12 Novembro 2025
A cúpula deste ano está sendo realizada em um país que desafiou tanto o autoritarismo quanto o colapso ambiental, um lembrete de que a democracia triunfa onde o despotismo destrói.
O artigo é de Frances Colón e Johan Hassel, pesquisadores do Center for American Progress, publicado por El País, 11-11-2025.
Eis o artigo.
Após três anos consecutivos de negociações climáticas sediadas por regimes autoritários, o retorno da cúpula sobre mudanças climáticas a uma democracia não poderia acontecer em um momento mais crucial. Quando os líderes mundiais se reunirem em Belém para a COP30, que começa esta semana, estarão em um país que desafiou tanto o autoritarismo quanto o colapso ambiental — um lembrete de que a democracia triunfa onde o despotismo destrói.
Há poucos anos, o Brasil estava à beira do desastre. Sob o governo do populista de extrema-direita Jair Bolsonaro, a Amazônia queimava em um ritmo sem precedentes, enquanto as instituições democráticas vacilavam sob ataques implacáveis. Bolsonaro desmantelou agências ambientais, cortou verbas para programas de monitoramento ambiental e ridicularizou a ciência climática. Em 2021, o desmatamento na Amazônia atingiu seu nível anual mais alto em uma década, e o mundo temia que a floresta tropical pudesse cruzar um ponto de inflexão irreversível.
Assim, os brasileiros votaram por um futuro diferente. O presidente Lula da Silva retornou ao poder prometendo preservar tanto o meio ambiente quanto a democracia. Em menos de um ano, o desmatamento na Amazônia diminuiu drasticamente graças à restauração de programas e regulamentações de controle ambiental. Posteriormente, o Supremo Tribunal Federal condenou Bolsonaro por conspiração para se manter no poder após a derrota nas eleições de 2022 — um forte lembrete de que a integridade climática e a integridade democrática, de fato, se retroalimentam.
Agora, como anfitrião da COP30, o Brasil está dando o exemplo. O governo Lula da Silva concentrou sua presidência das negociações em três prioridades que incorporam valores progressistas: fortalecer a cooperação multilateral; vincular as metas climáticas às transições socioeconômicas; e acelerar a implementação do Acordo de Paris. Esses não são meros argumentos diplomáticos, mas uma demonstração de que as democracias ainda podem realizar e liderar a transição ambiental.
Os líderes progressistas que chegarem a Belém o farão sob a sombra de um cenário global perigoso. Em todo o mundo, autocratas e populistas de extrema-direita estão lançando um ataque coordenado contra a ambição climática e as normas democráticas, explorando preocupações econômicas legítimas e usando-as contra a ação climática. Eles retratam a política climática como um projeto elitista que destrói empregos, aumenta os preços e enfraquece a soberania nacional. Ao mesmo tempo, defendem o status quo dos combustíveis fósseis, que beneficia apenas alguns e prejudica muitos. O objetivo não é apenas obstruir a política climática, mas também corroer a fé na própria democracia.
De Washington, D.C., a Buenos Aires e Budapeste, essa se tornou a narrativa dominante. Nos Estados Unidos, Trump desmantelou iniciativas climáticas cruciais, ao mesmo tempo que prometia extrair petróleo sem interrupção, usando seu famoso lema "perfure, meu bem, perfure". Na Europa, partidos de extrema-direita estão ganhando terreno prometendo revogar regulamentações ambientais, alegando que isso protege as pessoas comuns das normas climáticas.
Até mesmo líderes que estão plenamente conscientes da crise climática e que deveriam se manifestar estão suavizando suas agendas climáticas, com medo de perder o voto da classe trabalhadora para uma reação populista.
O resultado é uma corrida desenfreada para o abismo que coloca em risco o frágil progresso alcançado graças ao Acordo de Paris. A mensagem da extrema-direita é enganosamente simples: a política climática é cara demais. Mas isso é falso. A energia limpa está agora mais barata do que nunca. A energia renovável protege as famílias das flutuações de preço dos combustíveis fósseis. Diversificar as fontes de energia pode melhorar a confiabilidade da rede elétrica e ajudar os consumidores a economizar dinheiro durante períodos de calor e frio extremos. E cada atraso na transição energética agrava a inflação e a instabilidade, em vez de melhorá-las.
A boa notícia é que as pessoas ainda acreditam no progresso. De acordo com pesquisas realizadas pela Global Progress Action e pela Datapraxis, existe uma forte demanda por uma liderança ousada e corajosa que possa gerar mudanças reais em suas vidas. Além disso, as pessoas continuam acreditando na democracia e rejeitando políticas autoritárias e sem prestação de contas. Elas querem políticas que reduzam suas contas, protejam seus empregos e fortaleçam suas comunidades; e a ação climática pode alcançar tudo isso, além de garantir um futuro para as próximas gerações. Este é um mandato progressista que não podemos ignorar.
A COP30 oferece aos líderes progressistas a oportunidade de demonstrar que a ação climática impulsiona o crescimento e a prosperidade nas sociedades democráticas, em vez de os prejudicar. As evidências comprovam isso. Na Espanha, os preços da eletricidade caíram 50% desde 2018 graças ao aumento da energia solar e eólica. Globalmente, o emprego em energias limpas cresceu 3,8% em 2023, superando em muito o restante da economia. Os sistemas de energia renovável fortalecem a resiliência das comunidades ao calor extremo, tempestades e crises geopolíticas.
Como afirmou o Presidente Pedro Sánchez na Cúpula de Ação Global para o Progresso de 2025, os progressistas devem combater a retórica da extrema-direita com ações concretas, mas também com uma visão que demonstre que um futuro mais acessível e seguro só é possível através da ação climática, e não sem ela. Em Belém, os progressistas devem deixar claro que a liderança climática é uma força nacional que produz resultados: energia mais acessível, mais empregos e comunidades mais seguras, ao mesmo tempo que defendem os valores mais temidos pelos autocratas: transparência, responsabilidade e solidariedade.
Leia mais
- “É momento de impor uma nova derrota aos negacionistas”, diz Lula na abertura da COP30
- O que está em jogo para a América Latina e o Caribe na COP30, a primeira a ser realizada na Amazônia?
- A COP do Brasil decide se o mundo avança ou se Trump destrói o esforço comum contra a mudança climática
- Brasil articula frente latino-americana de países para a COP30
- COP30: Pensar a América Latina com mapas abertos. Artigo de Antônio Heleno Caldas Laranjeira
- COP30 começa hoje: entenda o que está em jogo e o que podemos esperar
- Críticas a Trump, lobby fóssil e falta de ambição climática marcam Cúpula de Líderes
- COP30: “A era dos belos discursos e boas intenções acabou”, escreve Lula
- A COP30 precisa planejar o fim dos combustíveis fósseis
- COP30 será “hora da verdade” contra a crise climática, diz Lula na ONU
- Fim dos combustíveis fósseis fica de fora do discurso de Lula na ONU
- No país da COP30, mais petróleo, mais gás, mais carvão. Artigo de Alexandre Gaspari
- Voos de equipes da Petrobras evitam Belém durante COP30
- COP não atingiu propósito para qual foi criada, dizem especialistas
- Alto lá, esta terra tem dono: atrocidades do país da COP30. Artigo de Gabriel Vilardi
- Abandono de combustíveis fósseis volta ao radar da COP30
- A caminho da COP30: entre a retórica da eliminação dos combustíveis fósseis e a perfuração na Amazônia