IPCC: reduções na emissão de carbono são vitais para deter o impacto “severo” na mudança climática

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04 Novembro 2014

A mudança climática está pronta a infligir “impactos severos, generalizados e irreversíveis” sobre os povos e o mundo natural a menos que se reduzam drástica e rapidamente as emissões de carbono, segundo a avaliação mais importante já feita sobre o aquecimento global.

A reportagem é publicada pelo jornal The Guardian, 02-11-2014. A tradução é de Isaque Gomes Correa.

O resoluto relatório afirma que a mudança climática já aumentou o risco de ondas de calor severas e outros climas extremos e alerta que o pior está por vir, incluindo escassez de alimentos e conflitos violentos. Mas ele também descobriu que os meios de evitar um aquecimento global perigoso estão disponíveis e são acessíveis.
“Temos os meios para limitar as mudanças climáticas”, disse Rajendra Pachauri, presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas – IPCC (na sigla em inglês). “As soluções são muitas e permitem um desenvolvimento econômico e humano continuado. Tudo o que precisamos é da vontade de mudar”.

O relatório, divulgado em Copenhague nesta segunda-feira, é o trabalho de milhares de cientistas e foi finalizado após negociações de todos os governos do mundo. É o primeiro relatório do IPCC desde 2007 a trazer junto todos os aspectos da luta contra as mudanças climáticas, e pela primeira vez ele afirma que é economicamente viável; que as emissões de gás carbono vão, em última análise, ter que cair a zero; e que a pobreza global só pode se reduzir travando-se o aquecimento global. O relatório também deixa claro que as emissões de carbono, feitas principalmente a partir da queima de carvão, petróleo e gás, estão atualmente elevando-se a níveis recordes, e não caindo.

O texto vem num momento crítico para a ação internacional sobre o clima, com o prazo para um acordo global estando a um pouco mais de 18 meses a contar de hoje. Em setembro, 120 líderes nacionais se reuniram na ONU, em Nova York, para abordar a questão das mudanças climáticas, enquanto que centenas de milhares de manifestantes ao redor do mundo exigiam ação.

Nicholas Stern, professor de Economia na London School e autor de um influente estudo sobre o assunto, disse que o relatório do IPCC era a “avaliação mais importante sobre as mudanças climáticas até então feita” e que seu texto deixa claro que “atrasos no combate à mudança no clima serão perigosos e profundamente irracionais”.

“A realidade das mudanças climáticas é inegável e não pode ser simplesmente descartada pelos políticos que carecem de coragem para enfrentar as evidências científicas”, afirmou, acrescentando que as vidas e os meios de subsistência de milhões de pessoas estão em risco.

Bill McKibben, ativista e coordenador da campanha 350.org, disse: “Para os cientistas, conservadores por natureza, usar os termos ‘grave, pervasivo e irreversível’ para descrever os efeitos no clima fica aquém de anunciar que a mudança climática irá produzir um apocalipse zumbi”. Desmantelar o poder da indústria de combustíveis fósseis não seria fácil, disse, McKibben. “Mas, graças ao IPCC, ninguém jamais poderá dizer que eles não foram avisados”.

O novo relatório global do IPCC baseia-se em relatórios anteriores sobre a ciência, os impactos e as soluções para as mudanças climáticas. Ele conclui que o aquecimento global é “inequívoco”, que o papel da humanidade em causá-la está “claro” e que muitos dos efeitos irão durar por centenas de milhares de anos, até mesmo se o aumento da temperatura do planeta for interrompido.

Em termos de impactos, tais como ondas de calor e tempestades extremas de chuvas que causem inundações, o relatório afirma que os efeitos já estão sendo sentidos: “Nas últimas décadas, as mudanças no clima causaram impactos nos sistemas naturais e humanos em todos os continentes e ao longo dos oceanos”.

Secas, tempestades costeiras surgem da elevação dos oceanos, e extinções de espécies selvagens em terra e nos mares vão todas piorar ao menos que as emissões sejam reduzidas, lê-se entre as conclusões do relatório.

Isto irá gerar efeitos em cadeia, segundo o PICC: “A mudança climática está projetada para minar a segurança alimentar”. O relatório também descobriu que o risco de guerras aumentaria: “A mudança climática pode indiretamente aumentar os riscos dos conflitos violentos ao ampliar fatores instigadores de conflitos bem-documentados como a pobreza e perturbações econômicas”.

Os dois terços de todas as emissões admissíveis já foram bombeadas na atmosfera, disse o relatório. A rota de custo menor para deter um aquecimento perigoso seria que as emissões atingissem o pico em 2020 – um objetivo extremamente desafiador – e caíssem para zero no final deste século.

O relatório calcula que, para evitar uma mudança climática perigosa, os investimentos em eletricidade de baixo carbono e em eficiência energética terão de se elevar a várias centenas de bilhões de dólares por ano antes de 2030. Porém, também descobriu que retardar as reduções nas emissões de gases à atmosfera até 2030 aumentaria os custos da redução de dióxido de carbono em quase 50%, em parte porque as atuais estações de eletricidade teriam de ser fechadas mais cedo. “Se esperarmos, precisaremos fazer coisas mais difíceis e caras declarou Jim Skea, professor na Imperial College, de Londres, e vice-presidente de um grupo de trabalho do IPCC.

O combate à mudança climática precisa apenas cortar as taxas de crescimento econômico em uma minúscula fração, afirma o IPCC, e, na prática, pode melhorar o crescimento ao fornecer outros benefícios, tais como reduzir a poluição do ar danosa à saúde.

A captura e armazenamento de carbono – tecnologia recente que visa enterrar CO2 no sobsolo – é considerada extremamente importante pelo painel intergovernamental. Este estima que o custo das reduções de grandes emissões exigidas iria mais do que dobrar sem esta técnica [a de capturar e armazenar carbono].

A ênfase na captura e armazenamento de carbono não se dá por causa que esta tecnologia avançou, e muito, nos últimos anos, afirmou Jean-Pascal van Ypersele, professor na Université Catholique de Louvain, na Bélgica, e vice-presidente do IPCC, mas sim porque as emissões continuaram a crescer tão rapidamente. “Estamos emitindo muito mais, então depois precisaremos limpar mais também”, declarou.

Relacionar a captura e armazenamento de carbono à queima de madeira e outros biocombustíveis reduziria os níveis atmosféricos de CO2, pois o carbono que estes contêm é sugado do ar à medida que crescem. Mas van Ypersele disse também que o relatório do IPCC declara, de forma “muito honesta e justa”, que há riscos a esta abordagem, tais como o de conflitos relacionados à questão da segurança alimentar.

Contrariamente à importância que o IPCC dá à tecnologia de captura e armazenamento de carbono (ou “Carbon Capture and Storage – CCS”, em inglês), abandonar a energia nuclear ou implantar somente sistemas de energia eólica ou solar aumentaria o custo das reduções nas emissões em apenas 6 a 7%. O relatório também afirma que mudanças comportamentais, como algumas mudanças alimentares que pudessem envolver comer menos carne, podem ter um papel na redução das emissões.

Como parte de estabelecer as formas como os países podem reduzir as emissões de gases de forma eficiente, o relatório do IPCC dá destaque a considerações de ordem ética. “[As reduções nas emissões de carbono] e a adaptação levantam questões de equidade, justiça e imparcialidade”, lê-se. “As evidências sugerem que os resultados vistos como equitativos podem conduzir a uma cooperação [internacional] mais eficaz”.

Estas questões são centrais para as negociações globais sobre as mudanças climáticas e a inclusão delas no relatório foi saudada por ativistas, assim como foi a afirmação de que adaptar os países e costas para lidar com o aquecimento global não consegue, por si, evitar impactos graves.

“Os governos ricos devem parar de fazer promessas vazias e empregarem o seu dinheiro nestas ações de forma que os pais pobres não tenham que pagar o preço pelos estilos de vida dos ricos”, disse Harjeet Singh, da organização ActionAid.

A declaração de que as emissões de carbono devem cair para zero foi “importantíssima”, segundo Kaisa Kosonen, do Greenpeace. “Ainda podemos limitar o aquecimento a 2 graus Celsius, ou até mesmo a 1,5 graus, [mas] precisamos eliminar progressivamente as emissões”, declarou. Diferentemente da captura e armazenamento de carbono, que ainda precisa provar ser comercialmente viável, Kosonen falou que a energia renovável está, cada vez mais, ficando mais barata.

Sam Smith, do Fórum Mundial da Água, acrescentou: “A grande oportunidade presente neste relatório é que ele mostra que combater as mudanças climáticas não irá paralisar as economias e que é essencial tirar as pessoas da pobreza. O que se precisa agora é de uma ação política concertada”. A pronta resposta de políticos à recente crise global financeira mostrou, segundo Smith, que “eles podem agir rapidamente e em escala caso estejam suficientemente motivados”.

Os ativistas minimizaram os movimentos feitos por alguns países com grandes reservas de combustíveis fósseis de desvalidar a linguagem do texto escrito pelo IPCC, redigido por cientistas e visto pelo jornal The Guardian, dizendo que o relatório final era conservador, porém incisivo.

No entanto, a afirmação de que “as mudanças climáticas podem conduzir a problemas de saúde em muitas regiões, inclusive uma maior probabilidade de morte” foi apagada do relatório final, junto com a crítica de que os políticos, às vezes, “se envolvem num pensamento de curto-prazo e se enviesam no sentido do status quo”.

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