''O estrangeiro não existe.'' A atualidade de Martin Buber

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01 Julho 2014

Que atualidade ainda pode ter, para além do indubitável valor documental, um livro sobre La questione ebraica [A questão judaica] (Ed. EDB, 174 páginas), que reúne todos os "textos integrais de uma polêmica pública" sobre o destino dos judeus na Alemanha que ocorreu em 1933?

A resenha é do monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, prior e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado no jornal La Stampa, 28-06-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Pois bem, basta ler poucas páginas para ficar chocados com a candente atualidade que emerge com força a partir dessa troca de escritos entre o filósofo judeu Martin Buber (foto) – posto em causa diretamente em um panfleto que visa a fornecer um suporte bíblico-teológico à vontade nazista de marginalização dos judeus alemães – e o teólogo protestante Gerhard Kittel.

Se o texto inicial, as réplicas de Buber, as tréplicas e as modificações nas edições posteriores ainda falam com força 80 anos depois, isso não se deve apenas à imensa tragédia da Shoah que também pôde acontecer por causa de escritos como o de Kittel, mas também e sobretudo porque a disputa vertia sobre o status dos judeus como "estrangeiros" na Alemanha, sobre o seu suposto destino a terem que viver errantes e em precariedade, indiscutivelmente "excluídos do desígnio cristão de redenção" por causa de uma "culpa" imputada a eles coletivamente, de uma vez por todas.

A excelente introdução de Gianfranco Bonola – a quem também se deve a sábia e minuciosa edição do livro – evidencia no título o versículo bíblico em torno do qual se concentrara a polêmica: "O estrangeiro às tuas portas" (Dt 24, 14).

Pouco importa que esse "estrangeiro" sejam os judeus que há séculos vivem e trabalham na Alemanha, que há quase um século tinham adquirido o direito à plena cidadania alemã, que como alemães tinham combatido a Primeira Guerra Mundial... Kittel propugna a instituição de um regime jurídico especial, o "direito do forasteiro", ao qual os judeus deveriam ser submetidos.

Em uma época em que na Itália se fala de direitos dos refugiados, de emergência da imigração, de cidadania a ser concedida ou negada àqueles que nascem, vivem, estudam e trabalham no nosso país, levanta profunda preocupação ler que, em 1933, na Alemanha, se falava do monstro de "massas infindáveis de judeus indigentes que sonham em emigrar para oeste", que os casamentos mistos produziram uma "extraordinária expugnação do corpo do povo alemão", que o direito de cidadania ao estrangeiro é concessão "absurda e absolutamente contrária à lei intrínseca de uma autêntica vida estatal", que o judeu deverá ser forçado a "permanecer visivelmente" como tal e deverá "renunciar a exercer qualquer influência sobre o povo hospedeiro", que "mistura dos povos e mistura racial significa perder a si mesmos, significa decadência".

É preciso sentir calafrios, porque continuamos a ouvir frases semelhantes. E é ainda mais preocupante que, ao contrário, hoje, sejam escassas as respostas autorizadas e firmes como as de Buber.

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