12 Dezembro 2012
Para os católicos, "o papa no Twitter" lança uma questão sobre a imediaticidade digital das estruturas da Igreja e sobre as ideias que católicos e não católicos têm sobre a Igreja Católica.
A opinião é do historiador italiano Massimo Faggioli, professor de história do cristianismo da University of St. Thomas, em Minneapolis-St. Paul, nos EUA. O artigo foi publicado no sítio HuffingtonPost.it, 11-12-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
A máquina comunicativa vaticana nunca teve medo da modernização dos meios aptos a alcançar os fiéis e o universo-mundo. A partir desse ponto de vista, o desembarque do papa no Twitter representa apenas o último passo, por enquanto, de um caminho que começou ao menos com Leão XIII com o uso dos modernos meios de comunicação.
Os especialistas em comunicação irão julgar que tipo de usuário é o Papa Bento XVI (ou, melhor, aquele que em seu nome interage com esse sistema de comunicação).
Mas, para os católicos, e para os teólogos especialmente, "o papa no Twitter" lança uma questão relativa aos efeitos dessa imediaticidade digital sobre as estruturas da Igreja e sobre as ideias que católicos e não católicos têm sobre a Igreja Católica. O Twitter, analogamente à televisão, dá ao papa uma nova acessibilidade tanto em termos de espaço, quanto de tempo: para ver o papa, não é necessário ir a Roma; para saber o que ele diz não é necessário esperar que as suas palavras cheguem por correio.
Mas, do ponto de vista do funcionamento da Igreja como comunidade de crentes com 20 séculos de história às costas, é evidente que a imediaticidade e a acessibilidade enfraquecem a dimensão da "Igreja como comunhão", porque enfraquecem, às vezes até tornam supérfluos, muitos mediadores da mensagem da Igreja – padres, bispos, catequistas, pais, teólogos – e, evidentemente, também tende a tornar supérfluos os jornalistas.
Desde o Concílio Vaticano I (1869-1870), o sistema "Igreja Católica" tem dado muito mais visibilidade e poderes ao papa de Roma, graças às definições sobre o primado e sobre a infalibilidade papais. Hoje, a imediaticidade e a acessibilidade instantâneas das palavras do papa, graças às tecnologias como o Twitter, multiplicam dentro da Igreja os efeitos daquele "doping eclesiológico" decidido pelo Vaticano I por pressão do Papa Pio IX.
É um fato novo. De fato, na longa história do cristianismo, todo documento do magistério da Igreja sempre foi submetido a um processo de "recepção": uma interpretação mediada de todo pronunciamento magisterial que deve levar em conta o contexto histórico do documento, fazer uma exegese do texto e compreender a posição desse texto no vasto corpus da tradição da Igreja.
A imediaticidade e a acessibilidade instantâneas da palavra do papa, ao invés, enfraquecem indubitavelmente o processo de recepção, porque é um processo que precisa de tempos longos e de agentes mediadores dessa mensagens dentro da Igreja: a recepção trabalha sobre textos longos e complexos – comprimento e complexidade que não são um obstáculo, mas, ao contrário, a condição necessária para a interpretabilidade de qualquer texto religioso.
Não está claro se os tuítes do papa serão um conversation starter ou um conversation stopper entre o papa e os seus seguidores. Mas a nova leva (norte-americana) de comunicadores profissionais no Vaticano parece ter aprendido uma lição de George W. Bush, que explicou, em um momento de franqueza não raro (para ele), que grande parte do seu ofício de presidente consistia em "catapultar a propaganda" a fim de "contornar" a imprensa e chegar diretamente aos cidadãos.
Essa certamente não foi uma profissão de fé de Bush no papel da imprensa livre em uma democracia. A Igreja não é uma democracia, e o papa no Twitter poderia tornar os mecanismos de poder e de autoridade ainda mais centrados em Roma.
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Os tuítes do papa e a catapulta de Bush. Artigo de Massimo Faggioli - Instituto Humanitas Unisinos - IHU