01 Novembro 2025
"Para abrir espaço à fé em um Deus vivo, porém oculto em seu mistério, tanto Hegel quanto Rahner acreditam que o eu moderno deve trilhar um 'caminho do desespero'", escreve Bruno Scapin, em artigo publicado por Settimana News, 30-10-2025.
Eis o artigo.
Segue um resumo das sete vozes que refletiram e descreveram como falariam sobre Deus para as pessoas de nossa época.
"A reflexão sobre Deus praticamente desapareceu do discurso cultural contemporâneo, até mesmo da pesquisa filosófica e teológica." Esta é a observação de Natalino Valentini, professor do ISSR "A. Marvelli" em Rimini, na conclusão do livro "Dire Dio oggi. Sulle tracce di K. Rahner" (Refletindo sobre Deus hoje. Nos passos de K. Rahner), editado pelo padre Francesco Strazzari, sacerdote de Vicenza e editor do SettimanaNews, que reuniu sete autores de renome para debater o tema.
Valentini ecoa as palavras escritas em sua época por K. Rahner, que deplorava a falta de reflexão, inclusive por parte dos teólogos, sobre o que queremos dizer quando dizemos "Deus".
Tomáš Halík, um padre, filósofo e teólogo checo, inicia suas reflexões com uma afirmação contundente: "Estou convencido de que é necessário abandonar o 'realismo metafísico' e todos os esforços para objetificar 'Deus'... em favor de um certo 'agnosticismo cristão', isto é, em favor do respeito ao Mistério de Deus." "Para a fé", escreve ele, "é essencial relacionar-se com um 'mistério absoluto' que transcende as possibilidades do conhecimento humano... e que vê Deus como a fonte e o fim de todo o drama da criação."
Até mesmo o salesiano Luc Van Looy, bispo emérito de Ghent (Bélgica), abandona decisivamente a abordagem demonstrativa: "Se quisermos expressar Deus em palavras ou imagens, não será com termos teológicos e antropológicos, mas com o que se chama amor, ternura, afeição, e também com compromisso, solidariedade, responsabilidade e confiança."
A terceira voz é a do teólogo Severino Dianich, nascido na Ístria. Ele observa que, não importa quantos se declarem descrentes, "a questão de Deus é uma ferida aberta no corpo da humanidade, uma ferida que nunca cicatriza". E nem mesmo a ciência, por mais avançada que seja, consegue aplacar as perguntas sobre Deus.
Qual caminho devemos seguir? "Deixar a gaiola dourada das certezas científicas", permitindo-nos entrar no espaço da maravilha, "no qual até Deus é possível". Mesmo tentar demonstrar a existência de Deus "faria a maravilha desaparecer". Não é a lógica da inteligência que nos levará a Deus, mas sim "a maravilha de se sentir cercado pelo imenso espaço do inesperado e do imprevisível". É essa maravilha — escreve Dianich — que impulsionará a alma primeiro a questionar a possibilidade de Deus e depois a probabilidade de Deus, levando, em última instância, à certeza e à fé em Deus.
Virgil Bercea, bispo da diocese greco-católica de Oradea Mare (Romênia), proferiu um discurso marcante. É um comovente testemunho de uma Igreja que suportou o rigor da perseguição do governo comunista, que a proibiu em 1948. Durante esse período de perseguição, a hierarquia e os fiéis — escreve Bercea — foram chamados a "escrever uma teologia do martírio e do compromisso eclesial, na qual a imagem de Deus se revelasse no silêncio de uma vida heroica vivida na fé".
Os fatos são tristemente eloquentes: após a prisão de todos os bispos greco-católicos (sete dos doze morreram na prisão), os padres (mais de duzentos) e muitos fiéis, especialmente intelectuais, também foram presos e encarcerados. Eles foram justamente chamados de "os santos das prisões". Durante o período de perseguição, continua Bercea, "a Igreja Greco-Católica dialogou com Deus..., escreveu a teologia do martírio com o próprio sangue e agiu com a graça do Espírito Santo".
O bispo lamenta, no entanto, que Karl Rahner (e seus colegas teólogos ocidentais) não tenham dedicado uma palavra sequer às Igrejas Orientais, que se tornaram "Igrejas do silêncio".
Jesús Martínez Gordo, padre diocesano de Bilbao, teólogo e escritor, proferiu um discurso abrangente e detalhado, ecoando a advertência de Karl Rahner, acreditando que "devemos voltar a falar sobre 'Deus' na esfera pública", consciente de que hoje a questão de Deus não é atacada pelo agnosticismo ou ateísmo, mas sim rodeada pela indiferença.
Gordo está convencido de que "nosso mundo está repleto de impressões, transparências, antecipações (E. Hillesum as chamou de "murmúrios")" de Alguém ou Algo que podemos definir como Vida ou Plenitude. Ele encontra essas características particularmente na astrofísica (a teoria do Big Bang exige uma "explicação externa" do cosmos e do mundo... Algo ou Alguém que, na realidade cósmica, seja perceptível como Unidade, Inteligência, Poder, Ordem, Amor ou Antimal, sem ser confundido com matéria ou reduzido a ela..., existindo independentemente de sua atuação); na protobiologia (matéria e leis perfeitamente reunidas e interconectadas tanto na imensidão cósmica quanto na infinita pequenez do genoma); na antropologia cultural (o homem se percebe como um "vagabundo cósmico", constantemente insatisfeito e em busca de uma Realidade que o complete).
Livro "Dire Dio oggi. Sulle tracce di K. Rahner", de T. Halík, L. Van Looy, S. Dianich, V. Bercea, J. Martinez Gordo, A. Torres Queiruga, M. Naro, K. Appel.
Surpreendentemente, Gordo conclui seus comentários mencionando Jesus, chamando a si mesmo não apenas de "teísta", mas também de "cristão de Jesus", porque, na existência do Nazareno — escreve ele — "percebo o que quero dizer quando digo Deus". Ele continua: "Este Deus crucificado e samaritano", escreve ele, "me interessa... Este Deus com seus 'excessos' me importa... Sem Jesus Cristo, nosso mundo é incompreensível, nem o passado nem o presente".
O bispo Van Looy, ao falar sobre Deus, também se voltou para Jesus de Nazaré, porque "Deus é real, ele vive entre nós"..., ele é "um Deus sempre presente..., um Deus de amor". Lendo o hino da caridade (1 Coríntios 13), "podemos compreender Deus tentando expressá-lo em termos de amor".
Chegamos, então, às três últimas contribuições: "Karl Rahner: O Mistério do Deus Trino", de A. Torres Queiruga; "Unus de Trinitate", de Massimo Naro; e "Dizendo o Inominável, Karl Rahner e Georg Wilhelm Hegel", de Kurt Appel. Para analisá-las, é necessário um sólido fundamento filosófico e teológico.
O teólogo e filósofo espanhol Torres Queiruga recorda a crescente ênfase de Rahner em falar de Deus "como mistério". O teólogo alemão, aliás, fala de Deus "como um mistério sagrado permanente, o fundamento imensurável da transcendência humana". Isso leva a uma consequência importante: "Todo conhecimento real de Deus só é possível porque se baseia numa subjetividade que nunca é 'puramente' humana, mas é sempre e constitucionalmente originada e sustentada por Deus", e também porque "Deus está fazendo todo o possível para se revelar aos seres humanos ".
Segundo o teólogo siciliano Dom Massimo Naro, Karl Rahner, diante dos dois tratados clássicos da Escolástica — De Deo trino e De Deo uno — optou decididamente pelo primeiro, porque proclama Deus "como um santo mistério" e, ainda mais, como "o mistério do Deus de Jesus Cristo". A teologia, afirma Dom Massimo, "encontra o elo perdido entre Deus e a humanidade, identificando-o em Cristo Jesus, o Logos encarnado".
O livro conclui com uma contribuição de Kurt Appel, teólogo e filósofo austríaco. "A ideia central de Rahner", escreve ele, "é a de uma abertura ao mistério de Deus, no qual se enraíza a experiência da transcendência". Para o teólogo alemão, aliás, "a teologia consiste em 'falar o inominável', em abrir-se ao 'ocultamento de Deus que transcende todas as nossas imagens'". Para abrir espaço à fé em um Deus vivo, porém oculto em seu mistério, tanto Hegel quanto Rahner acreditam que o eu moderno deve trilhar um "caminho do desespero". Contudo, este é o único caminho para crer que "a última palavra, assim como a palavra original, é uma palavra do Deus vivo".
Referências
T. Halík – L. van Looy – S. Dianich – V. Bercea – J. Martínez Gordo – A. Torres Queiruga – K. Appel, Dizendo Deus Hoje. Nos passos de K. Rahner, editado por F. Strazzari, Pazzini Editore, Villa Verucchio (RN) 2025.
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