal, de fato, o Parlamento aprovou no final de outubro a nova PAC, a Política Agrícola Comum, que em dois anos irá substituir aquela lançada em 2013. Representa 34,5 por cento do orçamento europeu, portanto uma parte importante que deveria estar alinhada com as escolhas gerais.

No entanto, muitos denunciaram que as novas regras vão na direção contrária. Bird life International, uma organização britânica que protege os pássaros, declarou que a aprovação é uma espécie de beijo da morte. E foi acompanhada por muitos, de Greta Thunberg a Carola Rackete, que agora pedem a anulação das medidas votadas. O sistema de subsídios lançado com uma maxi emenda proposta por populares, social-democratas e liberais permitiria, de fato, que a maior parte do financiamento fosse enviada para as fazendas maiores, o número de fazendas está diminuindo, enquanto suas dimensões crescem. Também está em contraste com o plano contido no Green Deal Farm to fork, da fazenda para o garfo, que visa favorecer uma cadeia alimentar sustentável do início ao fim, reduzindo o desperdício de alimentos, reduzindo fertilizantes e pesticidas em 20 e 50 por cento, respectivamente, mantendo a fertilidade do solo e transformando 25 por cento das terras agrícolas em áreas para agricultura orgânica até 2030.

"A maioria dos subsídios agrícolas acaba apoiando a agricultura intensiva que já amplamente demonstrou ser prejudicial. Na Europa, 63 por cento da terra é usada para alimentar animais, não os seres humanos, e nem mesmo é suficiente, visto que somos obrigados a importar ração”, diz Federica Ferrario, responsável pelo setor da Campanha Agricultura do Greenpeace.

Apenas 20% do orçamento da PAC será destinado a apoiar políticas agrícolas que lutam contra a crise climática. Enquanto entre 28,5 e 32,6 bilhões de euros vão para o benefício da pecuária intensiva ou empresas que produzem alimentos para o gado. Isso representa 18-20 por cento do orçamento anual geral da UE para um setor, o da pecuária, que é responsável por 12-17% das emissões de gases de efeito estufa dos países da UE.

“Devido aos riscos de pandemias, devemos mudar profundamente a forma como produzimos alimentos e, em vez disso, nos encontramos mais uma vez incentivando o mesmo sistema que causa adoecimento de seres humanos, animais e meio ambiente. Apenas 6 por cento do financiamento vai para a agricultura de pequena escala, enquanto 60 por cento vai para quem tem mais hectares e mais animais, e desapareceu a emenda que fixava um teto para a densidade máxima de animais por hectare”, conclui Ferrario.

Assim como a CAP parece esquecer, o Green Deal não estabelece regras sobre o que é importado. Os estudiosos de Karlsruhe assinalam que há tentativas aqui e ali, mas falta um projeto orgânico. Existe uma regra de que o óleo de soja não deve vir de áreas desmatadas. No entanto, a Diretiva sobre a Energia Renovável ignora os desmatamentos anteriores a 2008 e as terras cultivadas agora são consideradas sustentáveis. Isso inclui 9 milhões de hectares da região amazônica que foram desmatados para atender à demanda europeia por sementes oleaginosas para alimentação de animais e biodiesel.

Na Europa, essas plantações são reduzidas, 90 por cento são importadas de 8 países e são principalmente soja e óleo de palma. Algumas empresas estabeleceram protocolos de certificação voluntária, mas são iniciativas privadas.

Os cientistas propõem, portanto, que a União Europeia mude a sua estratégia, reduzindo a sua dependência de países estrangeiros. Isso poderia ser conseguido com o melhoramento das variedades e o aumento da produtividade através da tecnologia Crispr, e com um uso diferenciado do solo graças às fazendas verticais e cultivo indoor.

Segundo eles, remodelar a produção agrícola ajudaria a tornar a Europa independente das flutuações do mercado global e, em geral, protegeria a todos dos efeitos de mudanças profundas que agridem o meio ambiente.

Leia mais

Comunicar erro

close

FECHAR

Comunicar erro.

Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

Um Green Deal verde desbotado: a Europa exporta os danos ambientais para outros países, e a nova PAC vai na direção oposta - Instituto Humanitas Unisinos - IHU